"Deus de calção e chuteira": assim foi nomeada uma das fotografias mais históricas do futebol brasileiro. Na imagem, captada pelo fotógrafo Ronaldo Theobald, do Jornal do Brasil, torcedores estendem as mãos para cumprimentar Roberto Dinamite.
Trinta e seis anos depois daquela tarde de domingo, e, pela primeira vez após o falecimento de seu maior ídolo, o Vasco retorna ao lugar onde a foto foi tirada: o Estádio Luso-Brasileiro, na Ilha do Governador.
Na imagem, feita em 15 de maio de 1977, um "Deus" passa no meio de seu povo. Um povo que deseja tocá-lo, como se quisesse comprovar que ele realmente existe. Roberto Dinamite voltava para o segundo tempo da partida contra a Portuguesa. Era um jogo importante para o Vasco, valendo a liderança do primeiro turno do Campeonato Carioca.
Se ganhasse dos donos da casa, faltariam só três partidas para a final. Mas, no início da primeira etapa, Dinamite já havia tranquilizado a torcida com um gol aos 7 minutos, abrindo a vitória do Vasco por 3 a 1.
- Em um lindo domingo de maio de 1977, fui escalado pelo JB para cobrir o jogo entre Vasco e Portuguesa, na Ilha do Governador. Quando a equipe do Vasco saiu do vestiário para o campo, os torcedores se comprimiam junto ao gradil e estendiam as mãos para tocar seus ídolos. Parecia uma cena bíblica, algo mágico. Fiquei imaginando como registrar aquilo. No intervalo da partida, me deitei, discretamente, no chão do túnel e, à medida que os jogadores retornavam para o segundo tempo, ia dando meus cliques - disse Ronaldo, autor da foto, em uma entrevista na época.
- Meu alvo era Roberto Dinamite, o ídolo maior. Quando disparei a câmera, sabia que ali estava a mais bela foto da minha vida - completou o fotógrafo.
Mauro Prais, historiador do Vasco, estava na arquibancada como torcedor, e nunca vai esquecer aquele jogo. Muito menos a primeira vez que viu a foto de Roberto Dinamite:
- O Estádio estava lotado. Era um jogo muito importante, pela campanha que o clube estava fazendo. Já tinha ganhado dois clássicos, contra o Flamengo e o Fluminense, assumindo a liderança. A torcida estava muito empolgada. Quando o Roberto estava entrando em campo, ninguém entendeu o que estava acontecendo. Da arquibancada, onde eu estava, só víamos aquele "bolo" de torcedores. Era tradicional ficar um monte de pessoas coladas no túnel da saída dos jogadores.
No dia seguinte, com a foto no jornal...
- Quando essa foto saiu no jornal, achei tão maravilhosa que recortei e guardei. Ele parecia um Deus. O "Deusnamite". Todo mundo que eu conheço, que se lembra de ter visto a imagem, teve a mesma reação. Ficaram maravilhados. É uma das fotos mais geniais que já vi no futebol — completou Mauro Prais.
Naquele Carioca de 1977, o primeiro com uma decisão entre Flamengo e Vasco, o título ficou em São Januário.
Daniel Ramalho, atual fotógrafo do Vasco, falou sobre a importância da imagem, que ganhou o Prêmio Esso, para o fotojornalismo. Daniel chegou a conhecer Ronaldo Theobald quando trabalhou no Jornal do Brasil e decidiu seguir a profissão inspirado por fotógrafos como ele.
- Essa foto ultrapassa a função jornalística. Foi feita com o intuito de informar, mas se tornou um ícone da nossa memória coletiva. Se tornou uma espécie de monumento. Essa imagem é uma grande lição para quem pratica a fotografia - explicou Daniel.
Dinamite reencontrou Theobald quando recebeu o título de benemérito do Vasco da Gama, em abril de 2022. Na ocasião, o fotógrafo recebeu os cumprimentos do ex-jogador.
- Me recuso a falar de Roberto no passado. Como fotojornalista e amante do futebol sei que Roberto eternizou momentos incríveis pra nossa história e por isso será sempre referenciado por mim no presente. Roberto é eterno. Tive a honra e o prazer de capturar um momento incrível da jornada do Roberto Dinamite no futebol - sabemos que Roberto é muito além do campo - e por isso sou eternamente grato. Portanto, tenho apenas a agradecer ao Roberto por ter me permitido registrar e eternizar tão incrível momento - escreveu o fotógrafo em sua rede social, após o falecimento de Dinamite.
Vasco e o Luso-Brasileiro
Nessa quinta-feira, às 21h10, o Vasco enfrenta o Audax pelo Campeonato Carioca no Luso-Brasileiro. A relação do clube com o Estádio da Ilha do Governador vai muito além da foto de Ronaldo Theobald.
Em sua história, o Vasco jogou 12 vezes no local e nunca perdeu. O Vasco esteve presente até na inauguração do Luso-Brasileiro, em 2 de outubro de 1965. No jogo contra os donos da casa, Zezinho marcou o primeiro gol do estádio. Ele cobrou um escanteio, e, com a ajuda do vento, a bola balançou a rede do goleiro da Portuguesa. Depois do gol olímpico, o lugar ficou conhecido como “Estádio dos Ventos Uivantes”.
Roberto Dinamite jogou cinco vezes no Luso, marcando cinco gols. Dinamite faleceu no dia 8 de janeiro, aos 68 anos. O maior ídolo da história do Vasco lutava contra um tumor no intestino.