A cena ainda está viva na memória dos vascaínos. Num lance de infelicidade, o goleiro Martín Silva foi rolar a bola no campo encharcado do Maracanã para Rodrigo, ela parou na poça, e o rubro-negro Alecsandro não perdoou. O trauma no clássico contra o maior rival na Taça Guanabara, que contribuiu para a derrota do Vasco por 2 a 1, abateu o goleiro, mas poderia trazer consequências psicológicas piores não fosse o que o uruguaio traz como uma de suas principais características: a frieza.
De perfil calado e de poucas brincadeiras no dia a dia, Martín é daqueles que não fica eufórico com grandes momentos e tampouco se deprime nas derrotas. Dificilmente lê jornais ou notícias em sites com conteúdo esportivo. Nas viagens e concentrações, se agarra ao seu inseparável chimarrão e se mantém em silêncio na maioria do tempo. Introspectivo, logo passou a ser conhecido como "Iceman" (Homem de Gelo).
Preparador de goleiros do Vasco, Flávio Tênius confirma que Martín superou rápido o incidente contra o Flamengo, curiosamente o rival da semifinal do Campeonato Carioca neste domingo.
"Ele ficou chateado, mas no dia seguinte já estava tudo certo. Até cobro muito isso deles. Não adianta a gente ficar lamentando nem comemorando muito. É trabalhar dia após dia e procurar sempre o melhor. Temos jogos toda hora. É tentar manter o equilíbrio. A experiência dele ajuda também. É um cara rodado, já disputou Copa do Mundo, final de Libertadores. Isso facilita", destacou.
Para Tênius, a frieza do uruguaio ajuda não só na parte psicológica como no desempenho em campo, sem dar margem a nenhum tipo de apresentação mais "espalhafatosa".
"Ele realmente não é de falar muito. Está sempre concentrado, atento e observando o que estão fazendo. Nos jogos também é assim. O Martín tem muita qualidade técnica, se posiciona muito bem e não é de ficar pulando muito. É uma característica dele. Facilita muito isso. Há goleiros que são de pular mais, mas não é muito a dele. Ele faz o necessário", disse.
O preparador, no entanto, discorda de quem considera o lance diante do Rubro-Negro uma falha.
"Aquile lance eu não digo nem que foi uma falha. Foi uma situação totalmente incomum. Por questão de prudência, poderia ter chutado para frente, mas um pouco antes ele tinha recebido uma bola rolando por ali", avaliou.
Recentemente, o Vasco promoveu um intercâmbio entre goleiros e preparadores de todas as categorias do clube. De acordo com Tênius, Martín Silva é um exemplo para os mais jovens.
"Sempre ajuda quando se tem um cara com uma história como a dele. Ele tem uma trajetória bacana. A postura dele, a forma como encara a carreira no dia a dia, isso tudo é uma coisa legal. Hoje em dia existe o cara que é titular, mas não é tão responsável, não se preocupa muito com nada. Tem muito jogador por aí assim, e ele, não. Hoje em dia a garotada é meio empolgada, então estamos sempre de olho", alertou Flávio, que já treinou Jefferson no Botafogo e o coloca como outro exemplo.
No dia a dia, Martín Silva se comunica mais com outros estrangeiros do grupo, como o argentino Guiñazu, o colombiano Montoya, o paraguaio Júlio dos Santos e, mais recentemente, o meia Emanuel Bianccuchi.
No início do ano passado, logo quando chegou ao Vasco, o goleiro viveu um drama na vida pessoal, quando sua filha Pilar nasceu prematura, fato que fez com que, por algumas vezes, o Cruzmaltino o liberasse para acompanhar sua esposa em Montevidéu (URU). Atualmente, ele está saudável e vive no Rio de Janeiro com ele e sua mãe.
Identificado com a torcida, já ganhou uma camisa do clube em sua homenagem que veste nas partidas. Ela tem o tom azul celeste em alusão ao seu país.
Tais reverências, porém, não chegam a sensibilizá-lo tanto. Na época do Olímpia (PAR), por exemplo, passou a ser chamado de "super herói" pelos torcedores e um jornal local chegou a fazer uma charge com o tema. No entanto, ao ser questionado sobre o que achava do desenho, disse "não ligar para essas coisas".
O contrato de Martín Silva com o Vasco vai até janeiro de 2018.