Leandro Amaral é daqueles atacantes que consegue ser identificados por mais de um clube. Fluminense e Vasco se enfrentam neste sábado, às 16h (de Brasília), no Nilton Santos, e concordam que ambas as torcidas têm carinho pelo ex-atacante, que hoje vive nos Estados Unidos. Ele não dá voltas para dizer que, neste clássico, torcerá pelo cruz-maltino (e aposta no placar de 2 a 1), mas mantém simpatia pelo lado Tricolor. Ao ge, ele fala sobre a vida em outro país, elogia o técnico Fernando Diniz e visita situações polêmicas de sua carreira.
Leandro Amaral fala sobre relação com Eurico Miranda no Vasco e propostas ocultadas
— [Tenho mais identificação] Com o Vasco, sem dúvida. Pela passagem e pelo tempo que fiquei. Tenho um respeito muito grande pelo Fluminense, fui muito bem tratado, fiz grandes amizades. Mas tive uma contusão séria, que me levou a parar de jogar futebol precocemente. Hoje, apesar do carinho pelo Fluminense, a minha identificação pelo Vasco é muito grande. Meus filhos também admiram o Fluminense, mas, no fundo, torcem para o Vasco.
Sobre o Vasco, Leandro Amaral não esconde o carinho pelo clube e pelos torcedores, mas não nega a mágoa com Eurico Miranda. Além de ter seu contrato de trabalho anulado com o Fluminense, o atacante se sentiu pouco valorizado pelo então presidente, que escondeu propostas recebidas e não o valorizou após o bom desempenho no Campeonato Brasileiro de 2007.
— Aconteceram muitas coisas no final do meu contrato, o tratamento que tive do Eurico Miranda... Eles (Vasco), não tentaram fazer um projeto que tanto eu quanto eles ficássemos felizes. Nunca me chamaram para renovar. Simplesmente o Eurico e os dirigentes só impuseram a clausula. O (Willian) Arão tinha a mesma no Botafogo, foi para o Flamengo e não precisou voltar. Queria ter continuado, mas sabia que estava sendo enganado por eles. O Eurico falava que não tinha proposta para mim e por isso não poderia valorizar o meu contrato.
Fui artilheiro, nome cogitado na Seleção, Romário elogiando, e o Eurico dizendo que não tinha proposta. Descobri tudo porque Cruzeiro, Santos, Corinthians perguntaram se eu não ia. Eurico só disse que tinha oferta da Índia. Foi quando perdi a confiança no Eurico. Não tinha mais clima, não de estar no Vasco, mas com a diretoria e o presidente.
No Fluminense, Leandro Amaral viveu o ápice de expectativa no futebol e o momento mais difícil de carreira. Contratado em 2008, tinha a expectativa de montar um "ataque dos sonhos" ao lado de Dodô e Washington. Mas também teve que lutar pela vida. Em 2009, uma infecção causada por um fungo (Candida Albicans) o fizeram ser internado e quase perder a perna.
— Foi um dos piores momentos da minha vida. A infecção que eu peguei, corri risco de ter morrido, de perder a perna. Graças a Deus passou, mas eu fiquei muito triste. Estava no auge da minha carreira. Tinha passado por um momento muito bom no Vasco, fui um dos melhores do Brasileiro, artilheiro do Estadual. Me chateia é que poderia ter sido auxiliado por médicos de outra maneira. Isso aconteceu na minha lesão de cartilagem no Fluminense. Deveria ficar três, quatro meses para voltar, e um mês depois, eu já estava fazendo atividades. Mas eu não sou médico. Estou no clube para acatar ordens. Eles que decidem o dia a dia.
"Meu joelho inchava e os médicos faziam pulsão para tirar o líquido. Você tem que estar numa sala higienizada, mas era feito no vestiário, após treino, suado, sujo, ambiente com muita bactéria. Poderia ter perdido a minha perna se eu demorasse mais [para tratar] se não procurasse o David Uip (médico)". Diariamente, eu ficava com um cateter, montaram uma UTI no meu quarto, onde o médico me medicava por 3h, 4h", afirmou.
Leandro Amaral fala de bactéria que abreviou a sua carreira
Para o clássico, a torcida do atacante é para o Vasco, mas os elogios são para Fernando Diniz. De acordo com o atacante, o técnico do Fluminense — e interino da Seleção Brasileira — tem potencial para comandar uma equipe da Europa.
