Futebol

Empresa que opera o VAR nega problema tecnológico em jogo do Vasco

Sportshub, do empresário Sergio Gomes, de antigo relacionamento com ex-presidente Marco Polo Del Nero, venceu concorrência com serviço 42% mais barato do que o da Série A

Protagonista por não funcionar conforme deveria no empate entre Vasco e Brasil-RS, o VAR da Série B foi defendido pela empresa que opera o serviço. Gerente da Sportshub, Flavio Porto disse que não houve problema na tecnologia durante a checagem do gol de Daniel Amorim.

A empresa foi criada em março do ano passado e iniciou atividades recentes com o VAR depois de parcerias com outras empresas, como a portuguesa Mediapro - a Sportshub fez, por exemplo, jogos do Campeonato Carioca, mas desistiu há poucos dias de realizar partidas do Brasileiro feminino.

Um dos sócios da empresa é Sergio Gomes, de antigo relacionamento com Marco Polo Del Nero, ex-presidente da entidade que comanda o futebol nacional. A Sportshub venceu a concorrência da CBF oferecendo preço por jogo 42% inferior ao ofertado pela concorrente que presta o serviço da Série A.

A única concorrente foi a Hawk-Eye, empresa da Sony Brasil, que tem contrato com a CBF até 2022 para a Série A e outras competições, como a Copa do Brasil.

Na sexta-feira, em São Januário, aos 37 minutos do segundo tempo, Andrey bateu falta na trave e, no rebote, Daniel Amorim mandou para o gol. Em campo, o auxiliar Cipriano Sousa levantou a bandeira e assinalou o impedimento. O árbitro Alisson Furtado, então, aguardou a revisão do VAR. Três minutos depois, confirmou o impedimento.

- Tivemos um relatório, sim. Eu até comentei com a Comissão de Arbitragem, e eles pediram para que os esclarecimentos fossem feitos por eles. É uma questão completamente operacional o que aconteceu em São Januário. O Vasco vai entender exatamente o que aconteceu - disse Flavio, ao atender o ge sem revelar muitos detalhes.

Questionado se a linha do impedimento foi traçada, o gerente da Sportshub respondeu:

- Isso, realmente, eu não posso falar porque esses esclarecimentos serão fornecidos pela CBF. A gente está ali para prover a tecnologia. A gente não faz o VAR, quem faz o VAR são os árbitros. Mas não houve problema tecnológico. Você sabe que o VAR trabalha com a imagem que é fornecida pelo “Broadcaster” (transmissora da partida), então, de repente, essa imagem pode não ser conclusiva. Tem diversos fatores tecnológicos e técnicos. É isso que deve ser melhor explicado. E a explicação é bem tranquila. Mas devem fazer pessoalmente, inclusive, para a diretoria do Vasco. São casos que vão acontecer, não tem jeito. O VAR não vai conseguir resolver 100% das questões.

Nesta segunda-feira, a direção do Vasco irá a CBF para ouvir os áudios do VAR. O clube anunciou, no sábado, que pedirá a exclusão do VAR na Série B e a anulação do jogo no STJD. De acordo com a CBF, "questões técnicas" causaram o problema. Entre os ângulos disponíveis pelas câmeras, não houve imagem que permitisse ao árbitro de vídeo traçar a linha e, consequentemente, checar a decisão de campo. Por isso, seguindo o protocolo do VAR, a marcação do árbitro principal foi mantida.

Empresa tem como atividade principal a publicidade

Sergio Gomes é figura antiga na CBF, conhecida pela relação com Marco Polo Del Nero, ex-presidente da entidade. A Sportshub venceu a concorrência da CBF oferecendo preço inferior ao ofertado pela concorrente que presta o serviço da Série A - a inglesa Hawk-Eye, do grupo Sony. Há disputa de mercado em curso para operar o VAR no futebol brasileiro.

A empresa tem como principal atividade agenciamento de espaços para publicidade. O contrato tem valor total de quase R$ 3 milhões por mais de 200 jogos entre séries B, C e D. O preço é de R$ 12 mil por partida no segundo turno da Segunda Divisão e das fase finais das Séries C e D - a CBF assumiu o custo e implantou a ferramenta.

Empresa que opera o VAR na Série A ao custo de R$ 21 mil a cada duelo, a Hawk-Eye havia ofertado o serviço por R$ 17 mil. E não conseguiu fechar o novo contrato.

Em contato com o ge, Sergio Gomes disse que "não é ele que está fazendo o VAR, mas uma empresa particular", no caso a Sportshub, da qual é sócio-administrador. Ele explicou que faz captação comercial. Sobre a relação com a CBF e Del Nero, Gomes disse que "não faz mais captação de patrocínios para a CBF, só quando tem um cliente interessado".

