Futebol

Entrevista de Jorge Salgado ao Abre Aspas

Personagem do mercado financeiro carioca há mais de 40 anos, Jorge Salgado vive o último trimestre de mandato do Vasco entre São Januário, sua casa e o escritório particular no Leblon. Como vice de finanças no fim dos anos 1980, em parceria com Eurico Miranda, então dirigente da CBF, tirou Bebeto do Flamengo num chapéu que é lembrado até hoje.

Na segunda e última parte do Abre Aspas, para além de alguns aspectos do acordo de SAF que comandou - leia aqui -, o presidente do Vasco conta as decisões que tomou à frente do futebol no início de gestão e também fala como convive com as críticas inerentes ao cargo de um clube em crise há mais de 20 anos.

Queria saber sua opinião sobre esse péssimo início do Vasco no Brasileiro. O que acha que houve?

— Olha, eu acho que o início da gestão da SAF não foi da maneira que eu imaginava. Começamos de uma maneira, digamos, não convencional para os meus padrões, deveria ter havido um entendimento maior entre a SAF e nós aqui dentro. Eles tomaram muitas decisões de maneira monocrática. E acho que na política do futebol, eles contavam com uma performance melhor de vários jogadores que subiram da base, havia um entendimento de que a idade deveria ser mais baixa para a gente ter um jogo com mais intensidade. E isso tudo acabou não acontecendo, efetivamente não deu liga.

— Eles modificaram, contrataram melhor e o time agora está em um processo de ascensão. Graças à mesma gestão que fez errado no início, mas soube corrigir. A gestão acerta e erra, você vê isso com a maioria dos clubes. Você tem aí o caso emblemático de um clube milionário, com ótimos jogadores, elenco... O Botafogo foi uma surpresa. Quem da mídia que entende de futebol diria que o Botafogo ia ter essa performance, vindo de um Carioca muito ruim, querendo demissão de treinador?

— O próprio Vasco já estava condenado à Segunda Divisão pela mídia, por muitos influenciadores, torcedores. Quem acreditava que o Vasco pudesse virar esse jogo?

O senhor acreditava?

— Eu sou otimista por natureza, nasci otimista. Acho que nesse mundo do futebol, dos negócios, e eu tenho uma empresa que acabou de fazer 40 anos, você tem que acreditar que o negócio vai dar certo. O campeonato é longo, são 38 rodadas. Você teve vários exemplos aí de times condenados à Segunda Divisão que conseguiram sobreviver. Por que não vou acreditar no Vasco? Vasco fez ótimas contratações no meio do ano, tinha que acreditar. Assim como eu acreditava também que a gente ia subir, apesar do sufoco (risos).

No início da sua gestão, o senhor chegou a conversar com o Rodrigo Caetano e contratou o Alexandre Pássaro. O que aconteceu?

— Quando cheguei no Rodrigo, ele praticamente já tinha acertado com o Atlético-MG. Também tinha custo que não era compatível com orçamento que eu ia ter. Tinha mais ou menos 10 dias para montar esse time (Nota da redação: Salgado assume o Vasco na Série A, toma posse dia 21 de janeiro e o time faz oito jogos, com duas vitórias, três empates e três derrotas e cai para a Série B). Não tinha diretor de futebol, tinha que ficar olhando para o futebol e olhar esse panorama caótico das finanças. Mas consegui contratar o Pássaro, que estava no São Paulo e veio para um jogo contra o Fluminense. Liguei para ele, tive ótima impressão e uma semana depois ele me deu resposta positiva. Ele me ajudou muito. Pela experiência dele no São Paulo, pela experiência como advogado, ele foi o cara que organizou departamento de futebol, que deixou legado de organização que é usado até hoje. Sou muito grato a ele, mas, infelizmente, naquele primeiro ano a gente não consegue subir. O futebol é uma engrenagem que tem que funcionar também fora do campo. Não basta só você ter um time e ir para o campo. Ao redor disso também tem que estar funcionando bem, com pagamento de salário em dia...

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— É um processo que muitas vezes no papel te impressiona, você acha que vai dar certo, mas às vezes não dá. Maior exemplo disso que eu acho é que no primeiro ano da série B a gente teve nos últimos três, quatro meses o Fernando Diniz, que hoje é treinador da seleção brasileira, e tinha o Cano também, que é jogador extraordinário. Um artilheiro, ídolo hoje do Fluminense. E mesmo assim a gente não conseguiu subir. Por conta de muita carência que a gente tinha naquele ano. Era um ano de tentar resolver alguma coisa.

