Em abril, um vídeo de poucos segundos do astro do basquete LeBron James enterrando uma bola foi arrematado num leilão virtual por 387,6 mil dólares (R$ 1,9 milhão pela cotação atual). Nele, o astro dos Lakers imita Kobe Bryant, ídolo do esporte morto em acidente aéreo. Mas outro detalhe torna a compra ainda mais especial para o vencedor. Trata-se de registro, que, assim como uma obra de arte, está registrado e não pode ser copiado — mesmo na internet.
Esta é a ideia por trás dos NFTs, sigla em inglês para tokens não fungíveis. Graças à tecnologia Blockchain, a exclusividade de sua identidade digital é assegurada. Podem ser vídeos de poucos segundos, como os lances da NBA; cards, artes ou até prints da internet.
Devido à sua segurança digital, são lançados em poucas unidades. Algumas vezes, uma só. Além de serem colecionáveis, podem ser revendidos. O que movimenta ainda mais dinheiro.
Trata-se de um mercado em ascensão e que já se aproximou do esporte. Os vídeos da liga de basquete americano são vinculados ao NBA Top Shot, plataforma que lança, de tempos em tempos, pacotes com quantidades limitadas de “momentos”, como estas peças são chamadas. Inaugurada em outubro, ela já tem mais de um milhão de usuários e um bilhão de dólares (R$ 5 bilhões) em transações.
Depois da primeira venda, a plataforma arrecada 5% no mercado secundário. O dinheiro também vai para a liga e para os próprios atletas. Não chega a ser surpresa que os vídeos de LeBron dominem a lista das vendas mais caras de momentos. O que ele homenageia Kobe Bryant faz parte da série “From the top” e conta com 59 cópias. Outra delas, a de número 12, foi negociada por 210 mil dólares (R$ 1 milhão) na própria plataforma.
Apesar dos altos valores, LeBron não lidera o ranking de NFTs esportivas. Em março, a estrela do futebol americano Rob Gronkowski pôs à venda um conjunto de cards digitais. Só com um, arrecadou 430 mil dólares (R$ 2,1 milhão). Ao todo, levantou 1,8 milhão de dólares (R$ 9 milhões). Poucos dias depois Patrick Mahomes, seu companheiro de liga, faturou 3,4 milhões de dólares (R$ 17,1 milhões) com sua coleção.
No futebol, este modelo entrou com força através dos cards da empresa francesa Sorare. São cromos digitais de jogadores usados num Fantasy Game. Eles pontuam de acordo com o desempenho destes atletas na vida real e também podem ser revendidos. Sua plataforma registra 90 mil usuários e mais de 70 milhões de dólares (R$ 352 milhões) em vendas em 2021.
Em março, um card de Cristiano Ronaldo foi negociado por 290 mil dólares (R$ 1,4 milhão). Poucos meses antes, um do francês Mbappé fora comprado por 78 mil dólares (R$ 392,2 mil). Para usar a imagem dos atletas e de suas equipes, a Sorare fecha contratos com os clubes. Atualmente, conta com 140 parceiros. No Brasil, só o Atlético-MG.
O Galo vem fazendo outras experiências. Em maio, realizou o NFT de um desenho da famosa defesa do goleiro Vitor contra o Tijuana, pela Libertadores de 2013. A obra arrecadou mais de 5 mil dólares. O clube ficou com metade.
O Atlético-MG também negocia modelos em 2D e em 3D de camisas históricas em outra plataforma de NFTs, a Binance. Já a venda dos cards de seus jogadores no Sorare movimentou cerca de 350 mil euros (R$ 2,1 milhões). Mas, segundo o gerente de inovação Felipe Ribbe o percentual para o clube é pequeno.
— Nosso maior foco agora é o aprendizado. Um clube deste tamanho precisa ser referência em inovação. Os clubes estão acostumados a olhar para o curtíssimo prazo. Mas têm que mirar para quando este mercado estiver maduro. Aí o Atlético já estará vários passos à frente.
Uma das principais apostas no longo prazo são os Fan Tokens, ativos digitais assim como os NFTs. Só podem ser transferidos por meio de revenda. Mas o valor de mercado é volátil, já que oscilam de acordo com o desempenho esportivo das equipes. Seu maior diferencial é permitir ao portador interagir e participar de decisões dos clubes.
— Na Roma, fizeram campanha para escolha do nome do centro de treinamento. Você tinha que ter ao menos cinco fan tokens do clube para participar da votação — conta Reinaldo Rabelo, CEO da Mercado Bitcoin, corretora especializada em criptoativos e parceira da Socios.com, uma das principais plataformas de Fan Tokens. — É como uma evolução do programa de sócio-torcedor, que funciona bem para descontos em ingressos ma s não para interação.
O Atlético-MG e o Corinthians já anunciaram que terão Fan Tokens. Assim como a seleção brasileira. Os da Argentina, já lançados, foram um sucesso. Levantaram 1,2 milhão de dólares (R$ 6 milhões) com a venda de 600 mil unidades em três horas. Já os do Barcelona movimentaram 1,3 milhão de dólares (R$ 6,5 milhões) em menos de duas horas.
Outros clubes de futebol, equipes de e-sports e até o UFC aderiram a este negócio. Mas é importante não confundir com os Tokens de mecanismo de solidariedade do Vasco e do Cruzeiro.
Neste caso, são fatias do que os clubes teriam a receber com as vendas internacionais de suas joias. O Vasco, por exemplo, colocou R$ 60 milhões no mercado. A cada ativo comprado, recebe uma antecipação deste valor. A Mercado Bitcoin adquiriu R$ 10 milhões. Quando a transferência do atleta de fato ocorre, o dinheiro vai direto para os tokens.
— Este crescimento do mercado cripto faz com que ele busque novos territórios. E o futebol sem dúvida é um território fértil para que a cultura do dinheiro digital cresça — resume Bruno Maia, especialista em inovação no esporte.