Auxiliar do técnico Ricardo Gomes desde 1999, Cristóvão Borges terá pela frente um dos maiores desafios de sua vida. O fiel escudeiro do comandante cruz-maltino será o encarregado de comandar o time enquanto o titular está internado no hospital em estado grave após sofrer um acidente vascular cerebral (AVC) no último domingo, durante o clássico contra o Flamengo. Apesar da angústia de ver o amigo em situação complicada, ele busca forças para se concentrar em armar a equipe visando o confronto diante do Ceará, nesta quarta-feira, às 18h (de Brasília), em São Januário, pela 20ª rodada do Campeonato Brasileiro.
E nem mesmo a possibilidade de seguir no comando da equipe até pelo menos o fim do ano parece preocupar o auxiliar, que evita pensar no futuro enquanto a situação do amigo Ricardo Gomes não se estabilizar.
- Tudo é muito recente. A pancada foi muito forte. Tanto que nem pensei nisso ainda. Minha missão é imediata. Precisamos primeiro resolver essa situação complicada para só depois respirar e conversar. Toda a atenção está direcionada para esse jogo. Depois, dando tudo certo, aí sim vamos pensar no futuro - avisou.
Baiano de Salvador, Cristóvão tem 52 anos e muita história no futebol. Como atleta, começou no Fluminense e ainda passou por clubes como Corinthians e Grêmio. Ficou conhecido pela elegância com a bola nos pés. Atingiu o auge de sua carreira no clube gaúcho. Destaque e capitão do time, chegou à Seleção Brasileira principal e conquistou o título da Copa América de 1989. Com a camisa amarelinha, ele disputou oito partidas, todas naquele ano, e marcou três gols. Foram quatro vitórias, dois empates e duas derrotas.
A amizade com Ricardo Gomes vem de longa data. O início foi nas Laranjeiras, onde chegaram a jogar juntos no início da década de 80. A parceria fora das quatro linhas, no entanto, só começou a partir de 1999. O reencontro foi em um curso sobre futebol organizado por Parreira e Zagallo. Cristóvão participou do seminário e Gomes, que tinha acabado de sair do Paris Saint-Germain, foi convidado a dar uma palestra sobre o esquema 3-5-2. De uma variação tática nasceu uma parceria que dura até hoje.
O primeiro desafio foi em 1999, no Vitória. Depois seguiram juntos no Sport, novamente Vitória, Guarani, Coritiba, Juventude, Seleção Olímpica, Fluminense e Flamengo. Em 2005, Ricardo voltou a trabalhar na França, dessa vez no Bordeaux e, como o clube europeu já tinha uma comissão técnica fixa, a parceira se desfez por alguns anos. Nesse meio tempo, Cristóvão foi convidado para ser o auxiliar de Toninho Cerezo no Al Shabab, dos Emirados Árabes.
- Foi por isso que não trabalhamos juntos no São Paulo. Quando retornou ao Brasil, o Ricardo me chamou para voltar a trabalhar com ele. Só que eu ainda tinha mais um ano de contrato nos Emirados - lembrou Cristóvão.
O primeiro problema médico de Ricardo Gomes, também um AVC, só que bem mais leve do que o atual, aconteceu quando os dois estavam separados. Mas o auxiliar garante que o amigo vinha se cuidando e estava tranquilo, uma vez que os exames nada apontavam.
- Fiquei sabendo do problema e depois ele me contou melhor. Ricardo tem alguns picos de pressão alta, o que pode acontecer com qualquer pessoa. Só que depois daquele caso ele fez vários exames e os resultados não apontaram nada. Por isso ele ficou tranquilo - disse o auxiliar, confirmando que o pai do treinador passou pela mesma situação - Ele já me contou isso há algum tempo. Não me lembro dos detalhes, mas é verdade. O pai do Ricardo teve o mesmo problema.
O estilo parecido dos dois pode ser uma das explicações para tanta sintonia. Homem de confiança de Ricardo, Cristóvão também conquistou o elenco e os funcionários do departamento de futebol com polidez e seriedade. Apesar do jeito reservado, não é difícil vê-lo rindo em meio aos jogadores. Por alguns deles, o auxiliar é chamado pelo apelido de \"Presença\". Inspirado em Gomes e com o apoio do elenco, Cristóvão terá a missão de não deixar o abatimento tomar conta do time. Nada melhor do que começar com uma vitória sobre o Ceará.