Futebol

Técnicos dos 4 grandes do RJ fazem prognósticos para o Brasileiro

Campeões mundo afora, os técnicos dos quatro clubes cariocas sabem que o passado vitorioso abriu as portas para a volta para casa. E a chave da permanência em times de ponta no país é fazer uma boa campanha no Brasileiro, que começa hoje. Abel Braga, do Fluminense, Oswaldo de Oliveira, do Botafogo, e Paulo Autuori, do Vasco, são treinadores consagrados, com o título do Mundial de Clubes em seus currículos. Ao lado deles, o novato Jorginho, do Flamengo, tetracampeão do mundo com a seleção na Copa de 1994, nos Estados Unidos, procura espaço em um mercado cada vez mais restrito, no qual o campeonato nacional, mesmo com todos os problemas citados por eles, é a vitrine e o caminho para o sucesso. Ou para o fracasso.

Em entrevista ao GLOBO, cada um deles disse o que pensa sobre a estrutura da competição, indicando os favoritos, as promessas que poderão surgir, condições dos estádios, renovação nos cargos dos treinadores e o esquema tático que deverá ser o padrão nos 38 jogos. Também falaram sobre a saída de Neymar do Santos, a defasagem do futebol brasileiro em relação ao europeu e a pouca esperança de reabilitação até a Copa do Mundo no Brasil, para a qual, segundo eles, um fato é certo: surgirá um novo craque a tempo de ser convocado por Luiz Felipe Scolari.

Atual campeão brasileiro, campeão mundial com o Internacional em 2006, Abel Braga acredita que existe uma renovação dos treinadores, mas reclama da fragilidade do cargo no Brasil. Uma das exceções à regra da queda imediata diante do tropeço em poucos jogos, o treinador vai completar dois anos no cargo no dia 8 de junho:

— Se para a gente, que já tem uma estrada, já é difícil, para um treinador novo é mais ainda. A paciência é pouca. Mas cabe aos clubes, e também aos jornalistas, ajudarem na mudança de mentalidade.

Jorginho é uma das caras novas entre os grandes no Brasileiro deste ano. Ao substituir Dorival Júnior, encontrou um time em crise e pouco dinheiro para contratações. Ele admite que a estrutura não é a ideal, mas mostra confiança.

Paulo Autuori, que venceu o Brasileiro em 1995 com o Botafogo, e foi campeão mundial com o São Paulo em 2005, também encontrou um Vasco em dificuldades financeiras. Ele defende a renovação dos treinadores. Inclusive a dele próprio, que passaria para um outro cargo no futebol.

— Seria um desafio — diz.

Campeão carioca e apontado por Abel como um dos favoritos ao título, Oswaldo de Oliveira, campeão brasileiro (1999) e Mundial (2000) com o Corinthians, foi vaiado pela torcida em seu começo no Botafogo. O treinador e a diretoria deram a volta por cima na conquista do Carioca. Prova de que manter o treinador é meio caminho andado:

— É uma questão de bom senso dos dirigentes.

Quais os favoritos?

ABEL: Acho o Atlético-MG com mais mais qualidade hoje do que no ano passado. O Corinthians é sempre favorito. E o Botafogo fará uma boa campanha. O Fluminense está no bolo. Mas não podemos esquecer do Grêmio, do Internacional...

AUTUORI: A princípio, neste início de Campeonato Brasileiro, eu consigo observar três times como os favoritos ao título, pelo momento em que vivem e a maturidade adquirida ao longo do tempo: Corinthians, Fluminense e Atlético-MG.

JORGINHO: É difícil falar, porque o Brasileiro é muito disputado. O último campeão, o Fluminense, leva uma vantagem. O Corinthians vem de um ano fantástico. Não tenho dúvida de que estas equipes têm um pouco mais de favoritismo. Mas tudo pode acontecer.

OSWALDO: São muitos os favoritos, não tem um só. Corinthians, Atlético-MG, Fluminense, Flamengo, São Paulo, Grêmio e Botafogo, claro. Falar de favoritismos antes dos 38 jogos é um tiro n’água.

E o melhor elenco?

