A saudação é famosa, mas talvez só o ex-jogador Roberto Dinamite sinta-se realmente elogiado quando o governador Sérgio Cabral (PMDB) dispara mais um \"meu craque!\". Os demais já sabem que o cumprimento predileto de Cabral é universal. Ele é generoso nos paparicos e, muitas vezes, no tempo que dedica ao visitante, convertendo audiências formais em intermináveis bate-papos. A conversa fica mais agradável quando envereda para a amizade com o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Feliz, candidato à reeleição, o governador imita a voz de Lula. Sua língua presa é de fazer inveja aos humoristas.
Mas Cabral não é um carioca típico, piadista e sem preocupações. Seus gestos denotam inquietude. Um pedaço de papel, trazido pela assessora, é capaz de mudar o clima do ambiente. Ele se irrita com o conteúdo. Diz que não fala com a pessoa mencionada. É para resolver com \"o Pezão\" ou com \"o Regis\" - seus dois fiéis escudeiros, o vice-governador Luiz Fernando Pezão e o chefe da Casa Civil, Regis Fichtner, que assistem à cena silenciosos. Depois de alguns impropérios, recupera a calma e presenteia os visitantes com livros de imagens do Rio.
Agenda e riscos assumidos no cargo limitam roteiro
Ao mostrar as páginas coloridas, Cabral consegue fazer aquilo que a agenda sobrecarregada lhe nega desde 2007, quando assumiu o governo: admirar com sossego uma imagem típica de sua cidade natal. Como governador, seus espaços ficaram limitados. Ele não deixou de circular pelo Rio, mas está sempre cercado de assessores, políticos, eleitores, empresários, seguranças - muitos deles, principalmente depois da pacificação dos morros cariocas.
Nem mesmo o Antiquarius, o restaurante preferido, a poucos metros de sua casa no Leblon, escapou da rotina restrita. Menos frequente, Cabral pede agora que o prato predileto - arroz de pato e salada de rúcula com queijo parmesão por cima - seja entregue a domicílio. Manuel Pires, o famoso maitre Manoelzinho, diz que o governador pode aparecer duas ou três vezes num mês e passar os dois seguintes sem dar as caras:
- Quando aparece, não deixa de me sacanear. Ele me chama de traidor porque sou português e torço pelo Flamengo.
Futebol, ao lado de Lula, é outro assunto que encanta Cabral. Neste particular, ele não abre mão de um velho hábito. Ídolo e presidente do Vasco, Roberto Dinamite já está acostumado a receber ligações das secretárias do governador, pouco antes do início de uma partida, para avisar que ele está seguindo para o estádio - geralmente o Maracanã -, quase sempre ao lado dos filhos mais velhos.
- Nos jogos, fala muito e é supersticioso. A gente sempre assiste junto. Uma vez, na campanha pela volta à Série A, alguém se sentou entre eu e ele. Na volta do intervalo, o governador pediu à pessoa para trocar de lugar. Em seguida, o Vasco marcou o gol da vitória - conta Dinamite.
Orgulhoso por ter sido, na juventude, campeão de futebol de praia, Cabral hoje é esportista esporádico. Seu contato com a atividade física é visual - quando o Vasco entra em campo ou quando filho mais velho, João Pedro, de 22 anos, entra na pista da Hípica, montado em um de seus dois cavalos de saltos, para disputar mais uma prova.
Outros hábitos, contudo, cederam à agenda oficial. Até tomar posse, Cabral frequentava em Ipanema a \"Maison\" do cabeleireiro Rudi Werner. Como governador, passou a cortar o cabelo em casa, de 20 em 20 dias, a qualquer hora - seis da manhã ou 11 da noite. Werner, vez por outra, é acompanhado do calista Flávio.
- O corte leva meia hora e, para relaxar, evito conversar sobre política. Faço um corte clássico moderno, que deixa um ar sério.
Werner, que atende Cabral há nove anos, passou ultimamente a cortar mais curto por um motivo que se cerca de cuidados para comentar: a gradual calvície do cliente. \"Quanto mais trabalho, menos cabelo\", desconversa. Vaidoso, o governador usa xampu Kérastase - Bain Prevention para deter o processo.
Embora Cabral tenha chorado publicamente este ano, quando a Câmara aprovou a redução dos royalties do petróleo para o Estado do Rio, e diga que o pior dia, como governador, foi no da morte do menino João Hélio, em fevereiro de 2007, alguns fios de seus cabelo devem ter caído quando Lula, em sua companhia, foi recebido com uma estrondosa vaia no Maracanã, na abertura dos Jogos Pan Americanos, também em 2007.
- Foi um momento triste, vaia organizada.
Estratégia que desenvolveu desde que era presidente da Assembleia Legislativa, Cabral preza alianças amplas - o lema do governo é \"Somando forças\" - e se diz amigo de meio mundo da política. Sua fidalguia, porém, não incluiu três desafetos: o ex-prefeito Cesar Maia, para ele o grande articulador das vaias a Lula, o ex-governador Anthony Garotinho e o conselheiro recém-aposentado do Tribunal de Contas José Nader.