— Ramon e Diniz são dois grandes treinadores, com características completamente diferentes até pelo elenco. Olha onde o Fluminense se encontra. O Vasco vem de anos difíceis disputando a Série B, teve um primeiro semestre desastroso. Nunca vi o Vasco jogar um semestre inteiro e não fazer um gol em São Januário. Gosto do Diniz, é um cara consagrado no Fluminense, que vem renovando o futebol brasileiro. Tem um estilo arriscado, mas que dá certo. Dá liberdade para os atletas. O futebol, alguns anos atrás, estava tudo muito igual. Diniz vem demonstrando que os treinadores podem fazer algo diferente. Ele tem capacidade para comandar um grande clube europeu.
Vida nos Estados Unidos
Depois de encerrar a carreira como jogador, Leandro Amaral segue a vida futebol, mas em outro país. Morando nos Estados Unidos há 13 anos, o ex-atacante hoje é treinador e auxiliar técnico de uma equipe de 18 anos e outra de 12.
— Hoje eu trabalho num clube chamado Flórida Kzrzrurhehso, há seis, sete anos. Também trabalhei no Orlando City. A rotina é como a que eu tinha como atleta, mas em uma função completamente diferente. Procuro passar toda a minha experiência para os mais jovens. A rotina é como a minha no Brasil, trabalho semanal a semana toda e jogos regionais e estaduais.
Os três filhos de Leandro Amaral seguiram o mesmo caminho do pai no futebol e seguem o sonho de se tornarem atletas profissionais. O destaque é Valentina que começou a servir a seleção americana. Aos 12 anos, ela começou a ser chamada para treinamentos com seleções de base, e em agosto de 2022 foi chamada para amistosos de preparação para o Mundial com a seleção sub-17.
— A Valentina é um orgulho assim para mim. Ver ela chegar onde ela está hoje, conquistando esse espaço é um orgulho muito grande. Eles (filhos) têm tudo para ter um futuro muito grande nos EUA. O estudo é muito forte, eles priorizam, sempre em primeiro plano. Nem sempre um atleta que joga no Fluminense, no Vasco, tem a certeza de que vai se formar um atleta profissional. Aqui, se ele não atingir nível profissional, ele tem um nível de estudo excelente para seguir em outra profissão que ele deseja.
Um dos sentimentos mais difíceis é equilibrar o paixão de pai e os conselhos profissionais. É uma emoção diferente, mas que revela ser prazeroso.
— Eu não fico só na torcida, como também fui o treinador deles na maior parte da categoria de base e pude passar todo o meu aprendizado. É sempre prazeroso, mas, ao mesmo tempo, não é fácil. Você tem que separar as coisas quando está dentro de campo. Tenho que tratá-los como atleta e ser igual com todos. Eles vêm em um processo de evolução muito grande, são obedientes, apaixonados por futebol, acompanhando jogos na Europa, no Brasil. Ao mesmo tempo, tenho o papel de pai de passar carinho, amor, de fidelidades.
O ex-jogador também falou da importância do suporte da família, que foi importante durante sua carreira como jogador. Agora, do outro lado, espera ter também este papel.
— Tive meus filhos do lado por onde passei, nos momentos de lesão, tive a minha esposa, a família do lado. É a maior injeção de ânimo que um atleta pode ter. Muitas vezes a gente sofre, é dolorido ver eles passarem por algumas situações como perder uma partida, um gol. Mas mostro que a vida não é feita só de vitórias ou sucesso. Foi assim na minha vida e é na de grandes jogadores. Isso faz parte do atleta, faz parte do ser humano, mas passo para eles que podem contar comigo nesses momentos.
Leandro também contou um ritual especial que tem com a família que repete todas as semanas.
- O momento da vitória é passageiro, assim como o da derrota. Tem uma frase que sempre falo para eles. Mando fotos da família (veja abaixo), mando quase semanalmente, é cansativo, mas digo que a família é tudo e juntos somos sempre mais fortes.