ABEL: São os do Atlético-MG e o do Corinthians. O Fluminense? Eu vou iniciar sem Deco, Thiago Neves. Wellington Silva. O Atlético, por exemplo, conseguiu equilibrar. Tem o Alecsandro, Josué na reserva. Sai o Bernard entra Luan. Ainda tem Jô, Ronaldinho, Gilberto Silva... Precisa falar mais?

AUTUORI: Os três citados por mim na primeira pergunta (risos). Estes times conseguiram preservar os seus grupos e ainda fizeram uma espécie de sintonia fina. Isto leva um tempo para outras equipes fazerem porque ainda estão em formação.

JORGINHO: Fluminense e Corinthians são dois clubes que têm mantido os seus elencos, acrescentando algumas peças importantes. Além disto, o que tem facilitado é que eles têm passado por um momento financeiro muito bom.

OSWALDO: Outra coisa que é difícil apontar. Jogador não é máquina, pode não estar bem por um tempo. Ano passado, falava-se do Fluminense, hoje não é mais isso. Agora, o grupo mais bem trabalhado que tenho visto é o do Corinthians, que conquistou Mundial, Libertadores, Paulista.

O rival mais difícil?

ABEL: São 12 favoritos ao título, e um clube grande sempre passa por problemas ou cai e um médio sempre briga lá em cima. O Brasileiro é um dos mais equilibrados do mundo.

AUTUORI: Isto dependerá muito do momento de cada equipe no decorrer da competição, que é longa. Atualmente, a maior dificuldade para todas as equipes seria enfrentar o Atlético-MG no estádio deles, o Independência.

JORGINHO: Agora mudou muito, porque os estádios mudaram bastante. Não tem como mensurar. Por exemplo, jogar contra o Santos e o Atlético-PR na casa deles, por exemplo, sempre foi um calor muito maior do que em outros estádios do Brasileiro.

OSWALDO: O Sport está na Segundona agora, mas era um dos piores, pela animosidade no estádio. Acho que o Atlético-MG também é muito difícil pela presença da torcida tanto no Independência quanto no Mineirão. É uma torcida motivadora e muito intensa. O Pacaembu também é assim.

Teremos um craque para a Copa?

ABEL: Com certeza! Em um ano, aqui no Brasil, acontecem coisas fantásticas. E a grande diferença é que os jogadores disputam mais campeonatos na base e chegam ao profissional com mais consistência do que antes.

AUTUORI: O Campeonato Brasileiro sempre permitiu ao longo de sua história o surgimento de um novo jogador. Embora em menor quantidade, o nosso futebol continua revelando valores e poderá acontecer de surgir um novo nome, sim.

JORGINHO: Pode aparecer um novo craque para a Copa do Mundo no Brasil, sim. Isso já aconteceu em outras oportunidades, e eu espero que aconteça este ano para que dê ainda algum tempo para o Felipão observar com certa calma.

OSWALDO: Claro, com certeza. Até acho que vai surgir. Todo ano surgem novos talentos, é um fonte inesgotável de talentos, uns mais ou menos que outros.

O que pensa da saída de Neymar?

ABEL: Não, não me incomoda mesmo, porque sempre foi a ordem natural das coisas. E o Neymar saindo agora será bom para todos. Ele é o maior maior fenômeno do futebol na última década. Em certas coisas, como dribles, é mais fenomenal até que o Messi.

AUTUORI: Já tivemos Campeonatos Brasileiros sem craques como o Zico, o Romário, o Ronaldo Fenômeno, o Ronaldo Gaúcho e o Rivaldo, só para citar os tempos mais recentes. Por isso, podemos, sim, ter um Brasileiro sem o Neymar.

JORGINHO: Este é um processo muito natural. A saída dele aconteceria de qualquer maneira neste ano ou no próximo.

OSWALDO: Lamento muito ele não jogar o Brasileiro. Particularmente vou lamentar ainda mais porque ano passado ele não jogou contra o Botafogo e não tive o prazer de conhecê-lo. É uma joia rara.

Haverá outro Neymar?

ABEL: Demora, mas surgirá, sim, um outro Neymar. Tivemos, recentemente, Pato, Robinho, Diego, Nilmar, Sóbis... Uma geração fantástica de atacantes.

AUTUORI: O futebol brasileiro tem uma grande capacidade de produzir novos e bons jogadores. Sempre foi assim.

