Quatro letras no nome e muitos gols nas estatísticas. É inegável que Nenê e Cano são os principais destaques de Fluminense e Vasco em 2020. Mas enquanto os artilheiros não param de estufar as redes adversárias, dois gringos "coadjuvantes de luxo" roubam a cena longe dos holofotes: o uruguaio tricolor Michel Araújo e o argentino vascaíno Martín Benítez. São eles que "carregam o piano" para os times funcionarem e se tornaram peças-chave dos técnicos Odair Hellmann e Ramon Menezes.
Se ambas as equipes chegam com moral para o clássico deste sábado, às 19h (de Brasília), no Maracanã, pela sexta rodada do Campeonato Brasileiro, muito se deve aos dois gringos que foram importantes na classificação para a quarta fase da Copa do Brasil nos últimos dias. Enquanto Benítez fez um gol, deu uma assistência e foi o nome da vitória por 2 a 1 sobre o Goiás, Michel Araújo também serviu Nenê uma vez e foi um dos melhores em campo nos 3 a 0 em cima do Figueirense.
Carregando as esperanças de tricolores e vascaínos, eles vão se enfrentar pela primeira vez neste sábado. No clássico pelo Campeonato Carioca antes da pandemia, vencido pelo Fluminense por 2 a 0, ambos ainda eram reservas de suas equipes. Sob o comando de Abel Braga no Vasco, Benítez chegou a entrar nos minutos finais daquela partida, enquanto Michel Araújo sequer saiu do banco na ocasião. Depois de uma adaptação longa e bem sucedida, chegou a hora de confrontarem os sotaques.
O gringo das Laranjeiras chegou primeiro do que o de São Januário ao Brasil. Aos 23 anos, Michel Araújo vestiu a camisa tricolor ainda em janeiro e foi o maior investimentos do Fluminense para a temporada: o clube pagou US$ 800 mil dólares (cerca de R$ 3,3 milhões) ao Racing-URU por sua contratação e apostava alto no meia-atacante de boa finalização.
Mas a estreia do camisa 15 foi para lá de discreta. Ele entrou em campo na derrota para o Boavista e jogou apenas 33 minutos, participou de uma única jogada e sequer chutou a gol. Odair, porém, pedia paciência com o uruguaio, que tem origem humilde e chegou muito tímido para sua primeira experiência internacional. Sua mulher, Margarita, e o filho, Lautaro, vierem juntos do Uruguai.
O processo de ambientação demorou mais do que o esperado. Enquanto o outro gringo do elenco, o peruano Fernando Pacheco, começou a jogar mais rápido e até a fazer gol, o uruguaio, acostumado com um estilo de jogo mais cadenciado em seu país, pelejou diante da maior intensidade no futebol brasileiro. Mas à medida que foi se enturmando com o elenco, foi se habituando também em campo.
Odair enxergou no uruguaio características para jogar como segundo ou terceiro homem de meio de campo, um pouco mais recuado e armando o jogo. Michel já até brincou que está tendo que aprender também a marcar, o que lhe rendia críticas em seu país. Mas deu certo e abriu um leque de opções para a equipe. Hoje, ele tem atuado tanto na trinca de volantes quanto aberto como "ponta-direito".
E depois que marcou o seu primeiro gol pelo Fluminense, no amistoso com o Botafogo, sua confiança aumentou, e ele passou a demonstrar o futebol que a torcida tanto esperava. Assumiu a condição de titular na segunda rodada do Brasileiro e não saiu mais. Fez mais dois gols, só que anulados contra Inter e Athletico-PR, e deu sua primeira assistência, para Nenê, na vitória sobre o Figueirense.
Com muita disposição para fazer o famoso "box to box" (jogar de área à área), vem sendo um dos melhores em campo ao lado de Nenê, não só ajudando na marcação, mas também criando situações de gol no ataque. O Fluminense comprou 50% dos direitos econômicos do uruguaio, que assinou contrato até o fim de 2023, e tem a opção de comprar mais 40% por US$ 1,2 milhão (R$ 6,7 milhões).
Por sua vez, Benítez desembarcou no Rio de Janeiro um mês depois de Michel Araújo. Também veio com a esposa, Maria Luz, e a filha, Ambar, para sua primeira experiência internacional. O Vasco precisava de um camisa 10, e o argentino do Independiente queria respirar novos ares. Seria o casamento perfeito? Na teoria, sim. Mas na prática a relação demorou a engrenar.
A contratação no fim de fevereiro foi cercada de expectativa, mas com um pingo de desconfiança. Apesar do passado vitorioso, o meia de 26 anos não vivia um bom momento no Independiente, que não dificultou seu empréstimo sem custos ao Vasco por um ano. O jogador, porém, abriu mão de um dinheiro que o clube de Avellaneda o devia para concluir a negociação.
O início não foi muito animador. Benítez se apresentou com uma lesão muscular e demorou a entrar em campo. Quando estreou, ainda buscando a melhor forma física, jogou discretamente apenas alguns minutos contra Goiás e Fluminense, antes da paralisação por conta do novo coronavírus. A suspensão dos campeonatos foi benéfica para o meia, que teve tempo para entrar em forma.
O resultado o torcedor vascaíno tem acompanhado neste começo de Brasileiro. Benítez se tornou peça fundamental na engrenagem de Ramon no Vasco. É o camisa 10 armador, de bons passes e visão de jogo que faltava. O homem que o clube buscava. Além disso, tem se entendido perfeitamente com o compatriota Germán Cano, dentro e fora de campo.
Ele já tem duas assistência, uma para Cano, contra o Macaé no Carioca, e outra para Henrique, diante do Goiás na Copa do Brasil, jogo onde também marcou pela primeira vez com a camisa da Cruz de Malta. Foi o nome da classificação vascaína com passes decisivos, dribles certeiros e ainda cobrou com sucesso um dos pênaltis na disputa no fim. Resumindo, jogou muito.
A questão é: até quando o Vasco poderá contar com Benítez? Emprestado até dezembro, o argentino não está garantido na reta final do Brasileiro. O clube carioca já abriu negociações para ampliar o empréstimo, mas o Independiente faz jogo duro e só aceita vendê-lo.