Na manhã desta segunda, 17 de outubro, a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) divulgou a súmula de Sport x Vasco, assinada pelo árbitro Raphael Claus, válida pela 35ª rodada do Campeonato Brasileiro da Série B. O conteúdo do documento será essencial para que o Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) analise e denuncie os envolvidos pela confusão generalizada.
De acordo com Claus, depois de ouvir a Polícia Militar, se reuniu nos vestiários com representantes dos dois times e comunicou o encerramento da partida por que não se sentir seguro em relação a sua integridade e a dos demais profissionais envolvidos na partida.
Por esse motivo, há a possibilidade do Leão ser declarado perdedor por 3 a 0. Essa previsão está expressa no Regulamento Geral de Competições (RGC) da CBF deste ano.
O artigo 19 do RGC traz que uma partida pode ser "adiada, interrompida ou suspensa" se houver "falta de segurança". Nesse caso, o mesmo RGC, no artigo 20, determina que se o clube que deu causa ao fato estiver vencendo ou empatando, pode ser "declarado perdedor por 0 x 3".
"Se o Tribunal entender que um dos clubes deu causa à suspensão da partida pela falta de segurança, o clube responsável será declarado perdedor pelo escore de 3 a 0. Isso está previsto no artigo 20, inciso I do RGC", conta Fernanda Soares, advogada especialista em direito desportivo e colunista do Lei em Campo.
"Essa é uma situação mais complicada do que parece. Em uma análise inicial, parece evidente que, em virtude da invasão da torcida, o Sport deva ser considerado como o clube que deu causa ao não encerramento normal da partida. Nesse caso, o Sport deveria ser considerado o perdedor do jogo, com o placar de 3 a 0 a favor do Vasco. No entanto, é preciso entender o que desencadeou a reação da torcida, que foi a provocação por parte do atleta do Vasco. Nesse caso, o causador inicial do tumulto que provocou o encerramento antecipado da partida foi o atleta do Vasco e, por sua vez, o próprio time carioca. E se a análise do caso for nesse sentido, será o Vasco que deverá ser punido, não o Sport, com a aplicação do resultado de 3 a 0 em favor do time pernambucano", explica Vinicius Loureiro, advogado especialista em direito desportivo e colunista do Lei em Campo.
É justamente esse ponto de vista trazido por Fernanda Soares em sua coluna desta semana. Há argumentos de responsabilização de ambas as partes: o Sport deve ser responsabilizado por ser o mandante da partida? O Vasco deve ser responsabilizado por ter dado início ao tumulto? Essa será uma das tarefas do STJD.
"Se o tribunal entender que nenhum dos clubes teve responsabilidade pela suspensão da partida, prevalecerá o resultado obtido em campo, o empate por 1 a 1. Agora precisamos aguardar a posição do tribunal", acrescenta a advogada.
Apesar disso, o advogado Vinicius Loureiro diz que "em nada altera a provável perda de mando de campo por parte do Sport, com base no artigo 213 do CBJD (Código Brasileiro de Justiça Desportiva)".
"Dado o relato da súmula e as imagens do ocorrido, é provável que a Procuradoria denuncie ambas as equipes por infração ao artigo 213 do CBJD, que pune as desordens, invasões e lançamentos de objetos no campo de partida. Como o Sport era o clube mandante, é esperado que a punição, se houver, seja maior do que aquela eventualmente aplicada ao Vasco. O Vasco, inclusive, só será punido caso o Tribunal entenda que a equipe contribuiu para a ocorrência dos fatos. A punição é de multa (que vai de R$ 100,00 a R$ 100.000,00) e pode ser cumulada com a perda de mando de campo", acrescenta Fernanda Soares.
"É, sem dúvidas, um processo complicado, que vai envolver teses jurídicas de alto nível e complexidade e, como sempre ocorre, muita movimentação nos bastidores, de lado a lado", analisa Vinicius Loureiro.
Confira o que diz o RGC
Art. 19 - Uma partida só poderá ser adiada, interrompida ou suspensa caso ocorra, pelo menos, um dos seguintes motivos:
I - falta de segurança;
II - mau estado do gramado, de modo que a partida se torne impraticável ou perigosa;
III - falta de iluminação adequada;
IV - ausência de ambulância no estádio;
V - conflitos ou distúrbios graves no campo ou no estádio;
VI - procedimentos contrários à disciplina por parte dos componentes dos Clubes ou de suas torcidas;
VII - fato extraordinário que represente uma situação de comoção incompatível com a realização ou continuidade da partida.
§ 1º - Nas hipóteses previstas neste artigo, o árbitro aguardará o prazo de até trinta (30) minutos, prorrogáveis por mais 30 (trinta) minutos, para suspender a partida, caso entenda que o fato gerador da paralisação não poderá ser sanado.
§ 2º - O árbitro poderá, a seu critério, suspender a partida mesmo que o chefe do policiamento ofereça garantias nas situações previstas nos incisos I, V e VI deste artigo.
Art. 20 - Quando a partida for suspensa por quaisquer dos motivos previstos no art. 19 deste RGC, assim se procederá após julgamento do processo correspondente pelo STJD:
I - se o Clube que deu causa à suspensão da partida estava vencendo ou a partida estava empatada, tal Clube será declarado perdedor pelo escore de 3 a 0 (três a zero);
II - se o Clube que deu causa à suspensão da partida estava perdendo, o adversário será declarado vencedor pelo placar de 3 a 0 (três a zero) ou pelo placar do momento da suspensão, prevalecendo a maior diferença de gols;
III - se o Clube que não deu causa à suspensão da partida estiver dependendo de saldo de gols para obter classificação às fases ou competições seguintes, a situação será decidida pela Justiça Desportiva.
Vinicius Loureiro afirma que esse "será um processo complicado, que vai envolver teses jurídicas de alto nível e complexidade e, como sempre ocorre, muita movimentação nos bastidores, de lado a lado".
Claus informou também que Raniel foi expulso após receber dois cartões amarelos, um por ter tirado a camisa na comemoração do gol, e o segundo por "provocar a torcida adversária na comemoração de um gol". Já o meia Luiz Henrique recebeu cartão vermelho direto por conduta violenta de "jogar um tênis em direção à torcida da equipe mandante de forma agressiva".
STJD promete rigor
Em comunicado divulgado na noite deste domingo (17), o STJD prometeu agir com rigor nos casos de violências nos estádios brasileiros que aconteceram neste final de semana, em Sport x Vasco, pela Série B, e Ceará x Cuiába, pela Série A.
"A Procuradoria agirá com rigor em todos os casos de violência nos estádios de futebol. Pais e todas as pessoas de bem precisam se sentir seguros em qualquer jogo de futebol no Brasil e vamos lutar para que seja essa a realidade", afirmou o Procurador-geral Ronaldo Piacente.
Com base nos artigos 213 e 211 do CBJD, que reforçam a responsabilidade pela segurança dos clubes mandantes, o Tribunal tem aplicado punição pesada aos clubes. O Grêmio, por exemplo, por invasão da torcida e vandalismo no jogo contra o Palmeiras, no Brasileirão de 2021, pegou 10 jogos sem presença de torcida e multa.