Futebol

Romulo fala da infância e do sonho de defender Seleção Brasileira

Não fosse o futebol, Rômulo ainda estaria em Picos, no Piauí, morando com a mãe, comendo tapioca, jogando descalço nas ruas tranquilas desta cidade de pouco mais de 80 mil habitantes.

Porém, não fosse o futebol, o volante do Vasco não sabe o que seria. Ele o levou para Caruaru, trouxe o jovem até São Januário, deixou-o cara a cara com Messi e está perto de mandá-lo aos Jogos de Londres.

No dia 6 de julho, ele aguarda, tentando esconder a ansiedade, ouvir seu nome na lista do técnico da seleção Mano Menezes, que convocará os jogadores para as Olimpíadas.

— Meus pais apoiavam que eu jogasse bola, mas eu tinha que estar bem na escola sempre. Lá, só estudava e ia correndo jogar bola nos campinhos e na rua mesmo — lembra o volante, que nunca jogou em clube até ser visto por um olheiro aos 15 anos.

O futebol não o levou só a rodar pelo país. Por ele encontrou seu porto seguro ao lado de Jessika. Namorada de adolescência dos tempos do Porto de Caruaru, em Pernambuco, tornou-se esposa e o ajudou a aplacar a saudade da família no Piauí.

— Fui sozinho para Porto de Caruaru, não conhecia ninguém. Logo, fiz amizades e a conheci no colégio — conta Rômulo, que conciliou estudos e futebol até o segundo ano do ensino médio. — Treinava de manhã e estudava à noite.

Tinha que pegar ônibus, era longe... E, às vezes, preferia namorar a estudar.

Por enquanto, a bola parou no Rio de Janeiro. O descanso se dá na Barra da Tijuca. No apartamento alugado — o dinheiro só começou a entrar mesmo no ano passado, quando o Vasco adquiriu parte dos seus direitos econômicos —, a folga é dedicada a Nicoly, de 3 anos. Em casa, na área de lazer ou na piscina, ela ganha todas as atenções do pai. Até mesmo uma tatuagem só para ela. Recentemente, ele marcou nas costas o nome da filha e o desenho de um anjo. Só os mais íntimos veem e Rômulo evita mostrar por causa do pai: — Ele não queria, não gosta muito.

Quando viu, após um jogo que troquei de camisa no campo, reclamou e me ligou dizendo que era grande demais.

No Vasco, ao lado de Felipe Do menino franzino de Picos ao Rômulo da seleção brasileira, tantas novidades passam aos olhos dele sem assustar. Os anos podem ser poucos, são apenas 21, mas as experiências, muitas. Percorreu o caminho da maioria dos jogadores de futebol que saem do interior aos grandes centros.

Morou em alojamento do CT do Porto de Caruaru; via a família poucas vezes ao ano; viveu em São Januário entre os meninos da base por alguns meses; e viu-se longe da filha pequena e da mulher por alguns meses até encontrar uma casa temporária na Rua Bela, a poucos metros do Vasco: — Tem que estar preparado para isso.

Na vida do jogador de futebol as coisas acontecem muito rápido.

Neste tempo itinerante, longe da família, teve até de lavar suas roupas e chuteiras. Hoje, dá-se ao luxo de não fazer qualquer tarefa doméstica em casa.

— Nunca cozinhei, mas tinha que lavar minhas roupas. Quando sobrava um dinheirinho, eu pagava. Hoje, minha esposa cuida de tudo. Eu jogo bola e ela cuida da casa — brinca.

Na sua chegada ao Vasco em 2009, pode não ter encontrado a estrutura da base do Porto de Caruaru, com quatro campos de futebol. Mas teve oportunidades únicas. Como observar, ainda que de longe, os profissionais treinarem. Entre eles, atuais companheiros de time como Fernando Prass e Carlos Alberto. Sete meses depois, estava lá ao lado deles.

— Sempre ficava olhando, não era normal para mim ficar no meio deles, que só conhecia da TV. Cheguei no profissional na época que o Felipe estava voltando ao clube. Como ele não conhecia ninguém também, treinávamos juntos, ficava junto dele. Ficava com medo de errar a bola nos treinos e ele reclamar, mas o Felipe sempre foi gente boa — recorda.

Adaptável a qualquer ambiente, Rômulo, no entanto, não deixa as raízes para trás. Se estar em Picos só é possível nas férias, a cidade está perto dele.

Seja nas visitas dos pais e irmãos, nas ligações quase diárias da mãe, ou na culinária nordestina. A tapioca continua na mesa do café da manhã.

No Rio, leva a vida típica do jogador de futebol, caseiro. Conhece bem o trajeto Barra-Linha Amarela-São Januário.

Na Zona Sul, só viu as praias: — Se me largarem lá, me perco. Demorei a conhecer as coisas, só vou ao shopping, almoçar ou jantar com os companheiros do Vasco. Sou caseiro, gosto de ver TV, novela. Vi Fina Estampa, agora vejo Avenida Brasil.

Por isso não se surpreende com qualquer mudança por vir. A Europa sonda a sua porta desde que começou a se destacar no Vasco. Com as boas atuações na seleção brasileira, a especulação ficou mais forte. Ele deixa tudo nas mãos dos empresários. O sonho de infância de jogar na Europa mudou com vinda para o Rio: — Sempre via os jogos do Real Madrid, me imaginava jogando. Mas o futebol brasileiro evoluiu bastante.

Agora, todos estão vindo para cá.

Na filosofia de um dia por vez, Rômulo, que sentiu medo de ficar fora da seleção por causa da lesão sofrida no início do ano, vai aproveitando cada novidade.

— Pensava em jogar uma Copa do Mundo. Não sonhava tanto com Olimpíadas.

Agora, tento não pensar tanto para não ficar nervoso — admite.

(Matéria reproduzida diretamente da versão papel do Jornal O Globo)

Fonte: Jornal O Globo
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