A vida prega peças. Você certamente já sentiu na pele o peso deste ditado um dia. Pois é. Neste sábado, no confronto entre os líderes da Série B do Brasileirão entre Vasco e Atlético-GO, Marcelo Cabo, técnico do Dragão, estará vivendo um destes momentos que desafia a tese do acaso da coisas. Pupilo e apadrinhado no futebol por Jorginho, Cabo terá pela frente a missão - veja só - de impedir que o mestre entre para a história do clube onde trabalha. O time do Vasco está a apenas uma vitória de igualar o recorde absoluto de invencibilidade do clube obtido pelo folclórico Expresso da Vitória, que ficou 35 jogos sem sentir o gosto amargo da derrota.
- Fico feliz em ter esse momento. Triste ao mesmo tempo por ter que enfrentar nesse momento de possivelmente alcançar esse recorde. Gostaria muito que ele batesse esse recorde como amigo. Mas, infelizmente, tenho que dizer que eu vou fazer de tudo para vencer essa partida - afirmou o técnico do Dragão.
A história da amizade de Marcelo Cabo e Jorginho remonta a 2007. Os dois ainda davam os primeiros passos na arte de ficar à beira do gramado. Após ser convidado por Dunga para ser auxiliar na Seleção, Jorginho conheceu o então técnico do Bonsucesso, Marcelo Cabo. Os dois ficaram amigos. Em seguida, em 2009, Jorginho e Dunga convidaram Cabo para ser observador técnico no título da Copa das Confederações. O sucesso rendeu um novo convite para a mesma função na Copa do Mundo de 2010.
O fracasso na Copa do Mundo da África não afastou Cabo e Jorginho. Pelo contrário. Os uniu ainda mais. Tanto que, em seguida, Jorginho elegeu o companheiro como seu auxiliar técnico. Vieram então dois trabalhos: Goiás e Figueirense. A dupla surpreendentemente quase levou o time de Santa Catarina à Libertadores da América em 2011. A saída do Figueira representou uma pausa no trabalho em dupla. Jorginho rumou para o Japão, e Cabo, Emirados Árabes.
- A gente viveu muitas alegrias. Muitas tristezas. Uma dessa foi a perda do Mundial de 2010. A perda do Mundial... A gente tinha convicção que seria campeão do mundo. E também vivemos muitos bons momentos. Final da Sul-Americana com a Ponte. Os melhores momentos foram os ensinamentos, como homem de Deus. Os conselhos, tanto pessoal quanto profissional - lembrou Cabo.
A separação durou dois anos. Em 2013, Jorginho voltou para o Brasil para comandar rapidamente o Flamengo, enquanto Cabo seguia sua carreira no Oriente Médio. Neste meio tempo, Ailton auxiliou o técnico na curta passagem pelo Rubro-Negro. Seria a Ponte Preta a responsável por unir os dois amigos novamente. De volta ao Brasil, Cabo aceitou o convite do velho amigo de ser novamente o braço direito, agora na Macaca. E deu certo. Os dois conduziram o clube ao inédito vice-campeonato da Sul-Americana, sendo derrotado na final para o Lanús-ARG.
A demissão do comando técnico da Macaca selou o fim definitivo da parceria entre os dois. Jorginho foi tentar a vida novamente fora do país. Cabo, por sua vez, entendeu que era o momento de bater asas rumo à carreira de técnico principal. De lá para cá, muita coisa aconteceu. Jorginho voltou ao Brasil e elegeu um novo auxiliar: Zinho, figura indissociável no sucesso momentêneo do Vasco. Marcelo Cabo acumulou passagens por Volta Redonda, Macaé, Ceará, Tigres-RJ, Resende e agora Atlético-GO.
Para Jorginho, enfrentar o amigo será uma sensação estranha. Ele elogia o companheiro e garante que não há pessoa que goste mais de assistir a jogos de futebol do que Cabo.
- É estranho. É um cara que tenho amizade grande. Ele passou um momento difícil com o Gabriel Cabo, filho dele. Teve que interromper a carreira com 20, 21 dias de idade por um problema de saúde. O Marcelo Cabo é impressionante. Admiro em termos da paixão que ele tem por futebol. Eu gosto de ver futebol. Mas igual a ele é impossível. Impressionante como o cara gosta de ver jogo. É bom enfrentá-lo, vê-lo fazendo um grande trabalho - contou Jorginho.
Esta, no entanto, não será a primeira vez que pupilo e mestre duelam. No Campeonato Carioca deste ano, Jorginho venceu o amigo então no Tigres por 2 a 0. Agora, a situação é diferente. Os dois atravessam o auge da carreira de técnico. Jorginho busca igualar uma marca histórica e se coloca como um dos melhores da atualidade no Brasil. Cabo tem a oportunidade de tomar do rival de sábado a liderança da Série B e quebrar uma invencibilidade que dura incríveis 34 jogos do padrinho. Vem cá, será que a vida é mesmo um acaso?
Cabo acredita que Jorginho ainda comandará a Seleção
Amigo é para essas coisas, dar apoio, incentivar. E Cabo acredita que Jorginho ainda comandará a seleção brasileira. Para o técnico do Atlético-GO, o companheiro tem muito a crescer na profissão, já que é estudioso e aplicado, além de ter bom relacionamento com todos que trabalham junto.
- Quando conheci o Jorge na Seleção, sempre tive a oportunidade de dizer que ele seria um dos maiores técnicos do Brasil. É um cara muito estudioso. Muito atualizado. Um estrategista. Um conjunto da obra muito bem feito. Mas a maior virtude dele é a gestão de pessoas, de grupo. Isso ele é fora de série. É imbatível. Fiz uma faculdade e pós-graduação nisso com ele. O Jorge é um cara que não mente, não promete nada que não possa cumprir. E ainda vou vê-lo dirigir a Seleção. E não vejo longe disso - disse Cabo.
Jorginho, que completou 100 vitórias como treinador na última terça-feira, com o triunfo sobre o Joinville, diz que está sempre aberto ao aprendizado. Um dos exemplos é ele ter usado um treinamento de saída de bola do time "chupetinha" do Vasco como inspiração para seus jogadores profissionais.
- Cem vitórias. Tem um significado grande para mim. Me considero realmente um jovem treinador, apesar de ter 51 anos (risos). Trabalho há 10 como treinador. Eu estou sempre aberto ao aprendizado. Criei um trabalho de saída de bola nosso com o trabalho que o time chupetinha fez. Acho interessante. Temos que estar abertos a tudo - afirmou Jorginho.
Vasco e Atlético-GO se enfrentam neste sábado, em Cariacica, no Kleber Andrade, no Espírito Santo. A partida, válida pela oitava rodada da Série B do Campeonato Brasileiro, será realizada às 16h30 (de Brasília). O Cruz-Maltino é líder isolado, e o Dragão está na segunda colocação, com três pontos a menos.