A renovação do Andrey Santos foi complicada. Olhando de fora a negociação, ela pareceu condicionada ao clube vender mediante proposta num valor pré-determinado para não sair de graça?

— Foi um pouco isso. A renovação do Andrey começou comigo, conversei com o procurador do Andrey. Tinha barreira de salário para aqueles jogadores que subiram, a gente enquadrou o Andrey nessa categoria. Fizemos primeira oferta, foi recusada pela família e procurador. Nisso, Andrey começa a ter sequência muito boa no profissional. E a gente foi aumentando nossa oferta gradativamente. Até que a gente percebeu que seria muito difícil a gente renovar o Andrey se não tivesse arranjo de venda no futuro. Já nesse final entrou a SAF, passei a questão toda para a SAF, como a gente tinha encaminhado e eles acabaram, já na SAF, vendendo o Andrey.

Impuseram cláusula daquele valor da venda, de 12 milhões de euros?

— Isso eu não sei, sinceramente, porque a partir do momento que a SAF entrou... Mas ia ser difícil de renovar, ia acabar renovando nesses termos que você falou. Não tinha outra saída. Quer ficar com Andrey? Então tem que pagar salário bem maior, não aquele salário de jogador quando vem da base para o profissional e tem que criar janela de oportunidade para quando surgir uma oferta. Isso estava muito claro na minha cabeça e foi o que aconteceu.

Por que você não ficou com o Fernando Diniz para 2022?

— Acho que o Fernando já devia ter na cabeça outras alternativas. Porque não manifestou em nenhum momento desejo de ficar. Foi saída absolutamente amigável, buscou o melhor para ele. Naturalmente, ele era treinador de Série A que estava na Série B, mas para ajudar, estava nesse espírito. Ele era muito amigo do Pássaro, o Pássaro tinha bom relacionamento com ele, senão não conseguiria contratá-lo. A mesma coisa aconteceu com o Cano. Sofri algumas críticas, “Ah, você não renovou contrato...” A gestão passada já estava devendo dinheiro a ele, era um salário muito elevado para a série B.

— E você sabe que a Série B para um clube grande é uma coisa assim meio estranha. Costumo dizer o seguinte, a Série B a viagem é ruim, o hotel é ruim, a comida é ruim, o campo é ruim, o juiz é ruim (risos). Mais ou menos esse é o padrão de Série B, logicamente confrontado com padrão de Série A. Logística é totalmente doida né. Você joga lá embaixo no Sul do país, depois você joga lá em cima no Norte...

O senhor levantou o tema Maracanã no início da gestão, teve encontro com o governador. O que vê nesse cenário atual nesse arrastado processo de licitação?

— Futebol hoje é grana. Olha para a tabela e vê que quem tem mais capacidade financeira são os clubes que estão lá na frente. O Vasco perdeu receita nos últimos anos em relação à concorrência de maneira absurda. Saímos do Maracanã e o Maracanã hoje é receita importante dos clubes do Rio. Cabem 60 mil, 70 mil pessoas. Você já parte de uma renda de R$ 5 milhões, R$ 6 milhões toda hora. Em final vai a R$ 20 milhões, estádio cheio. Já tem um ganho financeiro e esportivo, aquela torcida empurra teu time para ganhar. Depois tem outro ganho que o patrocinador quer fazer parte de um clube que tem uma grande audiência no dia do jogo, jogando para 60 mil pessoas, 70 mil. Isso vai alavancando outras receitas de marketing.

— Nós aqui em São Januário jogamos para 20 mil pessoas. A renda líquida de um jogo aqui é R$ 300 mil. Como eu vou competir? Aí você vai para a televisão, eles (Flamengo) ganham R$ 300 milhões. Eu fiz uma Série B no primeiro ano com R$ 9 milhões. A minha cota era de R$ 29 milhões só de PPV, na TV aberta não tinha cota, porque acabaram porque o Vasco, lá atrás, ao antecipar uma verba de contrato de televisão, abriu mão de receber esse dinheiro quando caísse. Era R$ 29 milhões, mas só tinha R$ 9 milhões porque o outro presidente antecipou R$ 20 milhões da TV Globo. E os outros clubes recebendo R$ 280 milhões, R$ 300 milhões, R$ 350 milhões. Para se ter uma ideia, o nosso adversário em cinco anos faturou de TV mais de R$ 1 bilhão.

