Por Alvaro Oliveira Filho
Pior do que ver torcedor passar horas numa fila para comprar ingressos e ser recebido no estádio com gás de pimenta é ouvir, de quem deveria cuidar para que isso não acontecesse, justificativas estapafúrdias e uma conclusão nada original, responsabilizando pelo tumulto acredite se quiser o próprio torcedor. O presidente do Vasco, Roberto Dinamite, ao saber da confusão em volta do estádio de São Januário, uma hora antes do início do jogo contra o Avaí, na última quarta-feira, preferiu lavar as mãos. Sequer foi ao local verificar o que estava acontecendo. De longe, disse que a culpa era do torcedor, que optara por ficar bebendo nos bares próximos, deixando para entrar em cima da hora.
Esta é apenas uma parte do problema, provavelmente a menor. Existem mesmo aqueles que, diante da proibição da venda de cerveja nos estádios, preferem esperar a hora do jogo num bar próximo. Mas também é verdade que o belo e bem conservado estádio de São Januário é uma instalação esportiva antiga, ultrapassada, que não oferece conforto e segurança em jogos de maior apelo.
Inaugurado há 84 anos, ainda hoje é o maior orgulho de quem torce pelo clube. Mas só passou por maquiagens nestas oito décadas. A última, no início deste ano, com a pintura das arquibancadas.
Há poucos portões e poucas catracas, os banheiros sob as arquibancadas são imundos e os poucos bares não oferecem condições mínimas de higiene. Os policiais costumam fechar ao trânsito um trecho da rua que passa atrás da arquibancada, mas não isolam a área. Ou seja: estando ou não com ingresso, o torcedor consegue chegar até a catraca. É claro que, em ocasiões como a de quarta-feira, com os ingressos esgotados, alguns oportunistas procuram se aproveitar da confusão para conseguir entrar. Por que não criar uma área de segurança, impedindo o acesso de pessoas sem ingressos? Por que deixar que todos cheguem até a catraca para só então verificar se a pessoa pode ou não entrar no estádio? É um erro tão básico que não dá para aceitar simplesmente a desculpa da incompetência. Fazem assim porque é ali, nas catracas, que acontecem as negociatas. Quem não tem ingresso consegue dar um jeitinho de entrar, em troca de uma gratificação.
Quando o tumulto começa, os cassetetes e os tubos de gás de pimenta entram em ação, sem fazer distinção entre crianças e idosos, entre homens e mulheres, entre baderneiros e pessoas que simplesmente tentam fazer valer o seu direito de assistir ao jogo. Afinal, passaram horas numa fila para conseguir comprar este direito.
Culpar o torcedor é, no fundo, uma admissão de incapacidade, de comodismo. É mais fácil esquivar-se da responsabilidade do que construir novos acessos, reformar bares e banheiros, acabar com a bandalheira que continua reinando nas catracas. Isso dá muito trabalho.
(Matéria reproduzida diretamente da versão papel do Jornal Lance)