Até surgir no jogo contra o Corinthians, no domingo, e encantar os vascaínos, Marlone passou por grandes dificuldades. E esse não é mais um daqueles casos simples do mundo do futebol. O garoto aprendeu logo cedo que a vida não é nada fácil: foi entregue para adoção ainda bebê, passou fome na base do clube e quase deixou a Colina em pelo menos três ocasiões. Mas tantos obstáculos serviram para moldar o perfil dele, que, confiante, nunca deixou de acreditar que um dia chegaria lá.
Marlone foi entregue para adoção quando morava em Augustinópolis, no interior do Tocantins. Sua mãe biológica deu a luz a ele e seu irmão gêmeo, o Marlon, quando tinha somente 12 anos. Sem condição financeira, teve de dar um dos dois meninos para ser criado por outra família. No caso, o Marlone.
O menino cresceu e logo tomou gosto pelo futebol. Jogando nos times de Augustinópolis foi descoberto por um olheiro que o levou ao Vasco. Marlone tinha somente 12 anos de idade. Mas após pouco tempo de clube veio a primeira "dispensa". Houve um erro no registro feito por seus pais adotivos. A data, por questão de meses, não batia com a de sua carteirinha de vacinação. A diretoria do Cruz-Maltino pediu para que ele voltasse ao Tocantins para retificar.
Marlone, mesmo sem dinheiro, viajou até sua cidade natal e acertou a documentação. Ao voltar ao Vasco, porém, foi colocado fora dos planos. Buscou outro clube e defendeu por três meses o Bonsucesso. Até que conseguiu ser aceito de novo no clube da Colina. Na época passou a ouvir piadinhas de outros jogadores de que seria "gato". Mas esse não foi o apelido mais marcante para ele naqueles tempos.
De família humilde, Marlone passava dificuldades no alojamento do clube durante os finais de semana. Para ter o que comer, corria para a arquibancada de São Januário após os jogos em busca de algum resto de biscoito, pipoca ou qualquer outro alimento. Era chamado de "passa fome" por outros garotos. No dia a dia, também não tinha aquele dinheirinho para fazer um lanche e contava com a boa vontade de seus companheiros.
Nesse tempo, nas folgas ou férias, ele também passou a contar com a ajuda de outros meninos do time para não ficar sozinho no clube. Era o caso do zagueiro Luan, que levava o companheiro para a casa de seus familiares, no Espírito Santo. Marlone não tinha condição de viajar até o Tocantins.
Em 2009, o apoiador esteve perto de sair. Em seu último ano de juvenil, estava com contrato terminando. Foi quando teve um amistoso do time principal contra a seleção da Nicarágua. Alguns jovens da base foram utilizados, entre eles, Marlone. Dorival Júnior que era o treinador da época, ficou encantando com o futebol do garoto e pediu à diretoria que renovasse seu vínculo. O que foi feito logo.
De lá para cá, a situação dele começou a melhorar, despontando nos juniores do clube. Mas enfrentou dificuldades na transição para o profissional.
No ano passado, ele teve algumas chances no time. Havia uma expectativa grande por parte do torcedor, pois Marlone era apontado como uma grande joia da base. Mas no profissional, não conseguiu repetir aquele bom futebol. Aos poucos as chances foram diminuindo. Até que no comecinho deste ano surgiu a possibilidade de um empréstimo para o Atlético-GO. Marlone preferiu ficar.
Mas foi justamente na chegada de Dorival Júnior, aquele mesmo que pediu a renovação de contrato dele, em 2009, que o garoto deixou de ser a joia da base e passou a despontar no time de cima. Suas participações no treinos agradaram o treinador, que passou a dar chances a ele no segundo tempo. Mas o grande momento veio no domingo. Marlone foi escolhido para substituir Eder Luis e teve grande atuação. Sem clichê, mas é uma verdadeira volta por cima. Na vida e no futebol.
- Estou aqui desde criança. Aprendi a ser vascaíno. Minha vida foi aqui, longe de casa. Tenho o Vasco como um pai. Passei as datas mais importantes aqui. É um sonho ser profissional desse clube - disse Marlone.