De torcedores a protagonistas de uma história. A final da Taça Guanabara deste ano, entre Vasco e Fluminense, teve um capítulo especial reservado aos cruzmaltinos que foram ao Maracanã naquela tarde de 17 de fevereiro. Afinal, ficaria difícil de contar a trama que envolveu aquela partida sem lembrar de Claudio, vascaíno que jogou água em si mesmo quando conseguiu entrar no estádio, Jonatas, que viu "criança de colo correndo", ou Heitor, o pequeno vascaíno que demonstrou um enorme entusiasmo na rampa que dava acesso à arquibancada.
Esses três vascaínos tiveram a vida modificada depois daquela partida. Viralizaram e se tornaram memes em redes sociais. Hoje, Fluminense e Vasco voltam ao Maracanã pela primeira vez após aquele encontro. Claudio e Jonatas não poderão estar presentes por compromissos de trabalho e Heitor, até a conversa com a reportagem do UOL Esporte, ainda não havia conseguido ingresso.
Por ser o time visitante, o Vasco teve direito a 1.500 entradas, 5% da carga de 30 mil ingressos. O Fluminense, mandante, seguiu o princípio da reciprocidade, uma vez que, no primeiro turno, no duelo em São Januário, foram destinados 5% da carga aos tricolores.
A história daquele clássico começou muito antes do apito inicial e passou longe das quatro linhas. O UOL Esporte falou um pouco sobre os eventos que precederam a final ontem, em matéria que tratava o reencontro dos times no Maracanã e uma preocupação da Polícia Militar em relação ao número de ingressos disponíveis aos cruzmaltinos.
Naquele dia, diante de toda a confusão que tomou conta dos arredores do Maracanã, Jonatas Maciel, de 24 anos, desabafou em uma entrevista ao canal "Fox Sport". No momento de irritação, ele acabou se enrolando e uma frase proferida por ele ganhou as redes sociais, virando meme: "eu vi criança de colo correndo".
"Eu frequento estádio há muito tempo e nunca tinha passado por aquilo. Teve muita briga fora do Maracanã. Eu vi uma moça correndo com uma criança no colo para fugir das bombas e se protegendo do cheiro de spray de pimenta. Eu estava indignado e dei aquela entrevista. Eu me confundi na hora de falar e saiu daquele jeito. Na hora, eu nem reparei. Quando entrei, começou a chegar muita mensagem no meu celular, pessoal brincando que eu tinha ficado famoso", disse, aos risos, Jonatas, que completou:
"Eu não esperava que fosse dar toda aquela repercussão. Para mim, tinha sido uma entrevista normal. Só queria desabafar naquela hora. Depois daqui, nunca mais foi a mesma coisa. Em dia de jogo do Vasco, até hoje me param para pedir foto, dizem que sou um torcedor ilustre, me ligam até de outro Estado. Até página de torcidas rivais postaram o meu vídeo, fiquei até assustado. Minha vida mudou".
Minha criança de colo!
— Criança de colo (@Jhonnys171) 20 de fevereiro de 2019
Boladona porque eu não deixei ela correr. pic.twitter.com/8vybRySA96
Depois de todo o transtorno para conseguir entrar, o pequeno Heitor não conteve a emoção. Batendo na cruz de malta, mostrava toda a empolgação de estar no acesso à arquibancada. O vídeo, feito pelo pai, Cristiano Azeredo, rapidamente ganhou as redes e fez de Heitor um dos mais novos mascotes da torcida.
"Naquele dia, fizemos o de sempre: saímos de Caxias para o Maracanã. Chegamos e havia uma fila muito organizada, esperando a abertura dos portões. Quando começou a se aproximar da hora do jogo, começamos a ouvir bombas no Setor Sul. Nos retiramos dali [perto da entrada do Bellini] e estávamos indo para o shopping Tijuca porque nosso carro estava lá perto de onde estava acontecendo a confusão. Demos a volta e foi quando um taxista passou e nos avisou que os portões estavam abrindo."
Neste momento, a família cruz-maltina não pensou duas vezes e retornou ao Maracanã com os ingressos comprados previamente em mãos e conseguiu entrar, momento de extrema alegria para Heitor.
"Na estrada, foi uma coisa de louco. Parecia um título só por ter conseguido entrar. Ele ficou eufórico e eu resolvi registrar. Foi aquele vídeo. Depois, com a conquista do título, ele ficou ainda mais feliz e eufórico. Foi o primeiro título que ele viu no Maracanã. De lá para cá, isso [presença do Heitor nos jogos] se intensificou. Se antes eu que levava ele, agora, é ele quem me leva (risos)", afirma.
Cristiano recorda que a repercussão do vídeo também fez com que ele tivesse de ouvir "algumas frases infelizes", como classificou.
"Tiveram pessoas que vieram falar: 'Poxa, mas levar um menino cadeirante para um jogo como aquele?'. Sim. Lugar do menino cadeirante é onde ele quiser e o Heitor prova isso sempre".
Quem também celebrou muito o fato de ter conseguido entrar no Maracanã depois de toda a confusão foi Claudio Gonçalves, que ficou conhecido como "Gordinho da Água". Primeiro a chegar às arquibancadas do estádio naquela tarde, ao lado do filho André, a alegria foi tamanha que Claudio virou uma garrafa de água em si mesmo. A imagem rapidamente ganhou repercussão.
"Aquilo foi um marco na minha vida e vai ficar registrado para sempre. Tenho orgulho de ter sido o primeiro torcedor a entrar no estádio naquele dia. Depois de tudo que tinha acontecido, tudo que tínhamos passado, aquele foi um momento de extravasar. Desta vez, não vou poder ir por estar em Natal, mas vou acompanhar de longe e tenho certeza que o Vasco vai mostrar a garra de sempre".
Claudio lembra o momento em que soube que os portões iriam abrir e como conseguiu ser o primeiro.
"Durante a confusão, eu e meu filho corremos e nos abrigamos em uma vila. Algumas pessoas ficaram comovidas e ofereceram ajuda. Tinham vários vascaínos. Eu já nem achava que fossemos entrar mais, foi quando passou um grupo correndo e avisando que os portões iam abrir. Não sei o motivo, mas eu resolvi ir no sentido ao contrário do pessoal. Foi quando eu vi um rapaz em um dos portões e perguntei se estava abrindo mesmo. Ele disse que ali abriria logo. Acabou sendo o portão que me deu acesso mais rápido ao Maracanã", aponta.
O episódio fez dele famoso não apenas entre os torcedores vascaínos, mas também entre os rivais.
"Por onde eu passo, acabo sendo reconhecido, tem gente falando comigo, pedindo foto. Fui convidado para duas festas de torcida de vascaínos em cidades diferentes. No clássico com o Botafogo, os alvinegros brincaram, tiraram foto. Já teve tricolor que pediu foto e, para você vê, até rubro-negro", disse.