JORGINHO: No futebol brasileiro, isto é perfeitamente possível de acontecer de novo. Além do Neymar, o Ganso também surgiu no Santos como um fenômeno e ambos acabaram passando por aquela celeuma toda em 2010.

OSWALDO: Não sei, não dá para avaliar. O surgimento de um craque depende de conjunção de fatores. Com que tempo vai aparecer, não sei, mas vai aparecer. Vimos isso com Pelé, Zico, Romário, Ronaldo, Neymar, fora outros grandes jogadores.

Quem surgirá no seu time?

ABEL: Tem um menino na base, o Kennedy, que é atacante (17 anos), que jogou nas seleções de base, que eu vou puxar. Será um nome talvez para este ano, talvez para o ano que vem. É só botar a cabecinha dele no lugar para repetir em cima o que já faz na base.

AUTUORI: O Vasco está com vários jogadores novos. Alguém vai aparecer, sobressair, é lógico. E eu espero que a disputa seja grande entre eles.

JORGINHO: O Rafinha está surgindo muito bem, e o Gabriel é um jogador que, além de sua qualidade tática, é muito interessante. E tem a chegada do Paulinho (ex-XV de Piracicaba), que é um jovem jogador e extremamente veloz. Tudo pode acontecer. O Campeonato Brasileiro tem muitas surpresas.

OSWALDO: Vejo Vitinho com muitas boas chances, crescendo muito desde o ano passado.

A estrutura melhorou?

ABEL: Não . Não há estádios no Rio, por exemplo. Nossos campos foram cedidos para a Copa das Confederações. Faremos uma viagem a Macaé de avião, teremos que descer em Cabo Frio, e viajar mais uma hora de ônibus para poder jogar e outra para voltar...

AUTUORI: Os principais problemas são infraestrutura e organização, que limitam os aspectos técnico e tático, porque as condições não são as ideais para uma preparação perfeita. Sem falar nas viagens absurdas, desgastantes pela dimensão do país e a falta de um calendário bem feito.

JORGINHO: Tem equipes do Brasil que se estruturaram bastante. O Flamengo está neste processo. A gente tem cinco campos, mas, para treinar mesmo com os profissionais, são apenas três, que nos servem bastante bem. Mas a estrutura em si não é a ideal.

OSWALDO: Não dentro de campo, não vejo a parte técnica defasada.

O Brasil está atrasado?

ABEL: Sim. A primeira coisa é em relação ao calendário e à organização. Ninguém é contra os estaduais, mas havia um charme. Agora, é desumano. Existe uma proposta de dar 15 dias de férias apenas para os jogadores e treinar os outros 15. Se eu fosse jogador, não aceitaria. Que preparação é esta?

AUTUORI: Em termos de calendário e organização, há muito tempo que o futebol brasileiro está atrasado. Em termos de conceitos e ideias, também. Mas é equilibrado. Até nos momentos em que o nível cai por razões como a paralisação, desgaste, viagens longas, disputa de outras competições.

JORGINHO: Não diria que estamos atrasados. Eu só acho que a gente tem uma fórmula de treinamento e uma metodologia de trabalho diferentes. No mundo, em geral, adaptam muito o treinamento para ser parecido com o que você realiza no jogo.

OSWALDO: Fora de campo, a Europa sempre esteve à frente. Organização, infraestrutura, calendário, salários atrasados... nunca conseguimos nos equiparar. Um grande problema do Brasil são os gramados, que debilitam o futebol.

Recuperamos até a Copa?

ABEL: Não dá, porque lá na Europa é muito mais organizado.

AUTUORI: Chance zero. Não tem como tirar essa diferença. O que vai acontecer é que vamos melhorar um pouquinho, só um pouquinho, em matéria de aeroportos e acessos a uma infraestrutura de primeiro mundo. Na verdade vamos dar um “jeitinho”. Minha esperança é no nosso povo. Que ele dê o show!

JORGINHO: Teremos que buscar informações em todos os lugares para que o nosso futebol possa se atualizar. A gente (treinadores) ainda tem uma metodologia de trabalho que é muito particular.

OSWALDO: Com um calendário mais organizado e campos bons, que espero que tenhamos com a Copa, conseguiremos diminuir um pouco (a defasagem). O futebol brasileiro sempre é confrontado e dá resultado apesar das dificuldades econômicas, de estrutura e organização.

