Nesta quarta-feira, foi publicado um estudo da Pluri Consultoria, que revelou que o Campeonato Brasileiro é apenas o 31º no mundo em ocupação de estádio. O torneio está atrás de países como Chipre e da Terceira Divisão da Inglaterra.
Porém, já há alguns pontos que podem ser discutidos. Fernando Ferreira, especialista em finanças e gestão de clubes, membro da Academia LANCE!, lembra que a média deve aumentar este ano. Principalmente por causa das aberturas de alguns estádios da Copa do Mundo.
COM A PALAVRA
Fernando Ferreira
Especialista em finanças, gestão e governança de clubes
Há duas informações a mais que gostaria de acrescentar e que não estão nos relatórios. Primeiro é que a gente deve ter aumento da média de público este ano por conta dos jogos-evento, esses jogos como o Flamengo em Brasilia, que estão distorcendo a média este ano. Porém, essa entrada em cena este ano de estádios como a Fonte Nova, o Maracanã, o Mineirão, deve aumentar a média de oferta de assentos em 14%. Se aumentarmos a média de assento em 14%, nossa média de ocupação estará no mesmo patamar.
Segundo ponto: esse número de 38% de ocupação é um número de Campeonato Brasileiro, porque estamos comparando campeonatos nacionais. Estamos finalizando um estudo na Pluri, que já posso adiantar o resultado, que o futebol brasileiro em si, quando você pega a Copa do Brasil, os campeonatos nacionais e os regionais, nossa taxa de ocupação dos estádios é de 14%.
O Campeonato Brasileiro tem 12.900 pessoas de média de público, mas a média do público do futebol brasileiro está em 3.800 torcedores. Esses números tornam a leitura ainda mais dramática.
Quais são os grandes motivos que fazem com que essa méida seja baixa? No momento atual, a questão preço é a questão número 1. A número 2 é o excesso de ofertas de jogos, com jogos de baixa qualidade e pouca importância. Aí, você tem diversos outros fatores, como violência, a qualidade do serviço dos estádios, horários de jogos, ofertas de outras alternativas de entretenimento, a questão do pay-per-view. São 17 itens que constrangem a ida de torcedores ao estádio. Mas o ponto crítico é o preço, porque a escala de alta tomou uma espiral enlouquecida. O pessoal perdeu totalmente a noção.
E de novo, não estou falando dos jogos-evento. Nesses jogos-evento, o pessoal pode e deve cobrar um preço mais caro, porque tem demanda. O Flamengo vai jogar em Brasília? É uma cidade rica, com a maior renda per capita do Brasil, com 2,5 milhões de habitantes, com 20% da população torcendo pelo Flamengo, e sem o futebol profissional importante. Então, é óbvio que quando vai o Flamengo jogar lá no estádio novo vai ter uma demanda de show do Paul McCartney, do U2. É um ponto fora da curva. A questão é Botafogo x Figueirense, por exemplo, os jogos convencionais do Campeonato Brasileiro.
A gente está praticando preços que começam e se aproximam da Europa, oferecendo um produto infinitamente inferior, porque lá está cheio de craques, e a renda per capita do europeu é três vezes superior à brasileira. É outra realidade. A gente está completamente maluco.
E essa coisa de a gente fazer ajuste de oferta e demanda manual não existe. Dirigentes se reunirem e decidirem que tal jogo vai ter apelo e vai custar R$ 100, não tem ciência, não tem estudo, só chute. O pessoal de clubes, em geral, são pessoas com nível econômico mais alto, que olham para os clubes com sua lente.
A Espanha, mesmo em crise, tem a renda per capita média de 35 mil dólares por ano. São sociedades com poder de consumo muito superior à nossa. O cara tem parcela da renda destinada a consumo de entretenimento, que é consumo supérfluo. No Brasil, o cara está preocupado com vestuário, alimentação e moradia.
Outro erro em que os clubes frequentemente incorrem é achar que o torcedor é um sujeito que tem a obrigação de ir ao estádio, tem a obrigação de responder ao clube dele. Essa fração de torcedores está entre 6% e 9%, são os torcedores que o cara se identifica como fanático, o cara que se sente na obrigação de ajudar o time. O restante é consumidor, que tem outras opções de entretenimento.
Quando o Maracanã lotava com 150 mil pessoas, as opções do cara eram ir à praia ou ao estádio, e o ingresso custava o equivalente a R$ 2 ou R$ 3. E hoje ele tem muitas opções.
Oura coisa que é fundamental: em que isso impacta? Essa é uma indústria que opera com 62% de sua capacidade ociosa. Esse número, por si só, para qualquer segmento econômico, seria um alarme absurdo. Se não fosse futebol já teria falido há muito tempo. No último Brasileiro já deixamos de vender 8 milhões de ingressos. Isso dá em receita direta R$ 300 milhões, que os clubes deixam de receber.
E a gente sabe que isso tem um efeito multiplicador. Estádios cheios aumentam praticamente todos os tipos de receitas dos clubes. Eles têm aumento de receita com merchandising, com licenciamento, com patrocínio, é mais visível e o patrocinador vai ficar associado a um evento muito mais interessante. E num médio prazo isso tem efeito na conta de direitos de TV.
Então, há enormes benefícios em se encher o estádio. O preço praticado deveria ser o que adequa a oferta à demanda para lotar. E se chegar um dirigente e falar que o preço não cobre a operação, então, ele tem um problema na operação. Ele está gastando mais na operação do que o mercado pode compensar.
Os novos operadores significam um cara a mais para dividir a conta. A receita não vai aumentar aumentando o preço do ingresso. Aumenta aumentando a escala da operação, ou seja, reduz o preço do ingresso, enche o estádio, aumenta a receita global, inclusive, outros tipos de receitas dos clubes. Mas os clubes insistem com uma estratégia que não sei mais qual a informação que precisam ter para chegar à conclusão que esse modelo vai esvaziar os estádios.