A julgar pela fala mansa atrelada ao tom educado, poucos arriscariam que Marcelo Oliveira, novo comandante do Vasco, é um disciplinador nato. O treinador garante que todos no elenco terão de rezar em sua cartilha, mas não devem se assustar, pois, como bom mineiro, a conversa no canto costuma se sobrepôr aos gritos comuns no futebol brasileiro à beira do gramado. De acordo com ele, é melhor explorar o dia de trabalho a perder o controle na hora H.
Apesar do estilo professoral, Oliveira foi boleiro. E dos bons. Meia-atacante de mais de cem gols pelo Atlético-MG, chegou à Seleção Brasileira de Telê Santana. Por isso, sabe que, acima de tudo, o que o jogador precisa é de respeito no tratamento para a harmonia e o bom rendimento.
- Digo que sou um treinador que gosta de tratar o atleta como eu gostava de ser tratado: como um ser humano, com suas necessidades, e que posteriormente virou um atleta. O respeito é fundamental. Mas tem de ter conscientização da profissão que escolheu. Cobro muito nesse sentido, sou intolerante com indisciplina. Busco os objetivos intensamente. E não sou de gritar, no jogo especialmente, porque prefiro a leitura panorâmica, raciocinando, falando com alguém mais próximo. Acredito também que boa preparação no dia a dia evita isso - afirmou.
Entrar na noite estudando um adversário é prática comum para Marcelo Oliveira, que admite ser metódico no vestiário até quando motiva seu time. No Vasco, a obsessão já se manifestou: é o título brasileiro, que, apesar de longe, foi citado com frequência em sua apresentação oficial, logo após o treinamento de quinta-feira, em São Januário.
- Tenho o hábito de nos primeiros contatos usar tópicos indicando a forma de trabalhar, o método, para aí então destacar questão e aspectos como disciplina, estabelecer objetivos, mostrar a ambição que eles devem ter. É um privilégio trabalhar em algo que amamos, tem de ter prazer de vir ao clube trabalhar. São inúmeros os motivos para isso. Fazer o melhor a partir disso é mais fácil. Nosso objetivo é equilibrar todo o potencial para mirar o título. Há confrontos diretos, são 11 pontos (para o líder Fluminense), as equipes caem de produção, tropeços acontecem com todos. Com disciplina e trabalho, podemos chegar - aposta.
O caminho para a consagração passa por dois atalhos importantes, que ampliam o otimismo do novo treinador cruz-maltino: a base pronta e acostumada a vencer e o tempo para desenvolver sua filosofia, já que as próximas três semanas serão cheias. Ainda assim, prefere não estabelecer um prazo para ser cobrado diretamente pelos resultados.
- Não sei precisar o tempo (para deixar o time como quer), é muito variável. Até porque já tem um trabalho feito pelo Cristóvão (Borges, ex-técnico), não vou mudar muito. Essas semanas realmente são produtivas e importantíssimas para trabalhar, porque normalmente se treina pouco no Brasil. Faremos jogadas ensaiadas e poderemos observar bem melhor a condição de cada um.
A falta de tempo e condição financeira para contratar algum reforço de última hora já foi assimilada por Marcelo Oliveira, que não lamenta e vê até um grupo numeroso à sua frente. Fazer renascer a gana de astros como Felipe e conciliá-lo com Juninho em campo é que surge como um dos maiores desafios. Para ele, é possível vê-los juntos. Na era Cristóvão, a discussão não teve fim. As idades avançadas e as funções táticas pesavam contra.
- Até podem (jogar juntos), e acho que é muito mais difícil tornar um jogador mais limitado em técnico do que exigir que o criativo e técnico faça uma recomposição, ajude mais. É possível, mas não diria que vou escalá-los agora. São ótimos como poucos e é possível adequá-los, mas vamos ver os primeiros dias - avaliou o técnico, que não terá o camisa 6, suspenso, contra o Cruzeiro, em Varginha, domingo, numa estreia em que, espera, vai ter final feliz.