A falta de visibilidade nacional do futebol amazonense, em função da longa ausência de clubes locais nas Séries A e B do Brasileirão, não só afugenta os jovens torcedores dos estádios em Manaus como os distancia das agremiações e os aproxima das escolinhas de grandes clubes cariocas. Sem formação das categorias de base, os clubes amazonenses forçam a migração para filiais de Flamengo, Vasco e Botafogo.
Núcleos desses três clubes ensinam os fundamentos do futebol a 100 alunos, em média. A única exceção é o Estrelas do Futuro, do Botafogo, com uma turma de 40 alunos. É a mais jovem escolinha de Manaus. Não temos jogadores suficientes de cada categoria para formar uma turma por divisão (do Sub-7 ao Sub-17), mas quando a escolinha do Botafogo funcionava no nosso antigo endereço, na Compensa (zona oeste da capital), tínhamos bem mais garotos matriculados, disse o técnico Rômulo Gonçalves da Silva, 45.
Rômulo, que é também treinador e coordenador, revela que os principais motivos pela baixa presença de mais jogadores se devem à falta de publicidade do núcleo e à troca de endereço. Faz três meses que nos mudamos para o Olímpico Clube (na Avenida Constantino Nery, zona centro-sul). Ninguém conhece nossa unidade ainda e os que treinavam conosco na Compensa não querem vir até aqui para seguir na escolinha, lamentou. A primeira avaliação com coordenadores do Botafogo para selecionar jogadores para testes no clube no Rio deve ocorrer até maio de 2012, disse o técnico.
As peneiras anuais com supervisores do clube no Rio, participação em competições nacionais e intermediação para testes nas agremiações são os maiores atrativos das escolinhas. Um meia-esquerda, o Léo, fez testes no Flamengo e está lá desde 2007. Todo ano, selecionamos e levamos de 4 a 5 jovens para serem avaliados até por outro clubes cariocas, como Vasco e Botafogo, disse Arlício Ribeiro dos Santos, 40, técnico da escolinha rubro-negra.
Com 160 alunos, a unidade do Flamengo funciona há oito anos na capital e também mudou de endereço. Agora, funciona no Clube do Trabalhador do Sesi, no São José I, zona leste de Manaus. Aqui, temos dois campos com medidas oficiais e grama sintética. Nossa comissão vai além do técnico e preparador físico, porque contamos com os serviços de um técnico de enfermagem e médico, disse Santos, que é mineiro e jogou no Nacional, Sul América e no Cliper. Meu apelido era Esquerdinha, lembrou.
A escolinha do Fla tem turmas do Sub-7 ao Sub-17. Em média, 95 alunos participam da seletiva para o Flamengo. Em 2012 haverá duas peneiras: uma em janeiro e outra em setembro.
Vasco tem mais adeptos que o Flamengo
Clubes de maior torcida em Manaus, Flamengo e Vasco quase empatam em número de alunos matriculados nas respectivas escolinhas. O Cruzmaltino leva vantagem com 150 crianças e adolescentes, entre meninos e meninas. O técnico e coordenador Josivaldo Rodrigues, 28, afirma que a quantidade de alunos é sazonal. Geralmente, é só no período de recesso escolar, como em julho e dezembro, que há mais matrículas, declarou.
A unidade do atual vice-campeão brasileiro funciona no Planeta Bola, no Alvorada, zona centro-oeste de Manaus. Segundo Rodrigues, o maior recorde da escolinha foi de 320 jovens matriculados em 2010. Foi quando fizemos uma excursão à sede do Vasco no Rio de Janeiro. Muitas crianças que não estavam na escolinha se matricularam para ter a chance de viajar e conhecer São Januário (estádio do clube) e alguns jogadores do time profissional, explicou o treinador.
A excursão faz parte do pacote de colônia de férias do clube, o Vasco Camp. Faz dois anos seguidos que vamos à colônia de férias. Passamos uma semana lá, sendo que além de conhecer a estrutura do time, os alunos participam de clínicas de futebol e se forem bem em campo podem seguir no mínimo um mês no Vasco para testes, comentou Rodrigues.