— Como eu vou competir? Devendo R$ 1 bilhão, sem pagar salário, sem time. Como eu vou competir? Me dá uma solução. É fácil falar, criticar o contrato, que o contrato ninguém viu, não sei o quê, a 777, um norueguês falou mal... Então soluciona o problema. Eu, em determinado momento da negociação, fiquei preocupado que fosse melar. Porque teve uma crise lá fora de mercado, bolsas caindo, juros subindo. No meio de uma transação como essa, eu rezava todo dia. Eu ficava pendurado nessa transação, cara. Graças a Deus tem alguém aí que me ajuda e deu tudo certo.

O edital da licitação suspensa do Maracanã privilegiava quantidade de jogos, que é obviamente de Flamengo e Fluminense, à proposta financeira. O que o Vasco pensa sobre isso? Parece razoável vê-los como vencedores dessa licitação.

— A gente encara essa nova licitação da seguinte maneira: a gente está preparado, temos parceiros importantes nessa área de gestão de estádio, um parceiro local e um internacional. Esses parceiros vão vir junto com o Vasco para a proposta. A gente só pode fazer a proposta depois da publicação do edital. Vamos ver como ele vem e vamos fazer proposta forte. A gente quer entrar e brigar de igual para igual. Se tiver que fazer um acordo, a gente pode até fazer, mas vamos competir em igualdade ou em melhores condições do que os nossos adversários. A gente está muito forte nessa parceria.

— A 777 sabe da importância de voltar para o Maracanã, isso alavanca nossa receita e tira a receita dos outros. Isso que eles não querem, eles estão em uma zona de conforto que parece que o estádio é deles. Essa licitação está atrasada, já era para ter acontecido. A nossa sina de vascaíno é essa, lutar, resistência, resiliência. Vê o que fizeram com São Januário, vê a nossa história lá de trás, vê a gestão do Salgado, é lutar, não desistir.

Na gestão do Campello, você fez um acordo para receber o que o Vasco lhe devia? Já recebeu?

— Eu sou um eterno credor do Vasco. Começou na gestão do Roberto Dinamite. Foram lá no escritório, “pô, pelo amor de Deus, estamos com três meses de salários atrasados, está um caos total”. Eu ajudei. E essa dívida ficou lá, ninguém falava nada. Aí veio o Eurico de presidente. “Eurico, o Vasco está me devendo dinheiro, dá uma olhada nisso aí, vê como você pode me pagar”. Ele me chamou: “Não, Salgado, a sua conta está contabilizada, não tem problema nenhum, eu vou te pagar, deixa eu vender um jogador” (risos). Aí vendeu o Luan, não foi muito dinheiro, deixei.

— Quando vendeu o Douglas Luiz, que está na Inglaterra, acho que foi R$ 60 milhões, um dinheirão desse. Aí eu me movimentei. Falei: “Eurico, estou indo aí”. Cheguei lá, “e agora, como vou receber isso aí?”. “Pô Salgado, tive que pagar três meses de salário atrasado, pagar não sei o quê, não tenho dinheiro, vamos fazer um acordo”. Eu digo: “Que acordo você quer fazer?” “Vou te pagar em 30 vezes, tá bom?” Eu falei: “Como em 30 vezes? Eu não emprestei para o Vasco em 30 vezes, eu emprestei de uma vez só, quero receber de uma vez só”. Tá bom, deixei ali. Eu sabia que, se fizesse um acordo, não ia receber. Então deixa a dívida quieta lá. "Eurico, quando puder me paga. Se não puder, algum dia alguém vai me pagar isso." Depois veio o Campello, ajudei financeiramente também. Depois veio o meu mandato, eu ajudei também.

— Hoje tem um caminhãozinho de dinheiro aqui dentro, vamos ver se eu recebo, né. Espero.

E recebeu algo da SAF já? Como membro do Conselho de Administração da SAF, pode sugerir quais dívidas devam ser priorizadas e priorizar o seu pagamento?

— Veja, eu sabia que esse primeiro dinheiro que entra no clube é o primeiro jato d’água no incêndio. Quando entrou esse dinheiro, era para pagar muita coisa que devia. Agora a gente está conversando com eles, negociando a maneira de receber o que eles me devem. Está fluindo essa conversa, não chegamos ao final ainda, mas acho que a gente já, já vai chegar a um entendimento.

