Capitão da única conquista da Copa São Paulo de Futebol Júnior do Vasco, Wellington Queiroz, ou simplesmente Tinho, fez parte de uma geração que marcou época no clube, mas uma grave lesão mudou o curso dele em São Januário e impediu que participasse daquele que é considerado o último "esquadrão" do Cruz-Maltino. Anos depois, porém, teve a oportunidade de gravar o nome na história de um outro clube: o Paysandu. O zagueiro estava naquele time do Papão da Curuzu que disputou a Libertadores de 2003 e venceu o Boca Juniors, na La Bombeira, fazendo Belém do Pará ter um Carnaval fora de época.
Cria da base do Goytacaz, de Campos, município no Norte Fluminense, chegou ao Vasco ainda para as categorias inferiores e foi promovido em 1992. Mesmo com a concorrência no setor, teve oportunidades e se firmou no elenco, mas em 1996, aconteceu a primeira lesão no joelho. Começou 1997 como titular, mas sofreu nova lesão, e no mesmo local. A diretoria, então, analisou a necessidade de ir ao mercado e acabou por contratar um zagueiro que tinha atuado pelo Americano, rival do Goytacaz, no Campeonato Carioca: Odvan.
"Eu torci o joelho em um Vasco e Botafogo no Maracanã em 96, tive a ruptura do ligamento cruzado anterior. Passei por uma cirurgia e fiquei seis meses parado. Consegui voltar a jogar ainda em 96, no Brasileiro. Virei o ano de 97 jogando de titular, foi quando eu tive a mesma lesão, a ruptura do ligamento cruzado que eu havia operado no ano anterior. Tive de passar por uma cirurgia novamente, mais seis, sete meses parado. Foi quando, praticamente, perdi o posto de titular. Com essa minha lesão, o Vasco trouxe o Odvan para jogar no meu lugar. Ele tinha jogado pelo Americano, de Campos, e aí encaixou", lembra.
"Não acreditavam"
Tinho ainda permaneceu na Colina, se recuperou e foi relacionado para uma partida daquela vitoriosa campanha do Brasileiro de 1997, quando o Vasco conquistou o tricampeonato. Ele lembra que, no começo da competição, muitos não acreditavam que aquela equipe poderia ser vencedora.
"Não só a zaga encaixou, mas aquele time todo do Vasco de 97. Deu certo! Era um time que, na verdade, quando foi montado, muitas pessoas não acreditavam. O Vasco tinha um zagueiro que veio do Americano, um cabeça de área que era do Madureira, que era o Nasa. Evair, que já estava mais velho e não acreditavam tanto... Mas acabou que o time encaixou, deu caldo. Acabei me recuperando e jogando apenas um jogo [no Brasileiro de 97]. Eu fui para o jogo contra o Juventude. Foi só pra ficar no banco e receber a faixa no final (risos)", completou.
Viagem para a Arábia Saudita "no escuro"
Após um conselho da diretoria do Vasco, Tinho, no começo de 1998, foi para o Americano para realizar a reta final de recuperação. Àquela altura, o time cruz-maltino já via a zaga como um setor fechada e avaliava que o jogador precisava de tempo em campo para se curar completamente.
Após o Carioca, retornou a São Januário, mas recebeu uma proposta "muito boa financeiramente" do Al Alhi, da Arábia Saudita, que tinha Zanata, ex-Vasco, como técnico. À época, esse tipo de transferência era menos comum e os meios de pesquisa eram mais escassos.
"Foi muito boa a experiência. Muitas dificuldades, mais com a língua e com a comida. Na época, não tínhamos a internet que nós temos hoje. Em 98, a internet era muito precária, Lembro que eu tinha uma conexão discada da minha casa e eu entrei nestes buscadores. Coloquei "Arábia Saudita" e aparecia o governo, a moeda... Aparecia pouca coisa. Então, fui meio que no escuro, mas foi uma experiência sensacional, em um país onde a cultura, em relação à nossa, é completamente diferente", conta.
Ao lembrar dessa passagem na carreira, o zagueiro ressalta que foi uma temporada que ganhou uma grande importância, afinal, lhe deu a certeza de estar totalmente recuperado da cirurgia. Apesar de admitir que, naquela época, ficou "escondido" para o mundo do futebol, afirma não se arrepender da escolha.
"Os árabes são apaixonados por futebol. Foi um ano muito legal, que marcou muito para mim. Joguei e tive a certeza de que, realmente, estava recuperado. Foi muito proveitoso financeira e profissionalmente. Profissionalmente pelo fato de ter jogado vindo de cirurgia. Não foi tão bom profissionalmente por ficar meio escondido, entre aspas. É diferente de, hoje, você ir para a Arábia Saudita e todo mundo sabe que você foi para lá. A internet hoje proporciona isso. Naquela época, não. Eu fui e o mundo do futebol, por um ano, praticamente não sabia que eu estava na Arábia Saudita. Mas eu não me arrependo da escolha e a experiência de vida, cultura... Para mim e para as minhas filhas foi muito bacana".
Fez história no Papão
Tinho voltou ao Brasil e defendeu clubes como Santa Cruz, Portuguesa, Sport e America, até que, em 2002, acertou com o Paysandu. No Papão, fez parte de um time que entrou para a História. A classificação à Libertadores de 2003 — com a conquista da Copa dos Campeões 2002 — por si só já era um feito e tanto, mas vencer o temido Boca Juniors na La Bombonera é algo que até hoje ainda ecoa pelas ruas de Belém.