O goleiro Tasso de Luca, 13, é um dos raros casos da escolinha do Vasco em Manaus que conseguiu se destacar e atualmente joga pela equipe mirim do Gigante da Colina. As escolinhas fazem um trabalho mais lúdico com fundamentos do futebol. Nossas prioridades são promover a saúde e lazer e, por último, a iniciação esportiva. Então, para um aluno de escolinha despertar o interesse de um clube famoso precisa ter antes de tudo talento para se sobressair, analisou Rodrigues.
O baixo aproveitamento dos alunos da escolinha no Vasco tem uma explicação simples. Consultei treinadores e supervisores do Vasco, todos foram unânimes em afirmar que o clube quer jogadores prontos. Eles não querem ter trabalho em ensinar tudo, querem só lapidar o potencial dos atletas, revelou o treinador.
Para dar visibilidade e aumentar as oportunidades dos alunos mais jovens ingressarem no clube, a Escolinha Fla Manaus disputa há três anos a Copa das Nações Danone, exclusiva da categoria Sub-11 (mirim). Outra competição para dar ritmo de jogo é o torneio interno Copa Amadeu Teixeira, que está na 7ª edição e agrupa as equipes de Manaus e do interior do Amazonas.
Times sem prestígio em Manaus
Um consenso entre os alunos das escolinhas do Flamengo, Botafogo e Vasco, consultados pelo Portal D24AM, é o desinteresse em jogar por clubes profissionais do Amazonas. Sem visibilidade e um Estadual deficitário, o futebol local não atrai adolescentes como Ruan Fernandes dos Santos, 12. Atacante no Fogão, ele é santista e sonha com a primeira avaliação pelo clube carioca em Manaus. Quero fazer um teste logo no Botafogo e começar uma carreira. Fui procurado uma vez por um empresário para ser avaliado pelo Cruzeiro e Atlético-MG, mas não vingou, disse.
Flamenguista, o meia-atacante Quevenson Cruz Ferreira, 12, também treina há três meses na unidade do Alvinegro, o Estrelas do Futuro, na esperança de ficar tão famoso e rico quanto o ídolo dele, o craque santista Neymar. Fiquei um tempo na escolinha do São Raimundo-AM, mas desisti. Prefiro aqui no Botafogo, porque as oportunidades que surgirem serão melhores, declarou.
O lateral direito da Escolinha do Fla Manaus, Luiz Daniel, 11, já treina há um ano na franquia do clube carioca e participou da Copa Danone de 2010. Pelo Fla, terei a chance de ser visto e me firmar, afirmou Daniel. Ele é uma das apostas para a peneira de 2012, lembrou o técnico Arlício Ribeiro.
Fã de Ronaldinho Gaúcho, o jovem Renan de Souza Ferreira, 12, atua na mesma posição do ídolo e sonha com carreira profissional. Com 15 ou 16 anos, espero jogar por lá (no Flamengo), projetou.
De volta à unidade da escolinha do Vasco, em Manaus, o centroavante Denys Cliver, 15, ficou perto de concretizar o sonho de jogar por um clube de renome e prestígio. Meu pai pagou minha hospedagem lá no Rio, em frente ao Estádio de São Januário. Fiz testes por um mês e só não fiquei porque os jogadores de lá têm um porte físico maior e são mais fortes. Vou regressar ao Vasco e não vou desistir de jogar por um clube grande, aqui no Amazonas não há futuro. Ninguém te ver atuar, declarou Cliver.
O atacante Rodrigo Bentes Franco, 14, tem motivo especial para sonhar pelo Vasco. Ele deixou Itacoatiara (a 176 quilômetros da capital) para estudar em Manaus e entrar na escolinha. O meu pai já faleceu e um sonho dele era me ver jogar pelo Vasco, contou Franco, que é botafoguense de coração e aceitou virar-casaca pelo pai.