O senhor citou Eurico. Como o enxerga na história do Vasco?

— O Eurico teve uma participação absurda na vida do Vasco. A gente entrou junto na administração do Calçada em 1986, o Calçada ganha a eleição do próprio Eurico, eu tinha apoiado o Eurico a pedido de um amigo meu. Em seguida, o Calçada me convida para ser vice-presidente de Finanças, aí a gente faz uma composição política. Eu vou para Finanças, o Eurico vem para o Futebol. Ele fica até quando? Até 2019? Foi o dirigente do Vasco mais longevo da história, eu acho. Não sei se o mais importante, porque tivemos muito presidentes e dirigentes importantes aqui ao longo da história. Mas ele certamente foi muito importante.

— Ele criou uma “euricodependência”, o clube só funcionava se ele funcionasse. Esse modelo de gestão eu não compactuo, eu faço um modelo de gestão diferente, tenho meus colaboradores, cada um na sua área, terceirizo muito. Cobro, mas dou muita liberdade para trabalharem. O Eurico já tinha um temperamento mais centralizador. Enfim, foi um vascaíno à moda dele, tinha uma personalidade forte, teve muito êxito no futebol.

— O futebol recebeu uma injeção de recursos absurda naquela época, de 1997. Perdi uma eleição aqui em 97, o Vasco recebeu 60 milhões de dólares do Nations Bank. O que eu não entendo direito, que é muito difícil de compreender, é como a gente gastou esse dinheiro e constrói uma dívida de R$ 1 bilhão. Quer dizer, um negócio inteiramente absurdo.

O acordo com a 777 prevê valor do aluguel de São Januário de R$ 1 milhão por ano. Ele está sendo depositado?

— Está sendo cumprido. A gente recebe um aluguel trimestralmente. Anualmente dá R$ 1 milhão. A gente recebe uma parcela também oriunda de receitas de marketing. Isso tem dado sustentação ao clube de regatas.

— Desde o início do meu mandato eu tive contato com o Eduardo Paes. Começamos a ter uma interlocução, falei muito para ele que precisava fazer uma reforma no estádio, que estava perdendo dinheiro, um estádio antigo. Em vez de jogar para 50 mil pessoas, estou jogando para 20 mil. Ele se sensibilizou e encontrou uma solução de tentar ajudar o Vasco, que é concedendo crédito de construção. Tem que ser feito um decreto, a Câmara de Vereadores tem que aprovar. Aprovado, eu tenho um crédito de 200 mil m2 mais ou menos, que eu vou pra mercado vender e, com o dinheiro, eu vou fazer a reforma. Esse dinheiro só pode ser utilizado para reforma.

São Januário está com muitos problemas estruturais hoje e de manutenção. Por que?

— A gente está alinhando algumas coisas de São Januário, temos alguns conflitos do ponto de vista das obras que vão acontecer. A gente sabia das fragilidades que o estádio tinha. Eles entrando ainda não sabiam, então a gente auxiliou muito nesse processo. Já mapearam todas as fragilidades. Tem um plano para atacar essas obras. Agora no final do campeonato, entre janeiro e fevereiro, vai ser feita uma série de intervenções no estádio para melhorar.

— Tudo isso por uma certa pressão nossa dizendo para eles que precisamos melhorar São Januário, precisamos acolher melhor nosso torcedor.

— Essas coisas são ditas na reunião. Fora da reunião, eu converso isso tudo com o Lúcio. Em dia de jogo, a gente tem uma questão com os donos de cadeiras cativas que sempre tiveram acesso a quatro ingressos, mas a SAF entende que o portador de cadeira cativa para pegar o ingresso tem que vir aqui em São Januário, ficar na fila e tal. Muitas dessas pessoas já têm idade. Então é uma soma de pequenos probleminhas que, juntos, estamos ajustando para a parceria andar melhor. E é isso que tem que fazer. Apontar as falhas, mostrar o que não está direito. Isso é gestão compartilhada. Espero deixar o clube arrumado. Quem chegar, vai chegar com a cama feita.

Como anda o processo de possível obra de reforma completa de São Januário?

— Acho que até o meio de outubro esse decreto vai para a Câmara dos Vereadores e, se tudo der certo, antes de eu encerrar meu mandato, vai ser um legado que a gestão vai deixar para o próximo presidente. Ter conseguido viabilizar a reforma com recursos próprios, sem pegar um centavo de empréstimo com terceiros. Isso vai aumentar o patrimônio da associação, vai para quase R$ 1 bilhão. Uma associação que tinha como patrimônio mais ou menos R$ 140 milhões, que são as sedes.

