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Vasco ganha o mundo na mesa de botão

Dia 13 de setembro. Em Brasília, o Vasco empatava com o Atlético-GO em 1 a 1 e, mais uma vez, via a liderança escapar de suas mãos na Série B do Brasileiro, torneio que tem sido mais difícil do que a torcida e o clube imaginavam. No mesmo dia, bem longe dali, o futebol vascaíno encantava os gringos. Em Budapeste, na Hungria, numa verdadeira lavada, o clube tornou-se campeão mundial de futebol de mesa na modalidade Bola 12 Toques. Vencedor do torneio continental europeu, o Tiszavasvari foi arrasado pela equipe cruz-maltina: 28 a 4.

Os quatro heróis que cruzaram o Atlântico para defender o Vasco foram Rodolfo Castello Branco, 49 anos, engenheiro e fabricante de mesas de botão; Marcelo Lages, 43, advogado; Igor Monteiro, 33, jornalista, e Renato Kort, 39, comerciante. Eles integram a equipe de futebol de mesa do clube, a mais representativa do país, que pratica seis regras oficiais diferentes. Eles receberam o GloboEsporte.com na confortável sala da modalidade em São Januário para mostrar que o esporte que amam é bem mais sério do que muitos imaginam.

Antes de dominar o mundo, foi preciso ganhar o continente. No Sul-Americano, vitórias sobre Palmeiras e Rosário (ARG) deram ao Vasco a "Libertadores" do botão, que credenciou o time a decidir o mundial com os campeões europeus. Do sul-americano, aliás, foi o bicampeonato, mas esta foi a primeira edição em que os dois campeões continentais decidiram o Mundial.

Entrosamento faz parte do sucesso do quarteto. Eles jogam juntos no Vasco desde 2007, quando Rodolfo deixou o America, outra potência da modalidade, e transferiu-se para São Januário. Igor e Marcelo estão entre os fundadores do departamento cruz-maltino, em 2003. Renato veio do Olaria, em 2005.

Com o nome de tantos clubes envolvidos, até parece que estamos falando de futebol de verdade. E não estamos?

- Fora o futebol, só o futebol de mesa reúne grandes clubes de camisa como Vasco, Fluminense, America, Palmeiras, Santos, Corinthians, Goiás, Sport, Santa Cruz... - diz Marcelo, orgulhoso, enchendo a bola da modalidade, que reúne até patrocinadores em São Januário: as passagens dos quatro foram bancadas por uma empresa do ramo alimentício.

- Aqui no Vasco as modalidades têm de ser autossustentáveis. Temos um parceiro e priorizamos a ida para o Mundial na hora de decidir onde gastar esse ano - completa Marcelo, que também é o coordenador da modalidade no clube.

Não rola dinheiro pesado no futebol de mesa, mas os clubes oferecem vantagens na hora de tentar "contratar" bons jogadores. Ainda mais quando estes estão em algum rival.

- Há algum tempo atrás eu tive proposta para jogar no Fluminense. Mesmo com a oferta de uma ajuda de custo, eu não quis sair - afirmou Rodolfo, que pelo jeito tomou a decisão mais acertada.

Os craques estão na mesa

Com suas palhetas precisas, são eles que conduzem os verdadeiros jogadores, aqueles que empurram a bolinha pela mesa e para o fundo da rede. Mas essas peças de acrílico - os botões - são cercados de uma magia indestrutível. Quando perguntados pela reportagem se esses jogadores têm alma, o "sim" foi uníssono.

- Tem aquela bola torta, ruim de chutar, na qual você ganha confiança porque vê que é aquele determinado botão que vai chutar - explica Marcelo, mostrando o seu camisa 10, de um time que tem uma arte desenvolvida exclusivamente para ele. Mistura o Vasco e o Iron Maiden, suas duas grandes paixões.

- Nunca tive time sem escalação, os botões precisam ter identidade - pontua Igor, que joga atualmente com um time do Vasco, mas carrega outros cinco uma maleta de couro preto que poderia facilmente ser confundida com a de um médico. Dentro dela, a idolatria por um ex-jogador vascaíno fica bem protegida: ele é fã incondicional de Juninho Pernambucano, hoje comentarista da TV Globo.

Há um time só de Juninhos, que passa por todos os momentos da carreira do craque. Tem Juninho no Sport, no Lyon, no Al-Gharrafa, no New York RB, na Seleção Brasileira e, é claro, muitos no Vasco. Cada número de camisa que ele usou na Colina e os momentos marcantes renderam um botão cada. Alguns são até autografados.

O motivo da homenagem é mais do que simples.

- Em todo o time que eu já montei, o botão que se destacava sempre era um Juninho. Resolvi fazer um time em que só houvesse Juninhos.

Mesmo com todo o ludicismo liberado, quem joga no Vasco não pode usar botões de rivais do Rio de Janeiro. Rodolfo e Renato, que não utilizam botões referentes ao clube, usam, respectivamente, times com decoração do Boca Juniors e da seleção portuguesa.

O jogo cansa, sim!

Em tese, o esforço físico não é dos maiores. Afinal, os jogadores ficam ao lado da mesa o tempo todo e os movimentos não são lá muito desgastantes. Mas não pense que é moleza ficar dando palhetadas para lá e para cá. Pelo menos, não pergunte isso a um botonista.

- Cansa, sim. Mais pela tensão do que pelo esforço, mas cansa - contesta Rodolfo.

- Muitas vezes você joga durante um dia inteiro mais de uma dezena de partidas - alega Marcelo.

No entanto, não é o preparo físico que vai determinar essa resistência.

- Esse esporte é 80% cabeça. Pede muita concentração. Na mesa, na hora do jogo, tudo se iguala: peso, idade, porte atlético... Um dos jogadores do time húngaro que enfrentamos tem 76 anos e é um excelente botonista - complementa o capitão vascaíno.

Se a barriguinha não atrapalha como diz Marcelo, sorte de Renato. Ele, que leva a alcunha de "Bad", tem até tatuagem em homenagem ao futebol de mesa e é também quem está mais parrudinho no elenco vascaíno.

- Não resisto a uma coxinha quentinha - disse ele na chegada da reportagem a São Januário, quando parou para apreciar o quitute da cantina da Colina.

O apelido, ele explica sem meias palavras.

- Na mesa, eu sou meio provocador... catimbeiro, sabe? Sei valorizar a posse de bola, enervar o adversário.

Rodolfo também é brabo, mas tenta se absolver.

- Fico irado comigo, nunca com os outros. Dia desses fui advertido por chutar uma garrafa d'água durante uma partida - disse ele, fugindo do rótulo de bad boy que o companheiro ostenta.

Renovação difícil

O leque de opções que a tecnologia oferece tem prejudicado a renovação no esporte, no qual a categoria juvenil está com menos atletas que em outros tempos.

- Infelizmente há a concorrência da informática. Eu, que tive loja de artigos para futebol de mesa, era mais procurado por adultos que curtiram o jogo de botão na infância do que pela criançada - afirma Rodolfo.

Nos dias de semana, os botonistas costumam treinar em seus clubes à noite, após o estudo ou depois do trabalho. Muitas vezes rolam viagens nos fins de semana. Naturalmente, as companheiras marcam em cima. No quarteto vascaíno, Marcelo e Renato são casados e Rodolfo namora. Igor, segundo o próprio, está "sem namorada fixa".

Rodolfo explica como amansar as feras na ausência dos amados.

- Na base da conversa no aplicativo do celular, várias fotos enviadas por dia e muito "eu te amo" - garante, com a experiência de quem passou 15 dias no exterior por conta do futebol de mesa.

Fonte: ge
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