Um ponto de destaque daquela partida é que, no dia anterior, a equipe paraense treinou nas dependências do próprio Boca. Mas a hospitalidade durou pouco e, antes de a bola rolar, o clima foi outro.
"O Paysandu disputando uma Libertadores foi algo inédito. Inédito para a gente, para o clube, e uma surpresa para aqueles clubes que nós enfrentávamos. Os clubes que enfrentamos não conheciam bem e não acreditavam tanto no Paysandu. E creio que uma das coisas que aconteceu naquele jogo histórico, e que favoreceu nossa vitória, foi que o próprio Boca não acreditava que pudesse perder para o Paysandu no seu campo. Uma curiosidade é que nós, na quarta-feira (o jogo foi quinta à noite), treinamos nas dependências do Boca. Uma coisa meio atípica em relação a futebol e a esse ambiente de Libertadores. Então, a gente foi meio que fazer um tour pelo Boca (risos), conhecemos a estrutura. Eles não acreditavam muito que podíamos chegar e vencer. E, no dia do jogo, tivemos muita dificuldade. Acho que é até uma tática deles. Ficamos em um vestiário muito pequeno, onde mal cabiam os 11 jogadores que começariam. Uma pressão grande. Teve um problema com água, mandaram água aberta... Enfim, aquela guerra de Libertadores", recorda.
Para Tinho, aquele jogo está marcado para sempre na memória do torcedor do Paysandu e será lembrado ainda por muito tempo, independentemente de o time argentino ter conseguido a classificação às quartas de final — posteriormente, foi campeão da Libertadores e Mundial.
"Estávamos motivados. Esperávamos um jogo muito difícil, mas a vitória veio. Hoje moro em Belém. A gente sabe que vai ser uma vitória que daqui a 100 anos o torcedor do Paysandu vai lembrar. São essas coisas que o futebol proporciona. A partir de um jogo, acaba entrando na história do clube. Para o torcedor do Paysandu, acho que é a maior vitória da história do clube, independentemente do desfecho do jogo da volta. O Boca passou, se tornou campeão da Libertadores e Mundial. Ou seja, o Paysandu venceu o campeão do mundo lá no campo dele. Nada apaga o que fizemos na Bombonera", afirmou.
"São essas coisas que a gente guarda. Belém virou, praticamente, um Carnaval. Ainda em Buenos Aires, após o jogo, falei com minha família, que estava em Belém, e comentaram que a cidade tinha parado. O torcedor fez a festa naquela noite. Sexta-feira foi feriado", completou.
Marcou Figo e Guardiola
Tinho tem ainda no currículo o Torneio de Mallorca de 1995, conquistado com o Vasco. Titular do time na ocasião, encarou o Barcelona, da Espanha, e teve a missão de marcar nomes como Figo e Guardiola.
O Cruz-Maltino foi campeão após vencer o Barcelona por 4 a 2 nos pênaltis - empate sem gols no tempo normal -, e bater o Mallorca por 2 a 0.
"Naquela época, tinha um intervalo de 30, 40 dias entre os campeonatos regionais e o Brasileiro, no segundo semestre. Então, principalmente os grandes clubes do Brasil, sempre saiam para a Europa para fazer excursão. Muitos torneios que disputávamos eram na Espanha, como o Ramon de Carranza, Troféu Teresa Herrera, Troféu Cidade de Palma de Mallorca... Torneios importantes e que serviam de preparação para eles e para nós também. Tinha esse Barcelona de Figo, Guardiola. Era um Barcelona que não é o de hoje, com o nome e a força que tem hoje, mas era um Barcelona muito forte. E para a gente, que tinha saído de uma categoria de base, acabava que essa excursão para a Europa servia como um intercâmbio de aprendizado e amadurecimento. Experiência que você adquire porque era totalmente diferente enfrentar os times daqui e os de lá. Marcar o Figo, que na época era um dos melhores do mundo, com certeza deu muito trabalho. O cara era sensacional".
Aulas particulares de futebol
Aos 49 anos, Tinho, atualmente, mora em Belém, cursa faculdade de administração e dá aulas de futebol de uma maneira diferente: de forma individualizada. Além disso, é um dos cabeças do time de Master do Vasco. Ele pensa, em breve, em atuar em gestão do futebol.
"Cheguei a começar [a cursar administração] no Rio de Janeiro, mas como vim morar aqui, vou terminar aqui, no próximo ano, se Deus quiser. Penso em administração em gestão futebol. É uma coisa que eu tenho em mente. Aqui em Belém eu comecei esse projeto, com intuito de você dar um trabalho individual, principalmente aos adolescentes e crianças. É um trabalho individualizado, onde você mostra para aquele aluno os fundamentos necessários, para, quem sabe no futuro, ele possa seguir a carreira e se tornar profissional. É um trabalho muito bacana. Futebol está no meu sangue. Quem sabe, esse projeto de aulas individualizadas se torna um outro projeto de colocar esses atletas nos clubes? Essa é a minha ideia. Além disso, também estou envolvido na questão de marketing do Vasco, que sou responsável para a gente jogar no Brasil inteiro".