Em termos políticos, o Vasco já vive um momento histórico com a posse de Jorge Salgado. Talvez desde a união entre Antônio Soares Calçada, na presidência, e Eurico Miranda, como vice de futebol, nos anos 1980, que um mandatário não comece seu triênio tão soberano dentro da política de São Januário.
O novo presidente, empossado na sexta-feira, tem tudo para ter uma paz que Alexandre Campello nunca chegou nem perto de possuir. É curioso pensar que, depois de tantas vezes recusar se candidatar à presidência por preferir ser um candidato escolhido por aclamação, Salgado tenha aceitado a disputa e, no fim das contas, conquistado a tão sonhada estabilidade.
Isso porque os primeiros sinais, antes e durante a reunião de posse na Sede Náutica da Lagoa, sinalizam um começo de trabalho bem próximo do grupo que foi segundo lugar nas eleições, a "Sempre Vasco". Jorge Salgado tem 120 conselheiros. A "Sempre Vasco", de Julio Brant, 30, e os sinais que o candidato derrotado dá nas redes sociais são os mais amistosos possíveis. Ou seja: com pouco esforço, Salgado começa com 150 dos 300 conselheiros do clube.
Do outro lado, existem outros 150 beneméritos, a maioria oposição a Salgado, mas que sofrem de uma desmobilização cada vez maior, desde a morte de Eurico Miranda. Ainda assim, com alguns nomes antigos da política do Vasco ao seu lado, como Carlos Osório, e ele próprio sendo um cardeal, Salgado tem condição de atrair aliados entre esse grupo.
Em um cenário desses, com maioria absoluta entre os 300 conselheiros, o presidente terá a faca e o queijo nas mãos para emplacar a pauta que quiser no Conselho Deliberativo, presidido por seu aliado, Carlos Fonseca. Uma das primeiras frentes poderá ser a da reforma estatutária, tão discutida e que não saiu no gestão de Roberto Monteiro no CD.
Monteiro, que foi um opositor implacável de Alexandre Campello depois que romperam, fazendo uso de todo seu poder à frente do Deliberativo e do fato de o Conselho Fiscal também ser controlado por seu grupo político, a "Identidade Vasco", agora terá de se articular principalmente entre os beneméritos. Entre os conselheiros eleitos, sua ascensão diminuiu sensivelmente.
Salgado tem o Conselho Deliberativo e o Conselho Fiscal. Dificilmente passará pelos mesmos apuros que Campello, que teve as contas reprovadas em uma manobra que acusou ser política, de seus adversários, e não técnica.
Essa aparente tranquilidade para governar de Salgado neste começo à frente do Vasco só é possível devido à manobra arriscada de seus opositores, que acabou se mostrando fracassada, pelo menos até agora. Luiz Roberto Leven Siano apostou todas suas fichas em um pleito que venceu, mas que poderia ser invalidado, como foi, em vez de disputar uma nova eleição em que poderia ser vencedor outra vez ou segundo colocado. Quis tudo e acabou sem nada, ao menos por enquanto. A ação do Solidariedade no Supremo Tribunal Federal ainda é uma esperança de reviravolta para os adversarios de Jorge Salgado.
O maior desafio de Jorge Salgado agora será ter habilidade política para continuar tendo a "Sempre Vasco" por perto o máximo de tempo que puder e conduzir as demandas que poderão surgir de dentro de seu quadro de apoio. Não faz muito tempo Alexandre Campello pulverizou sua base ao romper com Monteiro e teve dores de cabeça por causa disso no restante do mandato.
O que mais ajuda a manter a coesão política dentro do clube, de qualquer clube, é o futebol. Quando se vence, as insatisfações pessoais são recolhidas e aparecer na foto da gestão campeã é uma possibilidade muito atraente para ser desprezada. Jorge Salgado, que disse ter recebido de Vanderlei Luxemburgo a promessa de que o Vasco venceria o Atlético-MG neste sábado e dedicaria o resultado ao novo mandatário, precisa demais da equipe na Priimeira Divisão. Ela é a pedra fundamental tanto para a recuperação financeira sonhada quanto para a paz nos bastidores.