O estado de Minas Gerais é um celeiro de lembranças para Maicon, que chegou a Belo Horizonte na noite desta terça. O zagueiro, hoje um dos pilares da defesa do Vasco, deu os primeiros passos como jogador no interior mineiro. Já na capital, o atleta terminou sua formação com títulos expressivos na base do Cruzeiro, que nesta quarta será adversário, às 19h, no Mineirão.
Há 16 anos, Maicon deixava Belo Horizonte para cruzar o Oceano Atlântico e seguir carreira na Europa. Hoje, lembra com carinho das pessoas que o ajudaram a se tornar jogador. Em Minas, o ge foi atrás desses personagens para contar a história do zagueiro, que nem sempre foi o xerife da defesa.
O volante Maicon
Maicon é paulista apenas no documento. O zagueiro nasceu no hospital de Barretos, interior de São Paulo, mas cresceu e viveu em Planura, no interior de Minas Gerais, onde ajudava a família a tomar conta do sítio onde moravam.
Foi com o incentivo do pai, Maurides, que era caminhoneiro e atleta amador, que Maicon alimentou e realizou o sonho de jogar futebol. O pai já o treinava desde pequeno, em fundamentos como cabeceio e domínio das duas pernas. O mesmo aconteceu com os dois irmãos mais novos, os também jogadores Muller e Maurides Neto.
Ele chegou a enfrentar o irmão Maurides, que era atacante, em algumas oportunidades, pelo São Paulo (contra o Figueirense) e pelo Porto (contra o Arouca). Da família, Maicon é o que teve mais êxito como atleta, e o início da sua formação se deu ali, no interior de Minas.
Depois de passar um período no ABB de Jales-SP, ele foi chamado para uma avaliação no Mamoré. Em 2004, aos 16 anos, o jogador do Vasco já chamava atenção pelo porte físico. Precisou de um treino para ficar no clube da cidade de Patos de Minas.
- Fez um treinamento muito bom, cabeça alta, bons lançamentos, usando as duas pernas, um perfil muito bom. Chamou atenção, conversei com o técnico e ele pediu para que o garoto ficasse. Os outros dois que vieram com ele de Planura foram liberados - lembrou Carlos Alberto Pael, auxiliar técnico do Mamoré à época.
A princípio, Maicon passou a treinar no Clube Atlético Olaria, um time amador que era parceiro do Mamoré. O atleta agarrou a chance, evoluiu e agradou muito ao treinador Luiz Eduardo, que o inscreveu no Campeonato Mineiro Sub-20 de 2004. Foi sua porta de entrada na elite mineira. Ele já havia feito um teste no Cruzeiro, mas foi reprovado: “Joguei pra caramba e nem olharam pra mim", recordou Maicon em entrevistas passadas. A história foi diferente na segunda oportunidade.
- Teve uma rodada que o Cruzeiro ia jogar contra o Mamoré, e o volante titular era o Dudu Araxá, muito bom também. O Cruzeiro se interessou por ele e queria observar. Depois o Maicon entrou e fez uma partida muito boa. O Cruzeiro procurou informações sobre aquele garoto, viu potencial e fez a proposta de empréstimo - contou Pael.
No Cruzeiro, um novo Maicon
- Ele tinha ótimo jogo aéreo e bom passe, mas não tinha muita dinâmica como volante.
Ricardo Drubscky e seu auxiliar Enderson Moreira visualizaram uma nova função para Maicon no sub-20 do Cruzeiro: “Tinha algumas características muito interessantes para zagueiro”, destacou Enderson.
Depois de chamar a atenção de Drubscky no Mamoré, Maicon chegou ao Cruzeiro tendo que buscar espaço. E conseguiu em pouco tempo.
- Teve uma viagem que o Enderson foi com um grupo para os Estados Unidos e eu com outro para a Europa. Como o Maicon tinha acabado de chegar, ele foi com o Enderson. Lá disputou um campeonato, e o Enderson trouxe muitas boas informações sobre ele - comentou Ricardo Drubscky.
Percebendo os sinais que Maicon dava nos treinamentos, Drubscky e Enderson iniciaram a transição do volante para a zaga. O treinador virou coordenador técnico do Cruzeiro, e o auxiliar assumiu o comando da equipe sub-20 e viu Maicon, já como zagueiro, dominar a área de um Cruzeiro que venceu as principais competições que disputou em 2007.