Confira outras resposta de Leandro Amaral:
Evolução com Lionel Messi
- As coisas vem evoluindo. A demanda é muito grande. Tem cerca de 800, 1000 crianças. Desde a parte masculina, feminina, tem competições. É o ano inteiro jogando. Quando você se destaca no Estadual, você vai jogar no Nacional. O futebol vem evoluindo muito. A chegada de grandes jogadores como Messi, como Kaká, faz com que o interesse aumente cada vez mais. Uma coisa que acho que deveria mudar para as pessoas olhares para o futebol daqui de outra maneira é a questão da segunda, terceira, quarta divisão. Os clubes da primeira divisão não caem para a segunda. Isso faz com que o futebol não seja tão competitivo quanto nos outros países. Isso faz parte do processo do clube, da organização, das contratações. Os clubes ficam acomodados de não cair e tiram a oportunidade de clubes de segunda, terceira divisão, se tornarem um clube grande. As vezes os clubes preferem ficar em último para ter as melhores escolhas.
Consegue assistir aos jogos?
- Consigo, não todos, muitas vezes eu tenho treino na parte da noite. Pelos meninos estarem na escola, os treinos começam 18h. Mas quando posso, assisto. Nós vivemos futebol diariamente aqui em casa. A minha prioridade, por ser brasileiro, por ter feito a minha carreira no Brasil.
O que faltou na carreira?
- Sim. A Copa do Mundo exige o máximo de um jogador. Tive a felicidade de participar de alguns jogos pela seleção. Eliminatórias para a Copa, fui convocado umas quatro, cinco vezes. Joguei a Copa das Confederações. Eu me sinto, no futebol, tirando as lesões que tive, que ter que ter parado cedo, no auge da carreira. Mas no geral, me sinto realizada. Chegar no futebol profissional é muito difícil, se manter mais ainda. E ter uma carreira jogando em clubes como Fluminense, Vasco, Flamengo, Corinthians, São Paulo, Grêmio, Fiorentina, são clubes grandes. Não é para qualquer um.
Parado na época
- O último clube era a Portuguesa, se não me engano. Antes de ir para o Vasco, tive uma lesão no menisco, fiz uma limpeza, coisa rápida, e fiquei três meses sem jogar antes de ir para o Vasco. Tive alguns contatos de clubes, mas achei que não era válido. Então, optei em esperar um pouco mais.
Bola na trave em 2006
- Aquela bola fecharia o ano com chave de ouro. Mas, por outro lado, aquela equipe não tinha que se lamentar por nada. O trabalho no ano foi muito maior do que muita gente esperou. A gente não tinha um time recheado de estrelas. Se você perguntar para qualquer vascaíno, eles jamais iriam imaginar que, com aqele time, iriamos chegar no último jogo naquelas condições, de poder se classificar para a Libertadores. Ninguém acreditava naquele time. E, graças a Deus, conseguimos fazer um brilhante campeonato, um ótimo campeonato. Me destaquei junto com os meus companheiros. Se entra aquele bola, seria para fechar o ano com chave de ouro. Foi uma sensação de dever cumprido.
Como é ser treinado pelo Renato Gaúcho
- Ele é boleiro quando tem que ser, no rachão, nos dois toques. Sou um admirado da carreira dele, não só como treinador. É um cara muito competitivo. um dos melores treinadores que tive na carreira. Confiou na minha chegada no Vasco, conversei com ele. Ele me deu uma liberdade muito grande de jogar da maneira que eu sempre joguei, que fiz sucesso pela Fiorentina, pela Portuguesa. É um cara transparente com o grupo. Um gestou de pessoas. É um cara que sempre sabe brincar na hora certa, cobrar na hora certa.
Chegou a conviver com o Dener?
Era uma época de uma Portuguesa forte, vice-campeão brasileira [em 1996]. Uma equipe que você via, mandava grandes jogadores para a seleção brasileira. Real Madrid comprou o Zé Roberto, Fiorentina me comprou, Emerson foi para a seleção, era uma equipe muito forte da Portuguesa. Fazia bons Campeonato Brasileiro e batiam de frente com qualquer um. Os clubes temiam jogar no Canindé.
Com qual técnico você mais se identifica?
Não tenho uma pessoa só especifica. Me inspiro em muitos. Então, eu tenho o meu estilo. Procuro ver o que eu gosto no Fernando Diniz, mas também em fulano, ciclano, beltrano. Todo treinador tem um lado que você se identifica.