Mesmo sem entrar em campo, esta quarta-feira é um dia importante para o Vasco. Em julgamento marcado para as 13h30 (de Brasília), o Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ) vai decidir se o clube poderá ou não voltar a receber a sua torcida em São Januário.
O caso será julgado pela Segunda Câmara de Direito Privado em sessão presencial na sede do tribunal, que fica no Palácio da Justiça, Centro do Rio. São Januário não abre os portões para público desde o dia 22 de junho, na derrota do Vasco para o Goiás, pela 11ª rodada do Brasileirão. Há 69 dias, portanto.
A interdição do estádio foi determinada no dia seguinte aos episódios de violência ocorridos no jogo contra o Goiás, em decisão monocrática do juiz Bruno Arthur Mazza Vaccari. O Vasco recorreu uma semana depois - esse é o recurso que será julgado nesta quarta.
Na ocasião, o Vasco também solicitou uma liminar que foi parcialmente deferida pelo desembargador José Roberto Portugal Compasso. É por esse motivo que, desde então, o clube conseguiu reabrir o estádio, mas somente em jogos de portões fechados.
Nesses dois meses, o processo caminhou a passos lentos. Houve manifestações por parte do Ministério Público e do Vasco; e a nomeação de uma perita para analisar os laudos de segurança e emitir sua opinião técnica sobre a situação do estádio, o que ainda não ocorreu.
Paralelamente a isso, advogados do Vasco (SAF e associação) reuniram-se com o Ministério Público no dia 16 deste mês para debater medidas de segurança em São Januário. O Vasco ficou de apresentar um cronograma com medidas para avançar na elaboração de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC), mas ainda não houve retorno - o clube foi procurado pelo ge, mas tem adotado silêncio e não comenta o processo.
O trecho proposto pelo Ministério Público para ser incluído no eventual TAC diz o seguinte:
"Os compromitentes se obrigam a adotar e implementar sistema tecnológico, incluindo hardware e software de verificação biométrica para acesso a estádios, vinculado ao banco de dados e informações do Juizado Especial do Torcedor e de Grandes Eventos, à rede INFOSEG e ao Portal de Segurança Pública, bem como ao banco de dados e informações do GEPE/PMERJ, de modo a possibilitar a identificação dos torcedores infratores já punidos e suspensos nos estádios [...]".
Promotor: "É uma vitimização ridícula"
O caso tomou repercussão ainda maior por causa do trecho polêmico de um relatório assinado por Marcelo Rubioli, juiz que estava de plantão em São Januário no dia do jogo contra o Goiás. Ele diz que o complexo é rodeado "pela comunidade da barreira do vasco, de onde houve comumente estampidos de disparos de armas de fogo oriundos do tráfico de drogas lá instalado"; e que as ruas estreitas "sempre ficam lotadas de torcedores se embriagando".
O Vasco por mais de uma vez relacionou a interdição de São Januário a elitismo e preconceito e recebeu o apoio de outras entidades, como a Associação de Moradores da Barreira e a Federação de Favelas do Estado do Rio de Janeiro (Faferj). A posição do clube é rebatida por Rodrigo Terra, promotor do Ministério Público que propôs a ação na Justiça.
- É uma vitimização ridícula. Não tem nada a ver com isso. O problema foi que explodiram rojões e sinalizadores no gramado e entraram sem a capacidade do estádio de impedir que isso acontecesse. Esse que é o problema. O resto é querer desviar a atenção. Não tem nenhuma relação com pobreza, nada disso - afirmou o promotor ao ge, antes de prosseguir:
- Agora, se o estádio está com suas saídas de emergência levando para vielas que são incapazes de receber um fluxo de milhares de pessoas de uma vez na hipótese de uma emergência em que seja necessário evacuar o estádio, é claro que isso tem que ser citado. Não é porque é favela, é porque é estreito, entendeu? Querer pegar a coisa por esse viés é se recusar a responsabilidade de melhorar o serviço e querer ficar numa posição eterna de injustiçado. Pinçar o negócio lá do juiz, que ele colocou dentro de um contexto todo, para querer fazer esse joguinho ridículo, para jogar um contra o outro, isso é tática de fake news de extremistas, não é compatível com a civilização.
Sobre a exigência de implementação do sistema de biometria, que não existe em nenhum outro estádio do Rio de Janeiro, o promotor disse que seria "muito interessante" que começasse por São Januário.
- Acho que a biometria seria uma mudança de mentalidade, um divisor de águas. É muito interessante que isso comece por São Januário justamente por marcar simbolicamente essa diferença entre o relacionamento que existia. Mas é uma iniciativa que a gente pretende estender para todos os estádios - afirmou.
- Estamos cobrando isso de São Januário porque acabou de ocorrer um evento de violência extrema dentro do estádio em que sinalizadores foram arremessados no gramado, rojões foram apreendidos. Tudo isso mostra que eles entraram. Como eles entraram? Como eles explodiram isso lá dentro? Não foi no Maracanã, não foi no Engenhão. Foi em São Januário. Agora isso não significa que a biometria não deva ser estendida para outros estádios. Deve, sim. Mas é muito interessante que comece pelo pior de todos, que é São Januário. Por todas essas questões que estou dizendo - finalizou.