— Vou agregar a esse patrimônio 30% de ações, que são R$ 300 milhões, mais R$ 500 milhões, e vai para quase R$ 1 bilhão. A beleza desse assunto é exatamente essa, estou tentando fazer as coisas sem pegar dinheiro emprestado. Parece fantasia, mas é verdade.

Como está a questão da reforma dos centro de treinamentos? É verdade que a 777 não gosta da localização do CT?

— Não há restrição em relação à localização. Até porque aqui (São Januário) a gente também tem uma comunidade importante, lá (CT) tem outra. O que está atrasando o investimento no CT é que a SAF não tem a regularização daquela área, não tem uma escritura dizendo que ela é proprietária daquela área. A gente também está lá na prefeitura, com o Eduardo, falando que a gente precisa legalizar, e ele está vendo como ajudar. Aquilo é um comodato. Eles ficam reticentes de investir em alguma coisa que eles não são diretamente proprietários.

O senhor aparece pouco no dia a dia. Seu vice Osório acaba tendo papel de destaque. É opção sua?

— Não me incomoda. Respeito a personalidade e dou liberdade para cada um atuar da melhor maneira possível. O Osório tem a sua personalidade, ele tem uma facilidade enorme de comunicação, então por que inibir isso? É uma virtude que ele tem, sabe exercer isso, fico até satisfeito de ter um colaborador do nível dele. Eu sou um cara mais low profile, fico na minha, apareço pontualmente, fora isso estou na minha. O importante para mim é entregar, realizar, resolver problema. E isso me toma muito tempo. Graças a Deus eu pude me dedicar intensamente ao Vasco, porque já tinha uma situação financeira estável, tinha tempo. Para ser presidente do Vasco você tem que ter uma situação financeira estável, tempo, conhecimento de Vasco, o mínimo de história aqui dentro. Esse para mim seria o candidato ideal, se tivermos um candidato que preencha esses itens vai ser muito bom para o Vasco.

Teve algum jogador que o senhor sonhou ou tentou muito contratar e não conseguiu?

— Não, não tinha nenhuma capacidade financeira para contratar ninguém. Existe uma imagem muito forte daquela contratação nossa lá atrás do Bebeto. Aquilo foi emblemático, porque naquela altura eu era vice-presidente de finanças, mas estava como presidente. O Calçada estava viajando. O Eurico um dia me chama e diz “acho que o Bebeto não está muito satisfeito lá no Flamengo. O José Moraes (agente) me procurou. Falei “vamos explorar isso”. Fomos fazendo reuniões quase todo dia no escritório. José Moraes, Eurico e eu. Até que a gente acertou toda a parte do Bebeto, salários, luvas etc. (A casa, né?) É, tinha que dar uma casa para ele. Depois tinha que depositar a grana na federação carioca. O Calçada um dia me liga falando que tem um zum zum zum que o Vasco estava querendo comprar o Bebeto, perguntando se era verdade. Eu disse que estávamos caminhando para isso. Eu estava completamente estruturado, tinha vendido Giovani, Romário, eu tinha pagado uns empréstimos no banco, com dinheiro em caixa, pronto só para assinar o cheque. A gente tinha um time sem jogador de empresário, 100% do Vasco os passes, como mudou isso? Não tinha dívida.

No imaginário do torcedor isso poderia se repetir agora com a SAF. Vai acontecer?

— Pode se repetir. O Vasco ainda não tem capacidade financeira para competir numa transação a nível mundial, mas a nível local já tem. A nível local, se tiver um jogador aí que o Vasco esteja interessado, mapeando, pode ter capacidade. Ia ser bonito.

O Vasco pode tirar um jogador do Flamengo hoje?

— Acho que pode. Flamengo, Fluminense, Botafogo, São Paulo. Fazendo as coisas direto acho que pode.

O senhor tem frequentado o CT?

— Eu procuro ir toda semana, às vezes não consigo. Toda vez que vou lá fico umas duas, três horas, converso com todo mundo. Gosto muito de ir lá. Criei um vínculo com os funcionários, jogadores, sou muito bem recebido. Na maré mais braba, Série B, salários atrasados, e foi se aproximando essa transação da SAF, acho que o Paulo Bracks tinha acabado de chegar, eu reuni todo mundo lá: “Olha aqui, o Vasco vai mudar de vida a partir de agora, estamos construindo um novo Vasco. Vocês vão receber seus salários em dia, vai ficar tudo arrumado, vamos sair do sufoco”. E é isso que aconteceu, então eles têm gratidão.

