O futebol de Juninho Pernambucano é indiscutível, e todos sabem muito bem as características. É um exímio cobrador de faltas - Ken Bray, um físico inglês, chegou a fazer um estudo e o considerou o maior do mundo neste quesito - e tem ainda um ótimo passe, visão de jogo e chuta bem com a bola rolando. Mas poucos conhecem Antônio Augusto Ribeiro Reis Júnior fora dos campos. Por isso, o GLOBOESPORTE.COM conversou com velhos companheiros e amigos do jogador.
Juninho Pernambucano vai voltar ao Vasco para a disputa do Brasileiro (Foto: agência Reuters)
O cuidado com a carreira, a desconfiança com tudo, a vontade de comer sem parar, a disciplina na concentração, o lado solidário, o carinho pela família e, principalmente, o amor pelo Vasco. Tudo isso faz parte da vida de quem é um dos grandes ídolos do clube e esteve presente em conquistas históricas como o Brasileiro de 1997 e de 2000, a Libertadores de 1998 e a Mercosul também em 2000. Confira abaixo muitas histórias, desde o início na base do Sport até os treinamentos que faz nas férias.
Estômago de avestruz
Sandro jogou com Juninho e mostra o pôster do time (Foto: Rafael Cavalieri/Globoesporte.com)
Desde criança, Juninho sempre teve um apetite incrível. Companheiro desde as categorias de base, o ex-zagueiro Sandro, que jogou pelo Botafogo, relembrou com direito a muitas risadas a primeira viagem que fez com o amigo. Era para disputar a Copa São Paulo de Futebol Júnior. Foram três dias de viagem de ônibus, e uma das paradas para comer foi em uma churrascaria rodízio. Sem estar acostumado com o sistema, Juninho comeu tudo o que podia. Mas o resultado não foi bom, não.
- Rapaz, ele comeu muito, mas não parava. Chegou até a ligar para a mãe do orelhão de tão feliz que estava com aquela comida. Mas foi só o ônibus começar a andar, que ele teve um revertério. Passou quase dez horas no banheiro vomitando. E a gente ria demais - relembrou Sandro.
Ele garante que hoje o apetite continua, mas os hábitos são outros.
- Ele agora sabe o que comer, né? Chega à churrascaria e come um prato gigante de salada antes das carnes. É por isso que ele continua tão em forma - explicou.
Sem barulho na concentração
Chiquinho dividia quarto com Juninho na época de Sport (Foto: Rafael Cavalieri / Globoesporte.com)
Qualquer um que fale sobre Juninho exalta sua seriedade e profissionalismo. Mas o lado obsessivo era demais. Chiquinho que o diga. O ex-jogador dividia quarto com Juninho na época do Sport e se recorda do dia em que não pôde fazer nada para não incomodar o companheiro, que queria dormir na véspera do jogo.
- Não era fácil. Liguei a televisão e, quando deu 22h, ele mandou desligar. Disse que o barulho estava incomodando. E eu sem sono. Resolvi então pegar meu discman. Mas até mesmo o barulho do fone no meu ouvido incomodou. Ele levantou gritando. Era muito cheio de manias mesmo - recorda.
Religioso com os horários
Nos dias de jogo, o café da manhã na concentração é opcional. Se o jogador preferir dormir até mais tarde, tem esta opção. Mas com Juninho o café era regra. E quem sofria com isso era novamente o companheiro de quarto Chiquinho. Ele recorda que o amigo simplesmente não o deixava ficar na cama.
- Eu tinha dificuldade para acordar cedo. E ele sempre falava que o café era o que dava energia para o resto do dia. Por um lado era bom, aprendi muito com esse profissionalismo dele. Era um exemplo mesmo, desde o início da carreira. Por isso chegou aonde chegou. Mas por outro lado eu queria mesmo era dormir um pouco mais (risos).
Desconfiança até nos negócios com os amigos
No detalhe, o time do Sport de 1994 com Sandro, Chiquinho e Juninho (Foto: Reprodução )
Um lado que poucos conhecem de Juninho é o da desconfiança. Ele simplesmente se cerca de todos os lados e desconfia de tudo e de todos quando está para fechar um negócio. Sandro relembra que tinha um amigo que era corretor de apartamentos e fez uma proposta para investir em imóveis. Eram 12 apartamentos, e Sandro só podia comprar seis. Ofereceu a outra metade para Juninho. O tiro era certo, mas ele saiu de Lyon para conferir de perto o projeto antes de assinar.
- Ele dizia para mim: \"Cocão (apelido que colocou em Sandro), isso vale a pena mesmo? Não é furada?\". E eu explicava tudo, mas ele viajou até aqui. Cada apartamento custou R$ 48 mil, e hoje estão avaliados em R$ 190 mil. Olha o lucro que ele teve! Eu sabia disso, mas ele não confiava. E no fim das contas não me deu nem um obrigado (risos).
Não descansa nem nas férias
Registro na Federação Pernambucana de Futebol (Foto: Rafael Cavalieri / GLOBOESPORTE.COM)
Juninho Pernambucano costuma passar as férias em Recife, com a família e os amigos. Ele não gosta de desgrudar deles nos dias em que está de folga. Mas isso não significa que não trabalhe. Chiquinho brinca que ele anda com suplemento e vitaminas para onde quer que vá. Nas últimas férias, por exemplo, Juninho ligou para o gerente de futebol do Sport, Adelson Wanderley, o Coronel, e pediu para utilizar os campos do clube que o revelou.
- Ele treinou aqui religiosamente todos os dias. Em alguns, a sua família vinha junto para assistir, mas férias para ele não significa descanso. É um fora de série mesmo - recorda Coronel, que é pai de Patrícia, amiga de Juninho desde os tempos em que ele jogava futebol de salão pelo clube.
Vasco: respeito, amor e o receio de voltar ao clube que o idolatra
O sentimento de Juninho Pernambucano pelo Vasco é mesmo sincero. Não há uma pessoa ao seu redor que questione isso. E é esse amor todo que por tantas vezes fez com que seu retorno fosse adiado. Justamente por ser tão desconfiado com tudo, Juninho tinha o receio de não render o que tanto se espera. Por isso, só aceitou voltar após a apresentação de um projeto que envolvia muito mais do que o dinheiro em si, como é a proposta atual, na qual Juninho segue no clube após encerrar a carreira.
- Na primeira vez que o Vasco o procurou, ele me ligou com aquele jeito arredio dele e disse que a proposta era maravilhosa, mas que ele não queria se sentir roubando o Vasco. Tinha medo mesmo. Mas agora fizeram um plano de carreira, e ele quer mesmo parar no clube que ama. Ele se preparou ainda mais para isso. É certeza de que vai dar certo - afirmou Sandro.
- É importante para o futebol brasileiro o retorno de grandes ídolos. Ele superou o medo que tinha pelo amor ao Vasco - completou Chiquinho.