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Psiquiatras falam sobre a influência de atletas e cita Bernardo

O episódio protagonizado por Bernardo - que, segundo a investigação policial, também envolveu Charles, do Palmeiras, e Wellington Silva, do Fluminense - é apenas mais um que mistura futebol, situação de risco e noticiário policial. Outros nomes como Bruno, Julio Cesar, Edinho (filho de Pelé), Adriano, Romário, Jorginho (beach soccer) e Vagner Love também já tiveram seus nomes envolvidos em situações do mundo proibido. As polêmicas podem causar entre crianças e jovens o efeito de dupla mensagem, quando o exemplo do que é bom e ruim, certo ou errado, se confunde diante das atitudes do ídolo. O sucesso repentino, a rápida mudança de status econômico e a sensação de falso poder são alguns dos motivos apontados por especialista para tentar explicar a síndrome de “sou ídolo, posso tudo”.

Essa é a avaliação do psiquiatra Marcelo Migon, membro da Associação Internacional de Psiquiatria Esportiva e especialista em dependência química da Universidade Federal de São Paulo.

- Um cidadão qualquer, que não tem esse apelo social, que não aparece tanto na mídia, tanto faz se ele vai na favela ou não. Mas o jogador aparecer entrando em campo de mão dada com a criança, com uma criança no colo, e no dia seguinte estar na primeira página do jornal porque apanhou do traficante, isso passa uma dupla mensagem para criança: “Então, se eu for igual ao Bernardo, eu vou poder ir à favela, apanhar ou não, fazer isso ou não?!”. Não tem limite essa imagem que o atleta passa para a criança – afirmou o psiquiatra.

Marcelo Migon aponta alguns fatores que podem servir como gatilho para atitudes que não condizem com a postura de um atleta:
- Alguns têm inteligência limítrofe que faz com achem que a realidade deles é outra, o que chamamos de desenvolvimento mental incompleto. Somado ao que o falso poder dá a ele: “Sou jogador de futebol, sou ídolo, nada vai me acontecer”. Você não vê isso: “Ah, sou o Zé Mayer, vou entrar na favela”. Além disso, os jogadores têm mudança de status econômico da noite para o dia, às vezes não têm laços familiares muito fortes, abandonam a família muito cedo para se dedicar à carreira. E uma série de aproveitadores que logo colam neles. O meio faz a ocasião, e vice-versa.
Resistência a acompanhamento médico

Pelos clubes do Brasil é possível perceber a resistência de jogadores a recorrer a acompanhamento com psicólogo ou psiquiatra. No ano passado, uma das condições para Adriano permanecer no Flamengo era ir a consultas com um médico indicado pelo clube. O atacante prometeu que procuraria o médico, mas não apareceu em nenhuma sessão.

- Ainda colocam o médico psiquiatra como se fosse um monstro, algo de outro planeta. A seleção inglesa de ciclismo colocou um psiquiatra antes das Olimpíadas de Pequim (2008) e foi a edição na qual mais ganharam medalhas de ouro até então. Existe resistência (ao tratamento). É preciso que diretoria e departamento médico dos clubes quebrem esse estigma.
Há muito tempo, o psiquiatra não trata louco, aquele louco no meio da rua que diz ser Napoleão. Psiquiatra faz terapia, trata transtorno de ansiedade, doenças menores que não a esquizofrenia – destacou Marcelo Migon.

O membro da Associação Internacional de Psiquiatria Esportiva diz que, em muitos casos, o fato de o jogador ter que recorrer ao acompanhamento médico é encarado como uma estranha novidade.

O psiquiatra Marcelo Migon lembra de uma conversa que teve com Dorival Júnior quando ele ainda treinava o Flamengo, a qual comprova a resistência a novos métodos:

- Ele contou de uma experiência dele no Santos, que tinha fechado uma parceria com um curso de inglês e colocou professores dentro do clube para darem aula. Na primeira, só havia três ou quatro jogadores. Na segunda, só tinha a comissão técnica. Ele estava explicando que em toda novidade implementada, os primeiros a recusarem são os próprios jogadores. O jogador é funcionário do clube, que tem que ditar as regras.
Curiosidade por favela e imagem do jogador em risco

No caso de Bernardo, suas incursões no Complexo da Maré se tornaram corriqueiras nos últimos tempos. Nascido em Sorocaba (SP), o jogador não tinha contato com favelas.
A curiosidade por uma outra realidade aparece como uma das explicações. E rompe as barreiras do futebol no Rio de Janeiro.

- Não vejo isso como questão específica do jogador de futebol, mas sim como uma curiosidade que muitos jovens têm de conhecer a outra realidade da cidade. Você vê bailes funks com grande parcela de meninas e rapazes de classe média e alta. Conhecer esse outro lado do Rio de Janeiro não é questão inerente ao jogador. Mas, diferente de outros jovens, ele deveria ter compromisso maior com o corpo, com a saúde, dormir cedo. Muitos têm contrato de imagem e não prezam por isso. Choca – completou Marcelo Migon.

Nesta segunda-feira, o técnico Paulo Autuori destacou que o futebol é parte integrante da sociedade e citou o risco do desperdício de talento no caso de Bernardo.

- O futebol não está numa redoma fora da sociedade. Na vida a gente vê tantos casos de desperdício de talento. Só espero que o Bernardo não seja mais um - disse o treinador do Vasco.

Segundo investigações da polícia, o meia do Vasco teria sido agredido por causa de suposto envolvimento com Dayana Rodrigues, apontada como namorada do traficante Menor P e que foi atingida por sete tiros no complexo de favelas da Maré. Nesta quinta, ao deixar o hospital após passar por uma cirurgia no joelho esquerdo, o meia falou em vida nova.

Fonte: ge
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