No plano de governo, havia promessa de eleição para 40 mil votantes. Promessa também de estar entre as cinco maiores receitas do país. O que acha que vai conseguiu entregar? O que te frustra?

— Deixa eu tentar responder. Eu me apego no que está acontecendo. O mais importante é você olhar para a frente e ter uma expectativa boa, e isso a gente vai entregar. A gente vai entregar uma perspectiva muito melhor do que aquela que a gente pegou lá atrás, no início. Esse negócio de 40 mil votarem, o sócio-torcedor é uma situação diferente do sócio-estatutário. Pelo estatuto do clube, a gente só pode ter como eleitor o sócio-estatutário.

— Eu deixo alguns legados: tentativa de voltar para o Maracanã, reforma de São Januário, ter equacionado o problema financeiro, o Vasco se livrou de dívidas, paga os salários em dia, recolhe os impostos em dia, a associação está fortalecida com a participação acionária e com a reforma de São Januário, vamos ter um patrimônio de quase R$ 1 bilhão.

— Estou entregando a sede da Lagoa, através de uma parceria com o influenciador Zé Colmeia, tudo na base do voluntariado e da doação. Recuperei a sede do Calabouço. O time está melhorando, a gente vai conseguir ficar na Série A. Ano que vem a gente já tem uma base de time, vamos contratar pontualmente dois, três ou quatro jogadores. Não vai ter que mandar 18 embora e contratar 18, eu fiz isso duas vezes, é um caos. Está tudo organizado para os próximos três, cinco anos. Só espero que a pessoa que vai assumir no meu lugar tenha responsabilidade, entenda o que está acontecendo, não precisa inventar nada, deixa andar do jeito que está que vamos para um lugar bom.

Também havia promessas do futebol feminino, que está muito mal. Há cobrança sobre a 777?

— Há uma cobrança, a gente tem que melhorar isso, mas os recursos são escassos, a premiação praticamente não existe no futebol feminino.

— Veio essa onda do futebol feminino, mas tinha que ter um pouco mais de entendimento. O futebol feminino tem um potencial enorme para se expandir, crescer e gerar receita, mas hoje ainda não gera receita, gera custo. Isso pesa no orçamento, os clubes em situação financeira melhor obviamente alocam mais recursos. Mas o Vasco fatalmente vai ter que impulsionar esse futebol feminino.

— Já viu o que acontece pelo mundo afora, Copa do Mundo com sucesso enorme de público. O futebol feminino é prazeroso, adoro ver jogo de futebol feminino, se eu ficasse aqui ia brigar muito pelo futebol feminino.

Você quem posta no seu perfil no Twitter?

— Atualmente sou eu mesmo. Aliás, quase sempre desde o início. Imagina se tenho uma assessoria para ficar lá no meu Twitter? Não tenho condições de ter. Quando tenho tempo vou lá e falo uma besteirinha só para dizer que tenho. Mas não leio o que escrevem. Eles me xingam muito, né? Vou contar um negócio engraçado então. Eu tenho dois telefones, um da torcida e outro particular. Esse da torcida são os xingamentos. Naquela fase de Série B, braba, teve dia de receber 300 mensagens, o Brasil inteiro xingando: ladrão, safado, sai fora, coroa, velho... Xingando de tudo que é jeito. Mantenho esse telefone, perdeu, xingou, ganhou, eles ficam quietos (risos).

— Tem um sujeito que mora perto da minha casa, eu estava indo lá para o Jardim Botânico, moro ali do lado. Na fase ruim: “Salgado, sai do Vasco, safado, sem vergonha”, o cara me pagou um esporro, fui para cima dele: “Não te conheço, como você tem essa intimidade de falar essas barbaridades?”, “Não, você é presidente do Vasco, tem que falar mesmo, não sei o quê”. Passou. Encontrei ele semana passada: “Presidente, agora o time está bom, hein, está legal, estou gostando de ver” (risos). A mesma pessoa, inacreditável. O Pedro, meu irmão gêmeo, diz que quando o Vasco está mal ele não sai de casa, não anda na praia. Não dá para sair muito, não, tem uns malucos aí, impressionante...

Fonte: ge
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