Ao enfrentar a violência ao movimento LGBTQIA+ com uma série de ações no último fim de semana, o Vasco lançou mão de personalidades para divulgar o novo uniforme, alusivo à causa, e diversas homenagens. Um dos modelos escolhidos para divulgação da camisa traz em si todas as dores e a coragem da diária luta contra a homofobia. Trata-se de Gabriel Fernandes, atleta paralímpico da natação vascaína, homossexual assumido e estudante de medicina.
Gabriel, de 25 anos, já sofreu com os mais variados tipos de preconceitos. Por conta de uma monoplegia no membro inferior direito, ele utiliza uma órtese para que consiga andar de uma forma melhor. Órtese essa, diz ele, que cotidianamente faz com que perguntem sobre ela e sobre sua condição.
- Me sinto saindo do armário toda vez que conheço alguém diferente e minha órtese está aparente. Tenho orgulho também de ser PCD (pessoa com deficiência), mas às vezes não me sinto confortável de falar sobre. Costumo receber respostas piedosas e não me sinto digno de pena. A deficiência não está em mim e sim na sociedade, que não é capaz de integrar pessoas com corpos e limitações diferentes.
- Desde os tempos em que treinava como atleta universitário, havia comentários preconceituosos diante da minha condição física. E, no meio do esporte, os padrões heterossexuais são nítidos - afirmou Gabriel.
Mas a dor que Gabriel carrega consigo diariamente não se resume a palavras que machucam. Num momento de lazer em que estava na praia acompanhado de um outro homem, ele foi agredido com pauladas por cinco homens. De acordo com o atleta, a covardia teve como única motivação o fato de que estava com a cabeça encostada no ombro do rapaz que estava junto a ele.
Por isso, ter sido um dos modelos da campanha de lançamento da camisa que homenageia o movimento LGBTQIA+ encheu Gabriel de orgulho. O nadador identifica a iniciativa do clube como algo que pode fomentar mudanças significativas dentro da sociedade brasileira.
- Me senti muito lisonjeado de fazer parte dessa campanha, principalmente por fazer parte da comunidade e por já ter sofrido homofobia de maneira física. As microagressões são as que sustentam as macros. Ter uma blusa em comemoração ao orgulho LGBTQIA+ pode parece ser bobo, mas representatividade e visibilidade ajudam bastante para que haja mudança.
Questionado se os movimentos feitos pelo Vasco nos últimos dias podem se tornar uma mola propulsora para outros que atletas homossexuais assumam suas respectivas orientações, Gabriel revelou-se esperançoso em ver companheiros de causa marcarem posição em ambientes onde o "olhar torto" e manifestações homofóbicas ainda predominam.
- Não posso afirmar, mas espero de verdade que sim! Quanto mais ocuparmos os locais tipicamente heteronormativos, maior é a nossa integração com os espaços e com aqueles que tendem a naturalmente nos discriminar/afastar.
Com o sonho de representar a seleção brasileira paralímpica de natação, Gabriel estuda para salvar vidas. Cursa o oitavo período de medicina na UFRJ, ambiente no qual também já sofreu preconceito. Dividido entre cardiologia ou cirurgia torácica em relação ao caminho que pretende seguir, o atleta tem uma certeza: quer, com representatividade, ensinar.
- No momento penso bastante em cardiologia ou cirurgia torácica. A única certeza que tenho é que quero ser professor um dia. O meio acadêmico, tal qual o esporte, também precisa de representatividade.
E, no último domingo, Gabriel representou. Na luta contra homofobia, racismo e demais preconceitos que precisam de um basta imediato. Futuro médico e atleta do Vasco desde 2019, ele nadou de braçada no que mais busca: representatividade.