- Fizemos esse recuo na Copa São Paulo de Futebol Júnior, se encaixou muito bem, se achou na posição. Teve um destaque na competição, por causa do posicionamento, jogo aéreo qualificado e pela qualidade na saída de bola - afirmou Enderson Moreira, que completou:
- Tivemos duas conquistas muito importantes. O Cruzeiro nunca tinha sido campeão da Copinha e vencemos o Brasileirão Sub-20 no fim do ano. O Maicon teve uma participação muito boa, também atuou mais à frente em algumas ocasiões. Ainda fomos vice-campeões da Taça BH, perdemos para o Flamengo nos pênaltis. O Maicon foi extremamente importante nas três competições, deu muita estabilidade para o time, que sofreu poucos gols.
Mesmo com o destaque e os títulos na base, Maicon não conseguiu espaço no time profissional do Cruzeiro. Coube a Ricardo Drubscky mais um capítulo importante na história do já zagueiro. O coordenador fez outra excursão para a Europa e, desta vez, levou Maicon com ele. O jogador não voltou para Belo Horizonte.
- Fizemos três amistosos em Portugal e ele não voltou. O Nacional gostou muito dele. Logo depois ele foi para o Porto - afirmou Drubscky.
- Nessa excursão com o Ricardo Drubscky, ele se destacou muito. Depois virou uma referência e teve uma vida de grande êxito. Ajudamos nesse processo de formação, mas muito mérito dele também em aceitar essa mudança - acrescentou Enderson.
Destaque no Vasco
Depois de deixar o Cruzeiro, o zagueiro Maicon construiu carreira sólida. Virou ídolo no Porto, onde ficou por quase sete temporadas. Só saiu quando o São Paulo pagou R$ 22 milhões aos portugueses por ele em 2016. Após vestir a camisa tricolor, ainda rodou por Turquia e Arábia Saudita antes de voltar de novo ao Brasil em 2022 para defender o mesmo Cruzeiro que o revelou. Não deu certo.
Maicon foi contratado pelo Cruzeiro no fim de 2021, antes da SAF. Contudo, valores de salários e outros componentes no vínculo foram considerados inviáveis para os padrões estabelecidos pela administração de Ronaldo Fenômeno. Teve o contrato rescindido após apenas três jogos no Campeonato Mineiro de 2022. Em agosto passado, fez acordo com o clube mineiro para receber R$ 1,55 milhão em 30 parcelas mensais de R$ 51.666,67.
Do Cruzeiro foi para o Santos, mas também não conseguiu espaço. Aos 35 anos, ganhou nova oportunidade no Vasco, onde chegou em julho. A estreia pelo time carioca foi justamente contra o Cruzeiro, e o zagueiro não foi bem. A má atuação o fez ir para o fim da fila no Rio.
- Ele sempre foi muito sério, muito competitivo, um cara com físico avantajado, tem muita bagagem, muita técnica. O grande segredo é encontrar os atalhos do campo, ser apoio para a equipe, para os mais jovens. Tem bom jogo aéreo e muitos recursos para queimar ainda - disse Drubscky.
Foi com a mesma seriedade destacada pelo treinador que o revelou que Maicon conseguiu reverter sua situação no Vasco. Usou a experiência para apoiar os mais jovens, assumiu papel de líder mesmo sem jogar e chamou atenção da comissão técnica de Ramón Díaz.
- É um jogador que se cuida muito, tem boa estatura, forte, muito técnico, tem boa saída de bola, boa bola aérea. Se cuidou bastante, foi muito tempo titular, então ele sabe o que é preciso no futebol moderno. Teve uma carreira vitoriosa e por isso ainda joga em alto nível. É um menino do bem, um cara família. Tinha certeza que ele se firmaria na zaga do Vasco, pela experiência e respeito que ele adquiriu. Jogador que está sendo e pode ser muito útil - concluiu Pael, amigo dos tempos de Mamoré.
Após a estreia contra o Cruzeiro, Maicon demorou mais de 40 dias para ter nova chance no Vasco. Quando conseguiu, se firmou como reserva imediato da dupla Medel e Léo. Levou mais dois meses, nesse período entrando com frequência, para "roubar" a vaga de Léo.
São 12 jogos e duas assistências pelo clube de São Januário. Hoje, ao lado do chileno e capitão Gary Medel, Maicon forma uma das duplas de zaga mais cascas-grossas do Campeonato Brasileiro. Nesta quarta, os dois defenderão o Vasco no Mineirão.