Flavio Porto, também sócio-administrador, explicou a questão do preço inferior:

- É uma questão de mercado simplesmente (diferença de preço). Não é uma questão de tecnologia inferior. É uma questão de tentar entrar nesse mercado, que é dominado por uma empresa há três anos. Então, é só uma estratégia nossa. Não por questão de equipamento... Na verdade, não posso nem te falar sobre curtos de equipamento da empresa concorrente que faz a Série A. Mas eu posso te garantir que o custo dos nossos equipamentos é bem elevado. São equipamentos específicos de “Broadcaster”. Não são equipamentos que fazem outras coisas. São específicos para o VAR, utilizados no mundo inteiro - alegou Flavio Porto, que completou:

- Eu trabalhei 20 anos com marketing esportivo. No final de 2019, eu saí e gostaria de montar uma agência. Eu conhecia meu sócio, que também queria aumentar a participação dele em negócios. E a gente montou a SportsHub no começo de 2020 para trabalhar com marketing esportivo. Nesse meio do caminho, a gente começou a fazer algumas peças de transmissão de futebol. E aí nessas transmissões é que a gente entrou em contato com esses equipamentos, que poderiam fazer VAR. A gente entendeu que existia um outro sistema, até pelas próprias críticas que vinham sendo realizadas em 2020 na Série A. Eu pessoalmente comecei a pesquisar muito sobre isso e vi que tinha outro sistema que estava sendo utilizado em vários países. E aí a gente começou a ir atrás e criou esse núcleo. Em janeiro, a gente começou a fazer alguns testes com a própria CBF e algumas federações estaduais. Fizemos testes inclusive com o VAR remoto. Esse é o nosso objetivo, oferecer esse serviço - disse Porto.

A empresa quer implementar o VAR centralizado, o que a companhia que atende a Série A ainda não colocou em prática também. No caso, uma central de VAR fora dos estádios.

- A gente ainda não tem previsão, mas pretende implementar o mais rápido possível. A gente sabe que isso evita vários problemas que que a gente tem com alguns estádios. A gente acredita que o serviço fique melhor ainda com salas centralizadas.

Segundo o gerente, a Sportshub tem homologação da FIFA desde fevereiro, quando realizou testes em campeonatos estaduais. Mesma situação de operadores de replay e de estádios que recebem o VAR pela primeira vez. Flavio Porto alegou que a empresa abriu mão de operar no Feminino para não colocar em risco os jogos da Série B.

A reportagem enviou perguntas para a CBF para questionar habilitações anteriores da Sportshub - que também fez o VAR no Campeonato Carioca, além disso ganhou concorrência e desistiu de fazer o mesmo serviço no Brasileiro feminino deste ano -; sobre o custo do VAR 42% menor ao da Série A, se seria compatível com as necessidades de investimento e para entender as diferenças de serviço e tecnologia. Caso a CBF responsa os questionamentos, a reportagem será atualizada.

Sergio Luis de Souza Gomes é dono de outra empresa, a SG Martketing e Comunicação LTDA. Ele foi citado na CPI do Futebol de 2015 quando Del Nero contou que Gomes "foi uma pessoa que trouxe alguns patrocínios para a CBF, como a Chevrolet".

Gomes também era representado em processo cível por advogado do escritório de Del Nero. A relação entre Gomes e Del Nero, que começou para venda de carros Mercedes-Benz, se tornou próxima.

Vasco pede exclusão do VAR

Neste sábado, o Vasco pediu a exclusão do VAR na Série B e a anulação do jogo contra o Brasil-RS. Em nota, o clube de São Januário voltou a fazer críticas à forma como a tecnologia é usada no Brasil, à Comissão de Arbitragem e à CBF. Definiu ainda como "erros grotescos" o que ocorreu na sexta-feira em São Januário.

Segundo o Vasco, os jogos da Série A acontecem com um mínimo de nove câmeras. O clube afirmou ainda que a partida com o Brasil-RS teve cinco câmeras e, no lance do gol legal de Daniel Amorim, não existia nenhuma câmera que permitisse a marcação da linha no pé do atleta.

É a segunda vez em 10 dias que a linha de impedimento do VAR falha em competições organizadas pela CBF. No último dia 25, não houve imagem disponível em gol anulado do Athletico contra o Santos, pela Copa do Brasil - neste caso, a empresa que opera o VAR é a Hawk-Eye. A posição de Vinicius Mingotti, do Furacão, era aparentemente legal, mas o bandeirinha anulou o gol, e a linha do VAR não foi disponibilizada.

No dia 22 de agosto, na Série B, o jogo entre Ponte Preta e Brusque, em Campinas, foi realizado sem VAR. A Sportshub informou que houve "problema técnico no cabeamento do sistema".

O Vasco protagonizou também em 2021, mas na edição do Brasileiro de 2020, lance de defeito da tecnologia. Na derrota para o Internacional por 2 a 0, no dia 14 de fevereiro, o primeiro gol colorado saiu com Rodrigo Dourado, em lance aparentemente impedido. No momento da análise das imagens, a equipe que comanda o VAR não conseguiu traçar a linha. Com a falha, a decisão de campo foi mantida.

O Vasco tentou impugnar o jogo, sem sucesso. O áudio da cabine do VAR, revelado pelo ge em 25 de fevereiro, mostra a indefinição dos profissionais na cabine diante da impossibilidade de traçar as linhas na posição correta.

Em 2019, Hawk-Eye venceu licitação sem sede legal no Brasil

Com contrato com a CBF para operação do VAR na Série A até 2022, a Haw-Eye é empresa de origem inglesa. Quando venceu a licitação da CBF, em 2019, ainda não existia legalmente no Brasil. Na ocasião, acertou custo de cerca de R$ 19 mil por partida. Trinta e quatro empresas disputaram para operar e executar o serviço.

O Ministério Público do Trabalho entrou com ação para questionar a legalidade das atividades da empresa inglesa que é um braço do grupo Sony.

Fonte: ge
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