Salários atrasados que suspenderam a concentração, Engenhão fechado, elenco enxuto, exposição de problemas internos. Circunstâncias que abalariam qualquer time em um campeonato tão parelho como o Brasileiro.
Menos o Botafogo de Seedorf, que segue na liderança e jogando o melhor futebol do campeonato até aqui. A manutenção da base e os poucos desfalques até aqui ajudam. Mais ainda a execução do 4-2-3-1 bem coordenado e com muita mobilidade do quarteto ofensivo. Sempre em função do posicionamento do craque veterano, para deixá-lo livre e poupar seu fôlego.
Mas a seriedade e o foco do holandês na competição são o que mantém o time alvinegro concentrado e trabalhando jogo a jogo. O camisa dez é sério, líder natural. Orienta o jovem Vitinho e debate à beira do campo com o vivido técnico Oswaldo de Oliveira. Serve e faz gols, mantém o time ligado, com o espírito vencedor que faltou tantas e tantas vezes.
Natural que quando canse ou deixe o campo a equipe perca força. Que time não sente a queda de produção ou ausência de seu craque? Oswaldo precisa mesmo é encontrar solução para manter o time aceso e contundente nos contragolpes depois de abrir vantagem.
No empate contra o Flamengo, a troca de Vitinho por Renato foi profundamente infeliz. Seedorf, Lodeiro e Rafael Marques podem até reter a bola na frente, mas a equipe precisa de um jogador para dar profundidade, receber lançamentos e fazer o oponente temer adiantar muito as linhas. Nesse Botafogo, esse homem é Vitinho, que além de se colocar para as bolas esticadas, vem mostrando um repertório de dribles em progressão quase imparáveis.
Nos 3 a 2 sobre o Vasco, abriu 2 a 0 com relativa facilidade - apesar do gol anulado de André em impedimento dificílimo para a arbitragem segundos antes da conclusão precisa de Rafael Marques, em condição legal. No segundo, assistência de Vitinho, quase sempre contestado pelo individualismo, e toque de classe de Seedorf.
Mas novamente recuou. Primeiro com contra-ataques planejados que poderiam ter definido a partida. Depois se entrincheirando e cedendo espaços generosos ao time cruzmaltino, que avançou as linhas após a troca de Guiñazu por Wendel e diminuiu em linda jogada de Juninho. Outro veterano talentoso e líder nato que atuou mais adiantado no 4-2-3-1 de Dorival Júnior, girou no melhor estilo Zidane e serviu André.
O time seguro e compacto, com atuação firme de um Dória cada vez melhor, deu lugar a uma equipe hesitante, com defesa muito afundada na própria área que cedeu o empate logo no início do segundo tempo em novo gol de André.
A superioridade técnica e tática, porém, fez o Bota ir às redes na primeira descida em bloco. Golaço de Rafael Marques. O artilheiro da equipe com cinco gols que, em tese, deveria ser a referência. Mas se sacrifica por Seedorf. Procura os lados do campo, abre espaços e volta até para cobrir um defensor.
Oswaldo desta vez trocou Vitinho por Elias. Perdeu fluência com o cansaço de Seedorf, porém se fechou com mais naturalidade, administrando a vantagem apesar de alguns sustos. No apito final, comemoração pelo triunfo no Maracanã e Seedorf comandando a nova saudação à torcida. Momento de comunhão.
Talvez o time sinta a sequência de dois jogos por semana sem estádio próprio e oscile em campo e na tabela. A postura de Seedorf, porém, parece o norte mais seguro para o forte Botafogo seguir no topo, driblando os muitos obstáculos. Inclusive os criados por si mesmo.