Quando se menos espera, os grandes mostram por que são grandes. Maior artilheiro do clássico Vasco x Flamengo, Roberto Dinamite, o principal ídolo da história cruzmaltina, prova que, nas horas mais importantes, os vascaínos de coração deixam quaisquer rusgas de lado para torcerem juntos pelo bem do clube. Hoje, o ex-atacante, rival de Eurico Miranda - dirigente que bancou quase sozinho a volta de Romário - estará no Maracanã torcendo feito criança pelo milésimo gol do Baixinho. Ele, que passou sua coroa ao parceiro no fim da carreira, agora age como um fã daquele de quem foi ídolo um dia.
- Torcerei primeiro pelo sucesso do Vasco, que precisa vencer para seguir com chances no Carioca - avisa Roberto. - Mas será bacana unir o útil ao agradável, vendo também o Romário marcar dois gols, chegar ao mil e fazer com que o nome no Vasco corra o mundo de forma positiva.
Mais de uma década antes de Romário e Ronaldo, Roberto fez com o astro da tarde de hoje uma dupla chamada por todos de Ro-Ro. Em 1985, o inesquecível camisa 10 de São Januário chegou a trocar de posição em campo, recuando um pouco mais para servir o projeto de craque, assim que percebeu que o jovem da Vila da Penha tinha como principais trunfos velocidade, explosão e um apurado poder de finalização.
- Já nas divisões de base, o Romário mostrava ser talentoso - diz Roberto. - Nos profissionais, sentiu-se em casa numa equipe fortíssima. Voltei mais, para enfiar bolas para ele. De cada três que recebia, duas ele mandava para dentro.
Para ele, ficou nítido que Romário era diferente dos demais. Só não esperava que fosse jogar até hoje.
- Poucos conseguem chegar bem aos 41 anos - vibra o ex-craque. - Hoje o Romário perdeu certas virtudes, mas não o faro de gol.
O maior artilheiro da história dos Campeonatos Brasileiros condena os que minimizam o feito do Baixinho. Para ele, o momento é de reconhecimento, não contestação.
- Nem eu mesmo sei ao certo quantos gols marquei - confessa. - Não há no Brasil nenhum órgão que aponte estatísticas fidedignas. E, no fundo, pouco importa se ele marcou menos de mil ou mais. Se fez 980, foi gol demais. Se 1.010, também. Precisamos reverenciar esses dois que faltam e esquecer qualquer coisa menor.
Satisfeito pela justiça ter sido feita e novas eleições para a presidência do Vasco estarem próximas, Roberto está de bem com a vida. E promete que o sofrimento que lhe faz doer o coração, Romário não terá de jeito nenhum. Segundo ele, quando se tornar presidente, o Baixinho será sempre benquisto quando aparecer por São Januário.
- Temos sempre que reverenciar os ídolos e os jogadores que passaram por ali fazendo história - diz, com elegância e a categoria que sempre mostrou em campo. - Nosso clube não foi feito na Era Roberto, nem no tempo do Romário, do Edmundo ou do Ademir. O Vasco é um clube centenário. Não se deve tentar apagar da memória isso. O torcedor jamais se esquece.
No ataque dos sonhos do Vasco, Roberto deixa a 11 com Romário.
- Meu time jogaria com três na frente: eu, Ademir e Romário.
Mesmo sem ser amigo pessoal do Baixinho, Roberto Dinamite demonstra enorme carinho pelo pupilo que soube superar o mestre.
- Tenho uma relação boa com ele - conta. - Não temos o contato do dia-a-dia, nossas idades se diferem, não freqüentamos os mesmos lugares, mas temos bastante respeito um pelo outro.
Mágoa, talvez uma única.
- Uma vez eu vi uma entrevista dele em que, recordando os parceiros com os quais jogou, não citou o meu nome. É um direito dele, que se identifica mais com um do que com outro, mas isso não quer dizer que ele não gosta de mim por causa disso. Eu mesmo joguei com Tostão, Silva, Reinaldo, Cláudio Adão, vários, mas aquele com que me dei melhor foi o Amauri, um catarinense que poucos hoje se lembram.
Enaltecendo o protagonista do clássico de hoje, Roberto o considera um fora de série.
- Nos últimos 20 anos, Romário foi o maior jogador da sua posição. Está entre os maiores do mundo independentemente de atingir ou não a marca dos mil. Que isso fique bem claro.
Ao recordar o passado, Roberto lembrou dois Vasco x Flamengo especiais para a dupla.
- Em 1987 fomos campeões juntos. Mas ele desequilibrou mesmo na final da Taça Guanabara de 1986. Foi 2 a 0, dois gols dele.
Roberto, que foi padrinho do primeiro casamento de Romário, não estará na festa que o Vasco prepara para o gol mil. Nem por isso torcerá contra.
- Só não estarei porque não sou bem-vindo para o atual presidente, embora gostaria de participar. Mas estarei nas cadeiras este domingo. Ele nos dará esse prazer inesquecível de atingir contra o Fla essa marca, que é inédita para o Rio de Janeiro e, principalmente, para o Vasco.