Uma velha rivalidade do futebol brasileiro voltará à tona neste sábado na Arena da Baixada. Se em campo o duelo será entre Atlético-PR e Vasco, fora dele os personagens principais estão sentados nas cadeiras dos presidentes: Mário Celso Petraglia e Eurico Miranda, respectivamente. Inimigos declarados, os dois dirigentes colecionam rixas desde os anos 1990 com direito a socos, acusações e troca de farpas. Se unem apenas nas circunstâncias que os levaram novamente ao poder: passaram de esquecidos à solução depois de verem seus antecessores (Marcos Malucelli e Roberto Dinamite) amargarem rebaixamentos para a Série B.
Caso Ivens Mendes
O primeiro embate foi ainda na década de 1990. Em 1997, estourou um suposto esquema de venda de resultados e financiamento de campanhas políticas. O pivô do caso foi Ivens Mendes, então presidente da CONAF (Comissão Nacional de Arbitragem de Futebol), órgão responsável pela escalação dos árbitros em competições organizadas pela CBF. Um dos jogos investigados foi a partida Atlético-PR 3 x 1 Vasco pela Copa do Brasil. Em uma das ligações gravadas, Mendes teria pedido ao presidente Petraglia uma quantia para supostamente favorecer o Furacão. Edmundo foi expulso naquele jogo, e o Cruz-Maltino acabou eliminado.
O problema chegou à Câmara Federal e foi criada uma subcomissão especial para investigar o caso. Então deputado federal e vice-presidente de futebol do Vasco, Eurico era um dos integrantes da subcomissão e pediu o adiamento da partida entre Grêmio e Corinthians pela semifinal da Copa do Brasil (o Timão tinha eliminado o Atlético-PR). Mas não foi atendido.
Troca de socos e Brasileirão 2004
A principal polêmica entre os dois, no entanto, aconteceu em 2004. Segundo reportagens da época, Eurico e Petraglia (então presidente do Conselho Deliberativo) teriam chegado às vias de fato em uma reunião do Clube dos 13 em novembro. O problema teria sido uma discussão sobre critérios de distribuição das cotas de televisão. O troco do presidente vascaíno viria menos de um mês depois. Na penúltima rodada do Campeonato Brasileiro, as duas equipes se enfrentaram em São Januário. O Vasco lutava contra o rebaixamento e o Atlético-PR poderia ser campeão antecipada em caso de vitória.
Em campo, o Cruz-Maltino venceu por 1 a 0 e acabou tirando a liderança - e o possível título - do rival. Fora dele, polêmicas. O Atlético-PR reclamou muito de decisões tomadas pelo rival visando desestabilizar os paranaenses. Já na chegada a São Januário, o ônibus teria sido cercado por torcedores, chacoalhado e ainda tido uma de suas janelas quebradas. Dentro do estádio, mais surpresas: o vestiário estava trancado e tinha sido pintado recentemente.
Dias depois da partida, Eurico ainda acionou o Atlético-PR no Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) acusando o rival de ter oferecido R$ 1 milhão para o Vasco vencer o Santos - adversário direto pelo título - na última rodada. Eurico tratou o caso como corrupção.
- Eu a repeli a proposta de pronto; e adverti a pessoa que não admitia que falassem com meus jogadores - explicou na época.
O Furacão negou as acusações.
- O Atlético não entra nesse jogo. Esse expediente tem sido usado por nossos adversários, que estão oferecendo algum tipo de compensação financeira para que outras equipes tirem pontos de nós. Qualquer tipo de declaração nesse sentido será repudiada. Não partiremos para nenhum expediente extra-campo - disse o então presidente do Conselho Gestor João Rocha Fleury.
Briga em Joinville e ''dor de corno''
Todo o problema ficou vivo na lembrança de Petraglia. Tanto que o presidente classificou a briga generalizada de torcedores em Joinville na última rodada do Brasileirão 2013 como uma herança da era Eurico Miranda.
- Vimos aqui no último jogo um time correndo, passando por cima de um adversário. Infelizmente essa alegria foi dividida com uma tristeza muito grande de vermos esses vândalos, esses arruaceiros, essa herança do Eurico Miranda de 2004, quando fomos jogar lá uma das finais do Campeonato Brasileiro daquele ano. Ele abriu os portões (para a torcida), fomos mal atendidos, mal recebidos, não tivemos condições de aquecer no campo. Ele nos trancou naquele vestiário ridículo daquele estádio ultrapassado. Foi lamentável aquele jogo e nós acabamos perdendo o campeonato. Mas hoje esta aí, a bola é redonda e o troco veio de cinco. Hoje sobrou mais um para o caixão do seu Eurico Miranda - disse.
O vascaíno, que na época era presidente do Conselho de Beneméritos do Vasco, respondeu ao que chamou de ''sandices'' e classificou como ''dor de corno'' do inimigo.
- Depois tenho que ouvir sandices que esse senhor falou a respeito do futebol carioca e de administração esportiva. De administração esportiva ele não entende nada, não sei se ele entende outro tipo de administração nem sei como conseguiu as coisas em sua vida. Deve ter conseguido outras coisas saqueando alguém, deve ter saqueado. Ele entende tanto de administração esportiva que veio pegar alguém aqui que foi formado no Vasco, que é o Antônio Lopes (NR: em 2013 ele trabalhava no Atlético-PR). Veio pegar aqui com os imbecis do Rio de Janeiro. Isso é mais uma prova de que ele está e continua como uma grande dor de corno.
Hoje
Os dois não gostam de ser comparados. Petraglia voltou ao poder no final de 2011. Eurico reassumiu em dezembro de 2014. O presidente cruz-maltino vive uma fase tranquila. Se em seus primeiros mandatos ele chegou a barrar alguns jornalistas de entrar em São Januário, a relação no retorno tem sido tranquila até agora. Só se posicionou com mais ênfase em dois momentos: ao repudiar a tentativa do Grêmio em contratar o técnico Doriva e ao rebater a declaração do atacante Dagoberto de que ''a realidade do Vasco não era o título''
- Atleta não tem opinião diferente da minha, nem nenhum profissional. Pode inadvertidamente se manifestar antes de eu manifestar minha posição (...) Quando digo isso é sentido de protegê-los, não a mim, eu que tenho que arcar com o ônus do que penso e do que passo para eles. Não sou dos que dizem que proíbo que Beltrano fale ou não. Quando tomo essas posições, estou pronto para depois receber todas as investidas, críticas. Pergunta de novo a ele (Dagoberto). Antes eu não havia falado nada, agora eu falei - frisou.
Do lado atleticano, Petraglia segue com seus inúmeros desentendimentos com a imprensa. Chegou a proibir o acesso das equipes de rádio e restringir o trabalho de emissoras de televisão na Arena da Baixada. Após disputa judicial, os jornalistas ganharam o direito de trabalhar normalmente no estádio. Durante o Campeonato Paranaense deste ano, as entrevistas pós-jogo eram abertas para as rádios.
Neste início de Brasileirão, porém, após mais um desentendimento, o presidente atleticano voltou a criar empecilhos para os veículos de comunicação que não têm diretos de transmissão do campeonato. Após o jogo contra o Figueirense, quarta-feira, o técnico Milton Mendes e o meia Nikão, selecionados para a entrevista, não responderam às perguntas feitas pelos repórteres de rádio. "Não estou autorizado a responder tua pergunta", falavam sempre que questionados.