Futebol

Os bastidores da crise vascaína

A semana começou agitada para o Vasco - mais um episódio de uma crise que faz parte da rotina do clube há tempos. Depois da quarta derrota em quatro jogos, o 1 a 0 para o Vitória no último domingo, torcedores decidiram protestar contra a queda livre da equipe rumo à zona de rebaixamento e o presidente Alexandre Campello. O que não falta, muito além dos resultados em campo, é ingrediente para o quente caldeirão cruz-maltino.

E o reflexo é visto na tabela do Campeonato Brasileiro. Com 24 pontos, o time está em 16º lugar, só um à frente da zona de rebaixamento, empatado com Sport e Ceará, à frente apenas pelo saldo de gols e número de vitórias.

Torcedores do Vasco protestam em São Januário (Foto: Felipe Schmdit / GloboEsporte.com)

Em campo, o Vasco não consegue dar sinais de melhora. Longe disso, inclusive. O "novo" técnico, que assumiu a equipe no dia 26 de agosto, já sofre pressão depois de quatro derrotas em quatro partidas: Atlético-MG, Santos, América-MG e Vitória. No próximo domingo ainda tem o clássico contra o Flamengo em Brasília, apesar de ser o mandante.

A insatisfação da torcida representada nos protestos desta segunda-feira reflete a falta de sinais de reação do Vasco. Os ingredientes do caldeirão cruz-maltino, que não são poucos, estão longe de vão de crise política a problemas de relacionamento interno:

A interminável crise política do Vasco também tem sua parcela no atual momento do futebol. Por mais que haja um esforço para blindar os jogadores, as constantes notícias sobre a necessidade vital de um empréstimo de R$ 38 milhões para honrar os compromissos do ano viraram tema central no clube.

Com o adiamento da aprovação do empréstimo, a diretoria começou a não ter como fazer os pagamentos. O salário do futebol ainda está em dia – eles recebem no dia 20 de cada mês -, mas o próprio Campello afirmou, em sua apresentação, que, caso o dinheiro não fosse captado, em setembro já seria difícil manter o clube funcionando.

Paralelo a isso, a estrutura do futebol tem gerado incômodo. PC Gusmão, contratado como coordenador técnico, viria, em tese, para comandar a transição de jogadores da base para o profissional. Não é o que acontece na prática: partiram dele as contratações do zagueiro Lucas Kal e do volante Willian Maranhão – o zagueiro Marcão, da Portuguesa-RJ, também foi indicado, mas teve a contratação vetada. Não houve participação de Alexandre Faria, diretor executivo de futebol, nas negociações.

Nenhum dos nomes foi analisado pelo Centro de Inteligência e Análise do Vasco – a prática, porém, não é exclusividade da atual diretoria. Como curiosidade, Faria esteve incomunicável no dia em que Willian Maranhão treinou pela primeira vez com o elenco – aguardava-se apenas a sua confirmação para o anúncio oficial. A contratação só foi feita no dia seguinte pelo setor de comunicação cruz-maltino.

Com tanta gente mandando no futebol, é provável que mais um nome seja adicionado ao caldeirão. Campello sofre forte pressão de seus aliados para nomear um vice-presidente de futebol, de forma a aliviar a cobrança em cima de si e dotar o departamento de mais experiência. Entretanto, esbarra-se na falta de um nome de consenso para a pasta.

Dois acontecimentos recentes mostram que o ambiente do futebol também tem suas turbulências, mesmo que muitas passem despercebidas e sejam contornadas pelo próprio elenco.

Segundo relatos de pessoas que estavam presente, em um treino antes do empate em 1 a 1 com o Ceará, no CT do Almirante, o então técnico Valdir Bigode fez alterações na equipe titular. Um dos jogadores sacados pelo técnico foi Giovanni Augusto. O meia, porém, não aprovou a mudança e abandonou a atividade antes do fim, causando surpresa e descontentamento de líderes e da comissão técnica.

A partida contra o Ceará foi a última de Giovanni Augusto até agora. Desde então, o jogador se recupera de um trauma por desgaste no tornozelo que já foi operado anteriormente, mas não tem lesão no local.