E os nossos estádios?

ABEL: Tem que fazer mágica. Muitos estádios feitos para a Copa ficarão sem uso... E o clube tem que jogar para ganhar tudo, sempre...

AUTUORI: A tendência é fazermos jogos em campos ruins, e, por isso, é possível que o nível técnico da partida seja ruim. Isto não é bom. Os novos estádios ajudariam com melhores serviços e campos em boas condições.

JORGINHO: Na Europa, os jogos são geralmente só nos finais de semana. Lá, você joga de quinze em quinze dias. E os estádios só são usados de quinze em quinze dias. Aqui, a gente tem jogo quarta e sábado, quarta e domingo. E com jogo toda hora, tem a questão do gramado... fica difícil manter.

OSWALDO: O Brasil passa por transição grande e atualização dos estádios para a Copa. Espero que depois do Mundial o bom estado seja mantido e o futebol brasileiro cresça.

Há um esquema padrão?

ABEL: É mundial: 4-2-3-1, 4-3-3. Não foge muito disso. Mas o futebol está mais rápido. Tem que ter jogador veloz, porque virou uma correria.

AUTUORI: Esquema tático é equilíbrio. O que mais variáveis tem é o 4-4-2. O único que mudou radicalmente foi o dos três zagueiros, que não me agrada. O Brasil deixou de produzir laterais e meias a partir da adoção desse esquema.

JORGINHO: Acho que o esquema 4-2-3-1 é o sistema do momento, no qual as equipes têm estado muito compactadas, muito fortes defensivamente, mas com muita força ofensiva também, que sempre foi nossa característica.

OSWALDO: Acho que a tendência é o 4-2-3-1 como muitos vêm jogando. O que muda de um time para o outro são as características dos jogadores que se adaptam. Uns jogam com três meias mais agressivos, outros com um atacante mais de área.

Há renovação de técnicos?

ABEL: Sim. O Coritiba está com um novo, o Marquinhos. O Guto, na Ponte Preta. Bonamigo, Jorginho, Adílson Baptista. A renovação entre os treinadores é natural, mas a torcida e os clubes costumam ter menos paciência com o treinador novo.

AUTUORI: Não vejo uma renovação de treinadores. O que vejo é um rodízio dos mesmos nomes, inclusive o meu, em vários clubes. Isto está errado. Deveria haver uma renovação inclusive para alguém ocupar o meu lugar e eu exercer outra função. É um desafio que mexe comigo.

JORGINHO: Tem sim. E tem até uns treinadores mais experientes que sempre buscam informações e estão ligados no que está acontecendo no mundo do futebol. E ainda há uma geração nova que está chegando e, com isso, consequentemente tem uma renovação.

OSWALDO: Sempre houve mudanças de treinador nos últimos anos, várias entradas e saídas.

Continuidade é tendência?

ABEL:Os clubes estão começando a ver que não vale a pena ficar trocando. Eu mesmo já vou fazer dois anos de Fluminense no dia 8 de junho.

AUTUORI: A prova de que manter o treinador e dar um bom tempo para ele trabalhar não é ruim. Ruim é o fato e os três times que eu citei como favoritos para o título da competição terem feito isso. E incluo o Botafogo.

JORGINHO: O Botafogo, por exemplo, teve uma situação bem clássica. O Oswaldo, no ano passado, fez um bom trabalho, mas não foi campeão carioca, Brasileiro ou da Copa do Brasil, mas mantiveram ele. Foi meu treinador, gosto muito dele, é muito bom de grupo. O resultado veio agora no Carioca.

OSWALDO: Isso é uma questão de bom senso dos dirigentes. Viveu um tempo de muita rotatividade e agora tem aumentado a preocupação com a qualidade.

Quem será o campeão?

ABEL: Tomara que seja a gente. Se não for, vou torcer por um carioca para que a hegemonia seja mantida. Eu realmente vejo o Botafogo com condições de ficar com o título.

AUTUORI: Não tenho bola de cristal. Se for pela minha vontade que seja o Vasco.

JORGINHO: Isto é muito difícil, mas espero que seja o Flamengo (risos).

OSWALDO: Por palpite será o Botafogo.

Fonte: O Globo
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