Fernando Dantas/Gazeta Press
Roberto Dinamite tem usado o Vasco para ajudar amigos e parentes na venda de ingressos
O analista de sistemas Roberto Socorro é daqueles torcedores que vão a todos os jogos. Quando o Vasco se classificou para a final da Copa do Brasil, ele não mediu esforços para assistir à partida.
- Não importava onde eu ia dormir, se eu não ia dormir, se ia comer, o que importava era eu estar em Curitiba e ter o ingresso para entrar no jogo.
Sócio e frequentador de São Januário, ele viu uma propaganda dentro da loja do clube. O pacote oferecia transporte para o estádio, em Curitiba, hotel e o ingresso por R$ 400. Mas Roberto foi barrado na festa.
- Eu cheguei ao estádio e de cara o bilheteiro olhou para o meu ingresso e falou que era falso. Ele me mostrou um verdadeiro e visivelmente dava pra ver que o ingresso era falso, pela cor e pela textura do ingresso. Roberto ficou revoltado:
- Não se sabe o que foi pra agência, o que foi pra torcida organizada, o que foi pro patrocinador, para os amigos do presidente e da diretoria, simplesmente não foi colocado à venda e nenhum esclarecimento foi feito aos sócios.
No entanto, a situação foi bem diferente quando foi realizada por outra via. E por um caminho que, curiosamente, tem relação com membros do clube. E grandes membros.
Os torcedores que compraram ingresso em uma agência de viagem no bairro da Barra da Tijuca tiveram mais sorte. A Essential Travel vendeu 75 pacotes para levar os vascaínos a Curitiba.
O curioso é que a agência tem uma estreita relação com o presidente do Vasco. A dona, Rosângela Jabur, é amiga do presidente do clube, Roberto Dinamite. E mais: a filha é namorada de Rodrigo Dinamite, filho do ex-camisa 10 do Vasco.
No dia do jogo, Rosângela, conhecida em São Januário como Danda, postou no Twitter que ainda havia dois pacotes à venda.
Procurada, Rosângela não quis gravar entrevista.
Por telefone, a empresária admitiu que não está credenciada pelo clube, mas que frequenta as sociais do Vasco. Ela não quis responder como conseguiu os ingressos.
- Eu só deveria perder a minha fonte se os meus ingressos estivessem envolvidos com alguma falcatrua, como eles efetivamente foram legais, eu não preciso dizer a você como que consegui eles[ sic] . - Onde eu consegui, isso não importa.
Recentemente, Roberto Dinamite já foi obrigado a dar explicações sobre a agência de turismo do genro dele ser responsável pelas viagens do time.
Pelas denúncias, a Locaflat recebe vinte por cento de comissão quando, normalmente, em contratos semelhantes, a remuneração é de 10%.
Candidato à presidência do clube, Pedro Vicente ironiza a relação de Dinamite com a agência.
- Lá em São Januário, inclusive, se apelidou jocosamente essa empresa que se chama Locaflat de Genrotur.
- O Roberto não está acostumado a ser contestado na mídia, vem sendo blindado esse tempo todo, ele reagiu muito mal, falando até em matéria paga, coisa que não tem nada a ver. E agora esse novo escândalo da Sogratur, né?
O Vasco negou ter algum tipo de influência sobre a agência que comercializa os ingressos.
MP investiga
Segundo o Ministério Público, existe um esquema lucrativo que envolve dirigentes, torcidas organizadas e cambistas na venda de ingressos.
Nos últimos três anos, jogos importantes, como a final da Taça Libertadores foram marcados por confusão e tumulto na venda de ingressos.
A farra dos ingressos chamou a atenção do Ministério Público, que decidiu investigar o caso.
Para a promotoria, o esquema começa com os clubes. Dirigentes repassam os ingressos para as torcidas organizadas, que encaminham os lotes aos cambistas.
A venda, com ágio, alimenta o sistema no qual todos saem ganhando em cima do torcedor. É o que diz o promotor Rodrigo Terra.
- Parece que há uma relação dos clubes, não só com as próprias organizadas, mas também com a empresa que comercializa esses ingressos, já que é ela que detém o poder de confecção do ingresso, distribuição, comercialização e arrecadação, ou seja, ela domina todas as etapas desse processo, o que facilita de uma certa forma a prática de ilegalidade.
E não é só o torcedor que é enganado. O visitante que gosta de futebol também cai numa armadilha.
O Ministério Público identificou que ingressos são desviados para agências de turismo e depois oferecidos nos hotéis por um preço até três vezes acima do valor original.
O recepcionista de um desses hotéis justificou o preço superfaturado da venda casada.
- O preço normalmente é de R$ 150 por pessoa, com transporte e os ingressos. Às vezes, quando se trata de um jogo concorrido, eles vão e botam, majoram o preço a mais [sic].
Há três anos, a promotoria convocou os quatro grandes clubes do Rio a assinar um termo de ajuste de conduta. O documento exige a transparência no repasse de ingressos às organizadas, a criação de uma ouvidoria para atendimento do torcedor e a publicação dos balanços dos clubes.
Até agora, só o Fluminense assinou o acordo.
O promotor Rodrigo Terra disse que é preciso enfrentar essas pessoas que se beneficiam do esquema.
- Existe um modelo que já está estabelecido há muito tempo e que tem uma série de beneficiários, e enfrentar esse esquema, desfazer essa maneira de vender ingresso é um desafio que vai enfrentar a resistência de quem se beneficia disso.