Mais recentemente, o meia Thiago Galhardo, depois de entrar no segundo tempo da vitória sobre a Chapecoense e fazer o último gol cruz-maltino, reclamou na saída de campo, apesar de dizer ter respeito pelos companheiros:

- Eu disse que estava 90%, mas na verdade estava 100%. A gente não quer criar tumulto. Acho injusto eu ficar fora pelo o que venho produzindo. Respeito todos os meus companheiros. Acho que fizeram uma excelente partida pelo Atlético-MG. Falei para ele (Valdir) que estaria à disposição para 15, 90 minutos (...) - disse.

Explica-se: Galhardo havia ficado fora do jogo anterior, diante do Atlético-MG, por causa de uma pancada sofrida contra o Ceará. Era dúvida para enfrentar a Chapecoense, mas melhorou e foi para o banco de reservas porque não estaria 100% - ele mesmo disse isso antes do confronto, mas depois voltou atrás.

A reclamação não pegou bem internamente. Alguns jogadores próximos a Valdir Bigode e líderes do elenco ficaram incomodados com a postura do meia, considerando que ele estava questionando o trabalho do interino publicamente, ao invés de conversar no vestiário, mas o problema pontual não foi externado.

Há relatos de pessoas próximas ao elenco de que, apesar do incômodo, Thiago Galhardo não tem outras desavenças com a maioria dos atletas - alguns, inclusive, foram ao seu aniversário no fim de julho, antes do episódio.

O próprio auxiliar Valdir Bigode disse que conversaria com o meia depois do episódio, mas não o procurou até esta terça-feira.

- (...) Vou conversar pessoalmente com ele e resolver cara a cara para não ter nenhuma ponta de dúvida. O poder de escalar o treinador tem que ter e eu passo isso a eles o tempo todo. Jogador que for escalado tem que dar o seu melhor e o ficar de fora torcer para o seu companheiro - falou Valdir Bigode na entrevista coletiva após a partida.

Os dois casos são amostras de um ambiente que já não é dos melhores em um momento delicado para o Vasco na temporada. Faltam 15 jogos até o fim do Campeonato Brasileiro e a meta, pelo menos por enquanto, é se salvar do rebaixamento.

O Vasco já trocou de técnico duas vezes na temporada. No início de junho, em meio a maus resultados e a "eterna" crise política, Zé Ricardo decidiu pedir para sair. Deixou o cargo depois da derrota para o Botafogo, para grande lamentação interna - havia uma corrente contra o trabalho do treinador, mas a maioria gostava e entendia que a saída seria ruim.

No dia 7 de junho, Jorginho foi anunciado para substituir Zé Ricardo. Mas a segunda passagem dele por São Januário durou pouco: após 10 jogos, a diretoria decidiu demitir o técnico com 43,33% de aproveitamento.

No dia 26 de agosto, aí sim a última troca, Alberto Valentim chegou ao Cruz-Maltino e, até agora, teve quatro jogos para trabalhar. Só depois da derrota para o Vitória terá uma semana inteira para trabalhar, mas já pressionado.

Em meio a todas as mudanças, Valdir Bigode assumiu interinamente e comandou o time em quatro partidas, com três empates e uma vitória. O trabalho do treinador, agora auxiliar, agrada os jogadores, mas foi justamente em uma das breves passagens que se protagonizou uma cena de constrangimento, digamos.

Em meio à crise técnica, torcedores decidiram pela segunda vez no ano organizar protesto (a primeira resultou com invasão a um treino em São Januário) e cercaram todas as frentes possíveis:

Pela manhã, foram ao estádio mostrar a insatisfação a conselheiros beneméritos que se reuniram no local;

Outro grupo foi ao Aeroporto Internacional do Galeão esperar o elenco e acabou sendo despistado. Os jogadores desceram na pista pela porta traseira do avião, pegaram um ônibus de serviço, desceram novamente, entraram num ônibus alugado pelo Vasco e foram embora. Nenhum segurança do clube sequer foi ao saguão;

Teve ainda quem foi até o Aeroporto Santos Dumont, cogitando a possibilidade de a equipe voltar de Salvador por lá. Esses, é claro, não encontraram ninguém.

Fonte: ge
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