Se na primeira semana de março alguém dissesse a um torcedor do Vasco que o time ficaria fora da final do Carioca ao ser eliminado pelo Nova Iguaçu, certamente não receberia atenção. Mas aconteceu. A equipe que vinha mostrando evolução em muitos aspectos ofensivos foi vencida pelo desequilíbrio tático na hora de decidir a vaga na decisão, e o clima mudou totalmente.
O técnico Ramon Diaz, porém, continua prestigiado junto aos torcedores. As reclamações têm como alvo determinados jogadores e a política de contratações da 777, empresa que comprou o clube há quase dois anos. O Gigante da Colina continua muito longe de disputar um clássico contra o Flamengo em igualdade de condições técnicas e financeiras, como prometido pela empresa no ato da compra.
Independente da atuação decepcionante do dirigente, a saída de Alexandre Mattos apenas 100 dias após assumir como executivo de futebol é outro episódio que reflete o quão conturbada tem sido a gestão. O elenco, não fossem as graves lesões de Paulinho e Jair, teria opções melhores em relação ao que se safou do rebaixamento nos últimos minutos do Brasileirão 2023.
Há mais qualidade nesta temporada, mas não o suficiente para o Vasco disputar as primeiras posições. Dependerá muito do reajuste coletivo da equipe e do francês Dimitri Payet, que é a melhor notícia cruz-maltina em 2024. Muitos quilos mais magro, em ótima forma técnica e física, fez a diferença em alguns jogos até aqui. Tem cinco assistências e dois gols. Começa, porém, a competição com uma lesão no joelho.
Por mais que nos duelos contra o Nova Iguaçu a produtividade ofensiva não tenha sido a ideal, o time não tem tantos problemas com a bola. Mostrou capacidade de se aproximar e triangular pelos flancos em diversas partidas. Sempre utilizando o ala, o meia do setor, o apoio de um volante, e muitas vezes um dos zagueiros. João Victor e Léo possuem essa característica. Têm bom passe e coragem para arriscar.
Quando o Vasco atua com três zagueiros – maioria dos jogos da temporada -, eles são também uma boa ferramenta para superar a pressão alta adversária. Seja com passes ou em conduções. O time já fez gols saindo de pressões assim, trabalhando a bola de pé em pé e invertendo o lado da jogada ao entrar no campo de ataque.
Lucas Piton é outra ferramenta fundamental no funcionamento da equipe. Apoia muito pela esquerda, sempre com boas decisões ao chegar à linha de fundo. Tem sido fundamental quando consegue pisar na área adversária. Ao lado de David, é o vice-artilheiro do time na temporada.
Ainda dentro do estilo de troca de passes curtos e aproximações para triangular, é necessário falar do chileno Galdames. Mostrou capacidade de articulação e mobilidade para encostar nos dois lados do campo. Coloca-se também na região de finalização dos ataques. Tem qualidade técnica para o último passe e a finalização. Participou diretamente de cinco gols.
O problema tem sido sua contribuição defensiva. Muito baixa para um ‘’segundo volante’’, causando problemas ao time. Este, aliás, é um dos muitos pontos de ajustes necessários ao Vasco. A frente da área tem ficado exposta com a ausência de compactação no setor. Zé Gabriel acabou sobrecarregado. O clube busca a contratação de um volante.
A última linha de defesa também apresenta constantes problemas de coordenação. Não sobe em conjunto para pressionar, protege mal os espaços em profundidade e abre lacunas entre os integrantes.
Mais coisas explicam a média superior a um gol sofrido por jogo. Uma delas é a queda de concentração quando há um placar favorável. O time perde intensidade. É permissivo aos avanços adversários. As transições defensivas também precisam ser mais competitivas.
É possível identificar que os jogadores têm enraizado o conceito do ‘’perde, pressiona’’. Tentam retomar rapidamente a bola, e dois gols já foram construídos assim em 2024. O problema é manter a energia nos duelos. E, quando esta primeira pressão é superada, a equipe demora muito a reocupar os espaços, ficando em inferioridade constante em contragolpes adversários.
Se não evoluir nos aspectos citados sem a bola, o Vasco não fará um Brasileirão competitivo. Encontrar o equilíbrio acabou sendo algo que se tornou crônico até aqui.
Voltando à seara positiva, as bolas paradas se destacam. Payet tem uma batida mágica e a equipe apresenta repertório variado de jogadas em escanteios e faltas laterais. Vegetti é um dos principais cabeceadores do elenco. O homem-gol é muito procurado também nas jogadas de bola rolando. A estrutura de construção do Vasco é voltada para o último passe ser quase sempre um cruzamento para o centroavante.
A torcida merece um Brasileirão mais tranquilo. Sem períodos na zona de rebaixamento e lutando por vaga ao menos na Copa Sul-Americana. A última amostragem antes do campeonato, entretanto, não foi muito animadora. As quatro semanas de treinamento podem ter efeito positivo nas rodadas iniciais.