Eles estufaram durante oito anos, com orgulho, o escudo da cruz-de-malta no peito, sem receber praticamente nenhuma ajuda de custo. Ganharam o mundo, conquistaram títulos, troféus e medalhas em Jogos Pan-Americanos. Quando parecia ter chegado o derradeiro dia do reconhecimento de tanto esforço, surgiu o inesperado. Mesmo como Vasco assinando um contrato de patrocínio com a Eletrobrás, que prevê o repasse, em quatro anos, de uma verba de R$ 5,2 milhões aos esportes olímpicos, paraolímpicos e aos projetos de responsabilidade social, o clube acabou com cinco modalidades: caratê, judô, taekwondo, boxe e handebol. Na carta enviada aos técnicos, a diretoria justifica que esses esportes não eram autossustentáveis nem traziam receitas para o clube.
Isso não tem fundamento. Nossa equipe não gastava nada e ainda trazia resultados expressivos argumenta o medalhista de ouro do Pan Juarez Santos.
Segundo ele, o clube cedia apenas o local para os treinos e o uniforme dos atletas.
Nossa equipe tinha tricampeões mundiais, pan-americanos estaduais. Éramos a base da seleção brasileira, isso sem o clube gastar um centavo. Como não dávamos retorno? questionou ele.
A tricampeã mundial de caratê Ciça Maia é outra que, até hoje, não consegue entender o que aconteceu. Após 10 anos de clube, ela viveu os dois lados da moeda do esporte amador no Vasco. Em 2000, os tempos de bonança, quando o Vasco montou uma superequipe com os atletas de ponta do esporte brasileiro. Durante um ano, recebeu um salário digno, mas com o fim do projeto voltou à velha realidade do atleta amador no país. Nos últimos anos, Ciça ganhava ajuda de custos esporádica, que mal davam para pagar as passagens. Conseguia se manter dando aulas e competindo por outro clubes. Mesmo assim não abandonou o barco. No ano passado, aos 42 anos, trouxe para a sala de troféus de São Januário o tricampeonato mundial na categoria Open, conquistado no Japão.
Não guardo mágoa do clube, pelo contrário. Tenho gratidão pelo fato de o Vasco ter aberto as portas da minha carreira. Mas lamento muito que está porta tenha se fechado.
Outro carateca, ex-Vasco, que não se conforma é Eduardo Barbosa, 31 anos.
Era a nossa casa, mesmo sem a gente não ganhar nada. Éramos uma família.
Mas agora a família mudou de casa e de camisa. Após o clube comunicar ao técnico de caratê Manoel Varella a suspensão das atividades, outras portas se abriram.
A Vila Olímpica da Mangueira nos recebeu de braços abertos. Treinamos hoje na Escola de Educação Física do Exército e no ginásio da Unisuan. Temos uma ótima infraestrutura elogia.
Após 10 anos de trabalho suado no Vasco, Varella conta que recebeu a má noticia no dia do seu aniversário.
Dispensaram uma equipe que conquistou praticamente tudo nos últimos anos e nos deram apenas uma semana para deixar o clube. Fomos despejados.
Mas o que mais surpreendeu Varella foi o fato de ele ter participado nos últimos meses de mais de 20 reuniões para discutir projetos para viabilizar o esporte, o que na prática não aconteceu. O técnico afirma ainda que, além da saída dos 63 atletas federados, mais de 1.800 crianças carentes correm o risco de abandonar o esporte.
O Vasco tinha 12 núcleos de caratê em algumas das regiões mais carentes do Estado. Agora, essas crianças correm o risco de não ter mais onde treinar.
Perplexidade
No taekwondo, a reação dos atletas não foi muito diferente. A campeã brasileira Danielle San Pol também ficou surpresa com a decisão da diretoria do Vasco.
Sempre conseguimos ótimos resultados, mesmo sem receber nada. A nossa equipe não queria deixar o clube conta ela.
Mais otimista, o técnico do taekwondo Rodney Souza ainda acredita em uma reviravolta.
Eles pediram para dar um tempo, mas não fecharam as portas completamente aposta.
Fábio William, técnico do handebol feminino, foi informado por dirigentes que, a partir de agora, os esportes terão que dar retorno. Segundo ele, a diretoria queria que fosse criada uma escolinha com mensalidades de R$ 50.
As crianças do bairro não têm como pagar este valor para jogar handebol. Isso é inviável avalia o treinador, que trabalhou no clube desde de 2000, sem receber nada. Foi um desrespeito aos profissionais. O que a gente sempre pedia é que o clube pagasse pelo menos a taxa de inscrição por jogo na Federação, de R$ 80, o que nunca acontecia.
Judoca do Vasco desde 2005, Renato Carvalho descobriu pela internet que o clube está encerrando algumas modalidades. Preocupado, ligou várias vezes para o superintendente de esportes olímpicos, Bruno Carvalho. Como ele não atendia às ligações, Renato mandou um e-mail e a resposta foi inesperada.
Ele disse no e-mail que iam parar com tudo e que depois marcaria um encontro para me explicar a minha saída. Até hoje estou esperando.