É no quintal de casa, em Praia Grande (litoral paulista), que Tereza Borba, de 65 anos, recebe curiosos e admiradores de Moacir Barbosa Nascimento. O ex-goleiro Barbosa foi multicampeão pelo Vasco, pela seleção brasileira, mas ficou marcado por muito tempo pela derrota na Copa de 1950. Num dia 7 de abril, há 20 anos, o ex-jogador faleceu em parada cardiorrespiratória dias depois de comemorar seu aniversário de 79 anos.
O marido de Tereza, um vascaíno fanático, reconheceu o ídolo do clube de São Januário na antiga barraca que o casal tinha no calçadão no início dos anos 1990. Depois que deixou o futebol, Barbosa foi servidor público do Estado no Maracanã (na antiga Administração dos Estádios da Guanabara).
Barbosa fez 20 jogos pela Seleção. Foram 14 vitórias, dois empates e quatro derrotas. Sofreu 22 gols. Depois de 1950, só atuou mais uma vez com a camisa amarela (2 a 0 contra o Equador, em março de 1953). No mesmo ano defendeu a Seleção Pernambucana contra o Brasil.
A revista "Placar" fez duas eleições do melhor Vasco de todos os tempos. Nas duas, Barbosa era o goleiro eleito. Numa delas, ele próprio se escolheu e escalou o seguinte time: Barbosa, Augusto, e Rafanelli; Eli, Danilo e Jorge; Tesourinha, Maneca, Heleno de Freitas, Ademir e Chico.
Mudou-se para Praia Grande após a irmã da mulher Clotilde ficar viúva. No Rio, antes, também sofreu com enchente em casa, em Ramos, e, claro, com as constantes lembranças nas ruas da derrota de 1950. Distante, encontrou paz e conheceu Tereza, que ele dizia ser a filha que nunca teve.
- Aqui ele vivia no anonimato. Fazia caminhada pelo calçadão, tirava a soneca dele, depois passava na minha barraca. Tomava o "birinight", que ele chamava. Ninguém aporrinhava as ideias dele. Ele dizia exatamente isso. Não tinha aporrinhação da Copa de 1950 - conta Tereza.
No quintal da casa, Tereza tem estátua em tamanho natural feita por um artista que também desenhou Pelé e Neymar, tem camisas antigas de Barbosa e uma medalha que ganhou da maior conquista do Vasco antes da Libertadores de 1998: o Sul-Americano de 1948. Recentemente, teve que lutar para a administração do cemitério não trocar o túmulo do seu "anjo negro", como chama carinhosamente.
Foram 494 jogos com a camisa do Vasco e cinco títulos cariocas (1947, 1949, 1950, 1952 e 1958). Além do Sul-Americano de 1948, também venceu o Rio-São Paulo de 1958.
- Quando ele foi embora consegui colocar ele do lado da Clotilde (mulher de Barbosa), na mesma alameda do cemitério. Três anos depois tiraram o dela, levaram para outro lugar dentro do cemitério. Briguei durante 13 anos para não tirarem do Barbosa e consegui perpetuar o túmulo dele lá. Está bem cuidado. É perto daqui de casa. Coloco umas plantinhas, umas pedrinhas brancas. Mas ainda quero reformar com azulejos com a cruz de malta - diz ela.
Barbosa não falava muito de futebol. Tinha também poucos contatos com gente da bola. Recebeu algumas vezes Oberdan, defensor palmeirense, companheiro de seleção brasileira. Ainda assim assistia algumas coisas nos últimos anos de vida. Admirava Dida, ex-goleiro de Vitória, Cruzeiro, Corinthians e grande carreira no futebol internacional. Além de três Copas do Mundo no currículo.
- Ele gostava muito do Dida, que era um grande goleiro e por ser negro também. Mas falava de poucas coisas. Do Labruna, do Di Stéfano - lembra Tereza, citando dois adversários na final de 1948. Na decisão em Santiago, Angél Labruna, uma lenda do futebol argentino, bateu pênalti, mas Barbosa defendeu.
Há três anos, Praia Grande tem uma rua chamada Goleiro Barbosa, outra conquista de Tereza. Recentemente, esteve em São Januário, a convite de Eurico Miranda, que ajudou com quantia mensal Barbosa no aluguel em Praia Grande. Nas redes sociais escreve constantemente sobre o ex-goleiro. Tudo em nome da memória do grande jogador que foi. O próximo passo é fazer memorial a Barbosa em Praia Grana.
- Barbosa foi presente de Deus na minha vida. E eu o presente de Deus na vida dele. Coisa que só Deus poderia dizer. Já lutava muito pela memória dele antes de ir embora. Prometi pra ele que viveria por sua memória até o fim da minha vida.